O Final da Estrada

Jaqueline Rolim
Clube da Escrita Afetuosa
2 min readMar 16, 2022

O diagnóstico de um estado terminal é um dos momentos mais difíceis da vida. Saber que seus dias sobre a Terra estão chegando ao fim, te enche de uma tristeza, uma saudade…um misto de sentimentos. Mas após esse turbilhão inicial, é possível chegar a um momento de paz em que você enxerga que poder se despedir desse mundo pode ser uma bênção.

Dentre as várias coisas que decido fazer, peço ao meu filho para me levar a minha velha casa. Me mudei de lá a alguns anos, após a perda do meu amado esposo, mas faço questão de deixar tudo arrumadinho do mesmo jeito de quando me mudei de lá.

Assim que chegamos a velha casa, vamos até o quarto, e eu pego o baú onde está contida toda a minha história, contada através de fotografias. Peço ao meu filho que me acompanha, para me deixar sozinha nesse momento. Ele reluta, mas ao olhar nos meus olhos, percebe que preciso viver esse meu momento e sai.

Abro o baú e meu velho coração acelera. Pego a foto do meu filho mais velho ainda bebê. A saudade invade meu ser ao me lembrar das minhas cinco crianças correndo pela casa. Como eu queria que o tempo tivesse parado ali, naqueles dias barulhentos e felizes.

Esse é meu falecido marido. Em breve estarmos juntos novamente, meu amor. Essa esperança me traz alegria e leveza ao coração. Acredito que ele esteja me esperando elegante vestindo um lindo terno branco e o seu chapéu que ele amava. Como eu sonho com esse reencontro!

Eu! Essa sou eu, ou melhor, essa era eu. Linda, com um vestido longo, cheio de flores. Um sorriso jovem, carregando meu terceiro filho e com outros dois ao meu lado. Quantos planos guardava nessa cabecinha, embaixo dos longos cabelos negros, quantos sonhos havia nesse coração. Que bom saber que muitos deles se realizaram, outros se desfizeram com o vento.

-Filho, podemos ir. Já estou pronta.

Ele volta e beija minha cabeça. Pergunta se eu quero levar as fotos e eu digo que não, não naquele momento. Elas pertencem à casa enquanto eu ainda estiver nessa Terra. Após a minha partida, eles devem vender a casa para que ela possa abrigar, novas vidas, novas histórias. E as fotos do baú, que sejam divididas entre aqueles que fazem parte dessa história, que continuará viva através deles.

Ao sair, olho para a casa pela última vez. Agora me sinto pronta para seguir minha caminhada rumo ao maior mistério da vida.

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