Ele mora em uma caixa

Ariela Maier M. Novaes
Clube da Escrita Afetuosa
3 min readJun 27, 2021
Photo by jesse ramirez on Unsplash

O namorado da minha amiga mora em uma caixa. Ele fica ali, só se apresenta quando solicitado. Não tem ciúmes, não se importa que ela encontre as amigas ou que fique fora de casa até mais tarde.

“- Quero um igual!” — eu disse. — “Assim também, silencioso, mas talvez um pouco mais encorpado.”

Página sobe, página desce. Era um maior, outro menor. Um com a ponta encurvada, outro com a ponta reta. Um tal de bullet, butterfly, em ABS, em silicone. Rosa, roxo, vermelho. Por fim, escolhi um azul. Tinha até nome já.

Foram alguns dias de espera e expectativa, até a campainha tocar. Era o moço dos correios, com meu namorado dentro de uma caixinha de papelão.

Foi toda uma preparação para conhecê-lo melhor. O liberei de seu rótulo de plástico, li seu manual de instruções, dei banho com sabonete neutro assim como era pedido e deixei a postos a camisinha e o lubrificante. Ele precisava de pilhas para me amar. Coloquei, apertei o botão e …nada. NADA. Nem uma tremidinha. Dei uma batidinha com carinho, uma sacudida. NADA. Troquei as pilhas, e testei até no controle remoto pra ver se não eram elas as problemáticas. NADA. Bati então com mais força (vai que ele era masoquista né?). NADA. Meu namorado chegou pifado. Que agonia! Só me restava a humilhação: explicar por e-mail a um total estranho o porquê queria meu dinheiro de volta.

Trocas de mensagens de lá e de cá e me mandaram um código. Embalei então o ex de volta em sua caixa, e morrendo de vergonha me encaminhei aos Correios. Tinha a nítida imagem na minha cabeça que iria tropeçar a qualquer segundo, e o item sem descrição na nota fiscal sairia voando de sua atual embalagem e começaria a se mexer todo, mesmo sem pilhas. E ainda de preferência, se jogaria na cabeça de um dos atendentes mal humorados dos Correios, aquela mulher com olhos julgadores, que me enviaria só com o pensamento a mensagem de que eu não era capaz de conseguir um daqueles de verdade. Mas no fim, nada disso aconteceu. Tabus em forma de ilusões. A atendente, que era simpática no fim, selou a caixa, não viu o que tinha dentro, e tchau. Foi uma despedida sem traumas. A finalização de algo que não tinha futuro mesmo.

Dias depois recebi um e-mail dizendo que receberia meu dinheiro de volta, já que não haviam mais exemplares iguais àquele para venda. Confesso que me senti aliviada, pois quando o vi, me assustei: era maior do que eu pensei.

Acontece que eu não recebi meu dinheiro de volta, mesmo depois de e-mails, tentativas de ligações e a finalização do prazo. Chegou a hora de me expor mais uma vez contando minha história no Reclame Aqui. “Comprei um vi…(não)…um item no site xxx e ainda aguardo o dinheiro de volta”. Sem mais detalhes. O dinheiro chegou, parte dele. Faltava o frete. Réplica. E mais um depósito. Pedido finalizado. Ufa! Quanto estresse só pra tentar comprar um namorado.

Prossigo a procura de outro, agora, sem defeitos.

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