A única constante

Michele Caroline Benages
Clube da Escrita Afetuosa
3 min readJul 30, 2021
Foto: Jelleke Vanooteghem em Unsplash

A chuva cai desde a hora que acordei. Antes, isso significava que eu teria um dia alegre pela frente. Sempre gostei desses dias em que o cinza domina o céu e as gotas de chuva se fazem presentes na minha janela da hora que acordo até a hora que vou dormir. Nadinha de sol pra atrapalhar. Um sentimento de acolhimento e identificação me preenchia.

De uns tempos pra cá, entretanto, percebi uma mudança. Aquela tristeza que invadia outras pessoas em dias cinzas passou a me atingir. Estranho. Demorei uns meses para admitir que, em dias chuvosos, tudo o que eu queria era ver o céu azul, tão azul que chega a doer o olho.

Não sou dada a mudanças. Na verdade, elas sempre me assustaram. Perceber qualquer sinal de uma delas chegando tem o potencial de me jogar em um looping de ansiedade. Foi com certa curiosidade, então, que percebi a influência que os dias chuvosos passaram a ter. O que causou a transformação desse sentimento que já estava solidificado em mim desde que eu posso me lembrar?

Como sempre, passei horas e horas dando voltas com essa reflexão. A resposta estava lá no cantinho da minha cabeça, esperando pra ser colocada sob a luz do sol: essa mudança é um desdobramento de um processo de autoconhecimento que fiz e ainda faço desde o início da pandemia. Falando assim, parece algo transcendental. Não é. A verdade era eu, passando tempo comigo mesma. A volta com meus pensamentos, confrontando minhas expectativas. Não tinha escapatória da minha mente. Tentava me manter ocupada até tarde da noite pra não ter que lidar com os loopings que crio. E me afundo. Giro e giro. Às vezes, saio com uma epifania das boas. Às vezes, só tenho uma crise de ansiedade das fortes.

A resposta, ou o mais próximo que posso chegar dela, se fez presente em um dia qualquer, nem um pouco memorável: a nuvem de tristeza que pairou pela minha cabeça por tantos anos se foi. Eu, agora, me identifico com o brilho do sol e com o céu aberto. Clichê demais, eu sei.

Porém, essa não foi a única mudança que percebi nos últimos meses. Queria terminar com outra frase clichê sobre como agora aceito a mudanças de braços abertos, principalmente as que vem de dentro. Mas a verdade é que elas ainda me causam desconforto, ansiedade, medo e curiosidade.

Recentemente me dei conta que, assim como não me reconheço mais em dias cinzentos, alguns cenários de carreira de sucesso perfeita pós faculdade que eu criei não eram mais o que eu queria. Pra começar, será que eu queria mesmo?

Hoje outra nuvem paira em minha cabeça, não de tristeza, mas de dúvida. O que é mais assustador: continuar no caminho planejado ou admitir a mudança e mudar o caminho?

Espero voltar em breve com menos nuvens e mais respostas.

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Michele Caroline Benages
Clube da Escrita Afetuosa

Vivo dentro dos livros. Quando saio deles, gosto de fazer lettering, escrever e atualizar o Bullet Journal.