A escrita e o medo
Não sei em que momento o medo e a escrita se encontraram dentro de mim. Lembro-me bem de quando criança, ainda cursando o primário, amava as aulas de redação e os temas variados propostos pela professora.
Eram viagens em uma bolha de sabão, aventuras com o cãozinho encontrado na rua, não tinha limites para a imaginação. Era tudo tão livre, leve e divertido.
Gostava de escrever, criar, inventar histórias. Nesse período entre a infância e adolescência, criei, re-(criei), e até “musicalizei”, acredita?
Pois é, talvez, tudo tenha começado exatamente quando fui para a faculdade. Não sei por que, afinal, aquele seria o lugar ideal para explorar minha criatividade ao máximo, mas não foi bem assim que as coisas aconteceram.
Era estranho. A menina que tinha tanta liberdade ao escrever, de repente se viu presa feito um pássaro na gaiola, impossibilitado de alçar voos mais altos.
Aprendi um novo jeito de escrever. Alguém disse: É assim. Não questionei. Enquadrei-me. Perdi-me de mim.
Durante bons anos lutei para conseguir trazer de volta esse meu jeito poético de escrever, de me sentir, de ser eu, porém, parecia ser impossível, inacessível. Cheguei até mesmo acreditar que jamais voltaria a escrever como antes.
O medo chegou e tomou um grande espaço dentro de mim, paralisando-me, deixando-me cada vez mais perdida em mim mesma, o que me fez parar de lutar. Essa experiência me fez aos poucos ir percebendo que o melhor a se fazer não era lutar contra o medo, mas abrir novos “espaços” em mim em direção aos meus valores, às coisas que de fato me eram importantes.
Cada vez que eu permitia que tais “espaços” se alargassem em mim, mais o medo ia sendo colocado para as “laterais”.
Bom, nessa jornada de volta para casa, aprendo muitas coisas ao permitir me estimar, cuidar, aprender e experimentar.
O medo? Bom, ele continua aqui dentro de mim. Às vezes me pego dialogando com ele, compreendendo sua função.
Sei que, no fundo, ele quer apenas me proteger, mas quando exagera, estou aos poucos aprendendo a “abafar” a sua voz.
Às vezes, quando consigo respirar macio, sinto-me inundada por uma paz interior, e com os ouvidos aguçados, treinando ouvir silêncios, percebo dentro de mim um tímido e suave “bater de asas”.
Será o som das letras, esticando suas “asas” e abrindo espaço para novamente brincar em mim?
01 fev22