Implosão

Carlaprates
Clube da Escrita Afetuosa
3 min readMar 25, 2022

Costumava se abraçar nestes dias de sufocamento

O luto do amor vivido precisava de acolhida

Sentiu-se em cacos a derramar pelo chão

Cada fragmento, um pedaço de si

Havia implodido e precisou se olhar

Cada estilhaço, um relance do amor que teve

Dos sonhos roubados pelo fim

Das mágoas, das dores viscerais

Havia cacos de relações passadas e seus traumas deixados

Das lembranças infinitas enquanto durávamos, nós dois

Em um dos estilhaços, ela se refletiu menina

A ilusão do amor romântico, resgatada na torre do dragão

Rendida em chamas por esse amor eterno até o pôr-do-sol, até o fim da vida

Ela se viu em cacos e assim se fez inteira!

#03mar22

E outra versão…

Ela costumava se abraçar nestes dias. O luto do amor vivido precisava de acolhida. E nos seus próprios braços, ela se envolvia nos dias em que sentia sufocar. Era tanto sufocamento que pensou que implodiria. E realmente implodiu.

Começou com uma dor intensa vinda de dentro. Não sabia explicar o motivo. Só lhe ocorria arder todo o corpo. Foi tudo muito rápido. Quando se deu conta já estava no chão, em cacos.

Estranho se olhar assim. Implodida. Espalhada no assoalho vermelho da casa. Em pedaços.

Sentiu um arrepio percorrer cada parte de si. Como uma onda que vem em série, tomando caco por caco. Não teve medo. Confiou no processo. Um amor que se vai implode tudo à volta mesmo. Fazia parte do recomeço, do renascimento.

Ouviu uma vez de uma amiga ou leu no instagram algo mais ou menos assim: “eu me vi em cacos e assim me fiz inteira”. Talvez a frase seja uma interpretação sua. O que importa é que era essa a mensagem. E era isso que ela vivia.

Os fragmentos não queriam se juntar. Fez um esforço para isso e nada. Fechou os olhos com força. Nada. Não tinha outro jeito. Ela precisa olhar para cada um deles.

Havia cacos de relações passadas e seus traumas deixados.

Alguns fragmentos dos sonhos. Esses eram os mais difíceis de encarar. Dos planos que tínhamos juntos, das viagens que queríamos fazer, da casa que sonhamos em comprar…

Esses estilhaços lhe feriram a pele, até então intacta. Causou mais explosões ainda.

Ela desistiu de olhar. Não podia mais continuar. Até que lhe veio um caco colado a outros cacos. Um mosaico. Nele estavam os momentos bons. Aqueles infinitos enquanto duraram. A filha deste amor. As cumplicidades. O sexo gostoso. As noites e os dias em que conversávamos. O amor muitas vezes está na palavra! Não é mesmo, Rubem Alves? Sherazade?

Sentiu um breve alívio e continuou a olhar seus cacos. Estar ali no chão dilacerada não lhe era confortável. Mas era preciso seguir assim até se sentir inteira.

Em um dos cacos, ela se refletiu menina. Sonhando com o amor romântico, que dura para sempre. Com o príncipe encantando, com o homem que lhe viria buscar na torre de desencantos da vida e a salvaria do dragão. Do amor que a levaria a andar de mãos dadas na praia, os dois velhinhos, no pôr do sol. Até o fim do dia, até o fim da vida.

Implodiu esse caco por conta própria. Não queria mais levá-lo consigo. Implodiu com tamanha força que não restou nada dele. Nem pó e nem partículas.

E de repente se fez inteira!

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