Eureka!

Karol Candido
Clube da Escrita Afetuosa
3 min readMar 30, 2022

Semana passada meu filho me disse que queria ser cientista quando crescesse, só para criar uma máquina que voltasse no tempo. Nic é apegado a certas coisas. Nos mudamos recentemente e ele vive dizendo que sente saudade e quer voltar para a casa antiga. Acho que puxou um pouco a mim.

Sou nostálgica. Tenho concluído isso ultimamente. Ou, então, só ando lembrando muito da minha versão criança, porque preciso me reencontrar sempre com ela, para entender de fato quem sou. É uma dessas duas coisas. Ainda não sei.

Mas esses dias, zapeando pelas bandas da internet, me deparei com uma receita de casadinho de goiabada. Nossa. Casadinho era um dos meus doces favoritos da infância. Só que o meu era o de doce de leite.

Amava quando viajávamos para Campo Belo, cidade do meu pai, em Minas Gerais. Não porque gostava muito do lugar, mas sim porque iria comer meu tão amado casadinho. Especificamente os de uma padaria de lá, que agora não me lembro mais o nome, mas eram os melhores.

Eu, que tenho a cozinha como uma das minhas maiores alegrias e me descubro cada dia mais interessada e curiosa por comida, fui percorrendo outras versões dessa maravilhosa guloseima até criar a minha própria receita. Com doce de leite, é claro.

Contei a minha paixão pelo docinho para os meus meninos e prometi que ia fazer para eles experimentarem um pouquinho da minha infância. Não fiz no dia que contei. E nem depois. A nossa rotina corrida, as vezes, me engole. Mas desde que os dois ouviram a história, não paravam de me perguntar: “mamãe, o doce que você gostava tinha sabor do que?”

A verdade é que eu queria relembrar esse gosto tanto quanto eles queriam conhecê-lo. Muito. Por isso, dediquei o final da tarde do nosso sábado a fazer meus casadinhos.

Foi divertido. Nostálgico. Empolgante. O cheirinho gostoso da massa amanteigada invadia a nossa casa e meus filhos me rodeavam, perguntando, de cinco em cinco minutos, quando ficariam prontos. Numa ansiedade gostosa para poderem provar logo.

Eles saíram do forno, esfriaram e comecei a montagem. Dois biscoitinhos. Um pouco de doce de leite em um, mais um pouco de doce de leite no outro. E junta. Bem grudadinhos. Quase como um casal apaixonado, que não consegue se separar mais.

Montei o primeiro e não aguentei: roubei para mim. Me senti meio criança sapeca e a sensação que veio com a mordida foi impagável. De repente, fui parar em frente ao balcão da tal padaria, pequenininha, de Campo Belo, olhando para cima e perguntando: “tem casadinho, moça?”.

Dei outra mordida e me teletransportei para dentro do carro dos meus pais, com o saquinho de casadinho numa mão, enquanto a outra se enfiava dentro dele para pegar mais. Lembrei que sempre preferi comê-los inteiros. Então, montei mais um e esse já foi direto, e inteirinho, para dentro da minha boca. Onde derreteu, deliciosamente.

A sensação é muito louca. É como voltar no tempo mesmo. É a mesma sensação de quando fiz cuscuz paulista e me vi sentada na mesa da cozinha da minha vó, comendo e conversando com ela. Ou de quando fiz sonho e me vi ao lado de Dona Rosa, na padaria da Cônego Valadão, comprando sonhos às escondidas.

Meus Deus. É isso. Eureka, Nic!! Eureka pra caramba!!

Mamãe não é cientista, mas descobriu uma máquina do tempo, que pode nos levar para o passado. Para (re)encontrar pessoas e lugares. Para nos (re)encontrar. E ela tava aqui o tempo todo, atendendo pelo nome de forno. F-o-r-n-o. Forno, filho. Dá para acreditar?

Escutei uma voz vindo de longe: “Você tá feliz, né, amor?”. João falou e me trouxe de volta para a cozinha de casa. Olhei para o Nic com vontade de verbalizar para ele o que tinha acabado de perceber. Depois vi que, enquanto viajava nos meus pensamentos, acabei de montar todos os casadinhos.

O sorriso no rosto entregava o quanto eu estava mesmo feliz de estar fazendo um dos meus docinhos favoritos da infância, para três das minhas pessoas favoritas no mundo. Tá pronto, meus amores. Vamos provar?

Desafio 4 — Março 2022

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Karol Candido
Clube da Escrita Afetuosa

Libriana, jornalista, mãe de dois guris, apaixonada por uma boa história, pesquisadora de tudo um pouco e astronauta.