Como melhorar as experiências que seu público-alvo tem com seus serviços/produtos? — III Workshop POP

Thamires Lima
clavedefa.co
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7 min readOct 11, 2017
III Workshop POP (Setembro -2017)

No mês de setembro, realizamos a III Edição do Workshop POP — Pesquisa Orientada para Pessoas. O workshop teve como tema Experiência para Usuário, Beneficiários e Clientes — uso e aplicações centradas no humano. O Workshop POP é um encontro promovido pela Clave de Fá para debater temas relacionados à pesquisa social. A III edição contou com a participação de Louise de Faria — antropóloga e doutoranda da University College London -, Patrícia Pereira — da Gerência de Gestão Estratégica do Sebrae-RJ — e Vinícius Cruz — Customer Experience do Banco Santander Brasil — e teve mediação de Elizete Ignácio, diretora-executiva da Clave de Fá.

Antropologia e a dimensão da Experiência

Como já falamos por aqui, a noção de experiência já era utilizada desde a década de 80 por antropólogos. Victor Turner [1] aponta que a abordagem antropológica da experiência advém e muito das contribuições da Antropologia do Ritual e da Perfomance. Uma reflexão muito interessante que o antropólogo propõe é que a “estrutura da experiência” não possui início ou fim arbitrário.

Sendo assim, as experiências em seu sentido antropológico podem ser tratadas como ação ritualizada, por serem “processadas” através de estágios distinguíveis. Além disso, envolvem em sua estrutura cada fase que envolve pensamento, vontade, desejo e sentimento. Algumas dessas experiências formativas são altamente pessoais, outras são partilhadas com grupos aos quais pertencemos. Elas interrompem o comportamento rotinizado e repetitivo.

Ao longo da vida, cada um de nós já teve certas “experiências” que foram formativas e transformativas, que o sociólogo Emile Durkheim chamou de “efervescência social” (uma campanha política, um protesto, uma declaração de guerra).

É a partir dessa reflexão antropológica que podemos pensar na experiência partilhada de produtos e serviços.

Articulação entre metodologias de pesquisa no design de serviços e produtos baseados na economia da experiência

Precisamos usar os dados para repensar a experiência do cliente. Um exemplo disso é a experiência de compra ou do cliente de um banco.

A jornada do usuário não é apenas uma interação tecnológica com um software ou aplicativo. É preciso ter noção da interação off e online que o cliente tem com o produto e que a jornada do usuário em relação a um serviço possui um contexto, de acordo com Vinicius Cruz. Como hoje fala-se muito do crescimento da experiência tecnológica de gadgets, aparelhos, plataformas, redes sociais, sites e aplicativos, o debate lembrou como a experiência face a face e com o meio ambiente (isto é com o contexto físico e material que o cerca) afeta e estabelece determinadas circunstâncias.

Achei interessante trazer um caso observado durante um trabalho de campo realizado no ano passado sobre um alambique de Paraty que oferece degustação de cachaça para os clientes. Eu estive presente nesse estabelecimento, no contexto de uma pesquisa de avaliação de um projeto baseado em turismo de experiência.

Nessa situação, observei como o produto foi adaptado e teve seu tempo de execução estendido a fim de conseguir atender o público hiper-conectado nas redes sociais. Esse público, durante toda a execução do produto, fazia vídeos e tirava fotos daquela experiência, inclusive estabelecendo novas dinâmicas daquele ritual de consumo. Os consumidores queriam encostar nos tonéis e segurar as garrafas, manusear os equipamentos históricos de produção de alimentos. A equipe teve de entender o timing do consumidor e adequar o serviço a isto.

As transformações em relação a forma como os serviços vêm sendo ofertados aos clientes, bem como os efeitos de novas dinâmicas de consumo, demandaram segundo Patrícia Pereira, novos desenhos metodológicos para a avaliação de projetos. Esse foi o ponto-chave de sua fala: apresentar como a etnografia foi inclusa como abordagem qualitativa na metodologia de avaliação de projetos no Sebrae-RJ, a fim de captar mais insights aprofundados sobre os projetos coordenados por essa instituição.

Patrícia Pereira (Sebrae-RJ) , Vinícius Cruz (Santander Brasil) e Elizete Ignácio (Clave de Fá)

O ponto-chave foi compreender que Humano e Digital estão totalmente alinhados.

As empresas precisam entender como as circunstâncias e contextos afetam a experiência dos serviços e produtos que as pessoas utilizam. Para isso, a boa aliança entre etnografia e design pode ajudar nessa empreitada. A construção de equipes multidisciplinares, o mix-methods e o uso de metodologias ágeis e aplicáveis são importantes nos projetos executados nas empresas.

