Meu tênis amarelo
Amarelo neon. Esta é sua cor, ou era. Agora tá ficando apagadinho, em um amarelinho já não tão mais chamativo, cansado, desbotado.
Ele não está aqui comigo. Ele, que sempre me acompanhou em tantas viagens, ficou dessa vez em casa, descansando.
Ele veste meus pés há mais de cinco anos. O comprei em uma viagem de férias nos Estados Unidos.
Mas esse tênis não é só um tênis. Ele praticamente se tornou um amigo muito querido, apoiando meus pés em solos internacionais, afundando comigo em terras vulcânicas, se divertindo nas aulas de zumba por tantos anos. Se exibiu em fotos, aprendeu a chutar em aulas de muay thay e depois de banhos muito bem tomados foi elogiado como se fosse ainda muito jovem. E assim ele conheceu o mundo: comigo. E eu com ele.
Ele encapou meus pés em passos de raiva comandados pelo meu coração. Tropeçou por calçadas desniveladas enquanto minha mente vagava por mundos imaginários. Foi calçado em dias de humores e sentimentos instáveis.
No último banho, minha mãe disse: “nossa, tá precisando comprar um tênis novo hein?!”. A borracha está começando a descolar, há manchas que não saem mais, furos que tem seu charme, e sua sola vive pintada de amoras, porque elas insistem em cair pelo meu caminho. Mas eu não quero me desfazer dele. Eu que sou tão desapegada de coisas materiais, me apeguei a algo que preenche minha memória de histórias a um simples olhar.
Prefiro acreditar que ele tem alma e que vai pro céu no dia que o sapateiro avisar que não tem mais conserto.
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