Eu acreditava que escrever não era pra mim
Parece que foi outro dia, uma menina que adorava brincar de escolinha, se achava a professora. Em um quadro de giz pendurado na parede da varanda ensinava as letras para as irmãs enquanto a mãe lavava roupa. A lembrança é tão vívida que parece que foi ontem. Essa é a memória que vem à minha mente quando Ana Holanda lança o primeiro desafio do clube de escrita, escrever sobre um medo relacionado à escrita. De repente me pego escrevendo no caderno que está a minha frente a seguinte frase: “A menina que tinha muita dificuldade com a escrita encontra a mulher cheia de vontade e necessidade de escrever.”
Minhas lembranças com o universo das palavras escritas são doloridas, repletas de medo e vergonha.Tive grande dificuldade nas aulas de português durante minha vida escolar, era um suplício pra mim ler em voz alta, conjugar todos aqueles verbos, entender onde se escrevia com x e onde se escrevia com ch. Cada vez que eu me expunha, errava e era julgada me sentia incapaz, morria em mim um pedacinho daquela menina que adora brincar com as palavras na primeira infância.
Logo no começo da minha adolescência comecei a namorar um garoto. Nós dois morávamos em Seritinga, uma cidade muito pequena no interior de Minas Gerais, onde as novidades e tecnologias chegam lentamente. Pouco tempo depois do começo do namoro o garoto foi morar em outra cidade para estudar, sem telefone muito menos internet, celular naquela época nem pegava por lá, a única forma de comunicação era a escrita. Nós trocávamos cartas toda semana, era um jeitinho de encurtar a distância, mata a saudade e atualizar as novidades do dia a dia. Eu sempre escrevia cheia de vergonha e medo, pensava: quantos erros será que tem aqui? O que será que ele tão inteligente vai pensar a hora que ver todos eles? Mas amor é uma coisa que tem o poder de libertar agente do medo, né? E assim, com medo e insegurança as cartas seguiram para o correio, iam e vinham.
Me recordo de quando passei uma temporada morando com minha tia em Poços de Caldas, e que da mesma maneira escrevia cartas para minha família, sempre com o mesmo receio quanto aos erros ortográficos. Mas nesse caso eles ganhavam dimensão, quando nos encontrávamos pessoalmente, minhas irmãs não perdiam a oportunidade de fazer piada com os tais erros, e o sentimento de incapacidade reinava. Eu me sentia envergonhada. Como podia, eu lia e relia, passava limpo várias vezes, e os erros não acabavam. Errar pra mim era e ainda é muito dolorido. Tenho muita vergonha da minha escrita, medo dos julgamentos, me pego sempre achando que não está bom.
Fui crescendo achando que a escrita não era pra mim, que eu mal sabia escrever. Amarrei a escrita as regras ortográficas e toda a minha dificuldade de entendê-las. Os medos, a vergonha e o sentimento de incompetência continuam me acompanhando. Mas hoje estou disposta a desamarrar esse nó que eu dei, porque a menina cresceu e hoje é uma mulher cheia de vontade e necessidade de escrever.
#01fev2022 (Texto escrito para o Club de Escrita Afetuosa da Ana Holanda)