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Miúcha

Cláudia Figueiredo
Clube da Escrita Afetuosa
2 min readNov 30, 2021

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Ela se autodenomina miúcha. Saiu de Minas Gerais há quase trinta anos para viver com um gaúcho, após um romance relâmpago de férias. Com a coragem que lhe alicerça, encarou a mudança brusca de vida, o recomeço.

Para os que aqui ficaram, ela continua sendo a nossa irmã e filha mais velha, “mineira-raiz”, que gosta de garimpar belezas pelo caminho da vida e não abre mão de um bom café com pão de queijo.

Ela nunca se rendeu ao mate do chimarrão, nem pergunta se tu queres sair com ela. As diferenças no sotaque são sutis, mais parecidas com um modo de cantar do que de falar. Nunca mais um simples “é” ficou igual ao do passado. Hoje, ele se alonga em um grande interesse por nossas conversas e éeeeee bem demorado. A palavra “querida” virou adjetivo corriqueiro e serve para caracterizar casas, pessoas, cachorros ou blusas. Tudo que é lindo é querido para esta minha irmã querida.

No Sul, Simone estranhamente passou a comprar frutas na fruteira do bairro (eu, hein?) e tem agasalhos que são verdadeiros gigantes perto dos nossos casaquinhos de tricô, cheios de furinhos que são invadidos pelo minuano quando passeamos por lá.

De vez em quando, ela solta um bah bem disfarçado nas frases, talvez por lealdade ao seu sotaque nativo. Uai, falamos juntas em nosso mineirês fraterno, isso é bobagem! Pois amamos pensar em todas as misturas que somos e nas belezas que compartilhamos em textos de Drummond, Adélia Prado, Martha Medeiros ou Carpinejar. Sem divisas para o que é belo e bom. Pois, apesar dos quase 1800 quilômetros de distância que nos separam, estamos mais unidas do que nunca por palavras que se embolam apenas para dizer: sim, tô com saudade e lembrei docê.

Cláudia Figueiredo, 30/11/2021

Desafio #4 — Novembro de 2021

Clube da Escrita Criativa e Afetuosa Ana Holanda

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Cláudia Figueiredo
Clube da Escrita Afetuosa

Membro do Clube da Escrita da Ana Holanda. Busco nas palavras o céu de um novo lar.