A abordagem antropológica — como uma das possibilidades de abordagem qualitativa nos projetos focados no design de experiências — é pertinente pra entendermos o que algumas escolas chamam de Economia da Experiência [2], que foca no redesenho de oferta e nas formas de adição de valor para produtos e serviços.

Uma abordagem rudimentar é segmentar os clientes em grupos relativamente amplos com base em alguns dados demográficos (idade, endereço, gênero, etc.).

Hoje, a medida que nos envolvemos com os clientes, buscamos estabelecer interações mais significativas, levando em consideração contextos e ambientes. É preciso então se desvencilhar de um olhar tradicional que contrapõe serviço x produto, para pensar a proposta de customização da própria experiência.

Um exemplo disso é quando no meio online nós, enquanto clientes de e-commerces, sabemos que as empresas têm informações sobre nossos interesses, buscas. Nesse sentido, ofertas e sugestões personalizadas, bem como atendimento eficiente são bem mais assertivas na construção de valor agregado do produto.

Patrícia Pereira, Vinícius Cruz, Elizete Ignácio e no Skype — diretamente de Londres — Louise de Faria.

Precisamos mudar a abordagem da experiência apenas baseada num canal, produto ou mensagem para uma abordagem baseada no comportamento e preferências do cliente. Por isso, a customização parece tão interessante, por abrir o leque de possibilidades para diferentes preferências dos clientes.

Outro exemplo foi trazido por uma empreendedora participante do evento. Ela tem uma cafeteria, o Café em Pauta. De início, ela construiu seu negócio pensando em jornalistas que gostam de tomar café. Com o tempo, foi observando que os consumidores valorizam sobretudo a experiência do ambiente da cafeteria, o que aumenta o tempo de estadia do cliente no estabelecimento. Eles tiram fotos, fazem vídeos para as redes sociais, marcam encontros com os amigos na cafeteria. A experiência da cafeteria, segundo ela, é muito mais do que comprar um café expresso, mas degustar sabores e “estar na cafeteria”.

Patrícia Pereira também destacou sobre uma cafeteria/bistrô na região serrana que, atentos a customização de experiências para os turistas e moradores da região, treinaram a equipe de forma diferenciada no que se refere ao atendimento nas datas festivas (feriados, dia dos namorados, chá da tarde com a temática do Brasil imperial) e nos eventos organizados pelo bistrô. O caminho desse estabelecimento foi se certificar num projeto baseado na Economia da Experiência para desenvolver produtos e serviços com alto valor agregado.

Por fim, defendo que é importante refletir sobre as experiências de consumo de produtos e serviços da seguinte forma:

Quando se paga por um serviço, compra-se uma série de atividades que serão realizadas em seu nome. Um serviço focado na experiência do usuário, envolve uma sucessão de eventos memoráveis que o afetam de uma maneira particular. Na economia da experiência, uma empresa deixa de oferecer produtos ou serviços simplesmente e passa a lidar com sensações, heranças culturais ou opções pessoais.

A proposição de experiências portanto, não é simplesmente o ato de entreter os clientes, mas de engajá-los no processo. O valor econômico dessa relação de consumo não está só na conquista ou fidelização do cliente, mas na valorização de um mesmo produto por conta de sua condição especial para aquele cliente e a capacidade de se eternizar em memória.

Para aqueles e aquelas que, como eu e o time da Clave de Fá, estamos dispostos a trabalhar nessa área é importante fortalecer esse debate: sobre instrumentos, metodologias e aportes teóricos que subsidiem a captação e o entendimento de tais experiências.

Dicas de leitura:

[1] TURNER, Victor. “Dewey, Dilthey, and Drama: An Essay in the Anthropology of Experience” In Turner, Victor W. & Bruner, Edward M. (eds.) The Anthropology of Experience. Urbana and Chicago, University of Illinois Press. 1986.

[2] PINE, B. Joseph. e GILMORE, James H. The experience economy: work is theatre & every business a stage. Boston: Harvard Business School, 1999.

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Thamires Lima é mestre em Ciências Sociais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, com ênfase em Antropologia Urbana. Possui habilidades em gestão de projetos de impacto através do uso de metodologias participativas de projetos e na combinação de metodologias qualitativas de pesquisa e coleta de dados. Atua na coordenação de equipes de trabalho de campo e coleta de dados, gestão de projetos, análise de dados e produção de relatórios de pesquisa aplicada.

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Thamires Lima
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Anthropologist Researcher — Leitora curiosa sobre vida, redes sociais, pesquisa, gênero e tudo que é urbano