Lar

Elaine Alves
Clube da Escrita Afetuosa
2 min readApr 19, 2022

Perdi meu Lar aos 10 anos.

E com ele, se foi a sensação de ter a melhor casa da rua.

A casa que não enchia nas chuvas de verão. A casa que a mãe fechava os buracos do cano para represar água e transformar em piscina. A casa que aos 5, pulei de mal jeito e quebrei um braço. A casa que tinha cortinas, tapetes e sofás, estampados de um verde tão lindo que jamais vi igual.

Aos 10 anos perdi o meu Lar.

E com ele se foi a mansidão da infância, os carrinhos de mercado cheios e os bolos de aniversário.

Se foi a segurança de se ter um teto e desceu a vergonha de se depender de outrem.

A voz praguejante e a incerteza do futuro, forjaram o desejo prematuro de Lar.

Me lembro de construir uma casa, o maior dos meus sonhos.

Um lugar que chamaria de meu.

E repousaria corpo cansado de uma vida bem vivida.

Entre tijolos, lágrimas e cimento, deixei de sonhar e me perdi. Construí uma casa, não um Lar.

Fugi antes de me tornar parede. De petrificar entre colunas e aramados.

Deixei para trás outra casa. A casa que abrigou o nascer do primeiro pedaço de mim. A casa prometida da criança perdida. O sonho dos sonhos.

Parti.

Parti em busca de mim.

Atravessei muitos caminhos para encontrar dentro de mim o Lar que ansiava.

Entendi que um Lar não se constrói com coisas que cabem em uma caixa e sim com afetos que extravasam coração.

Entendi que o pouso desejado só frutifica em terreno fértil de si.

Entendi, que meu Lar SOU EU.

desafio 02abr22

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