O MENINO QUE RECORTAVA PAPEL
(Inspirado no livro sobre o personagem)
Desafio #04JUNHO22
Marquinho tinha onze anos quando virou uma espécie de ídolo da escola onde estudava. Tinha pele morena, cabelos ondulados, lábios grossos e olhar muitas vezes fixos no vazio, de onde só saía quando recortava papéis. Mas não era um recorte qualquer. O menino criava dinossauros, borboletas, sapos, estrelas, lagartixas, peixes. Tudo feito com os papéis que encontrava ou ganhava. Assim, possíveis animais e objetos que voassem, pulassem, rastejassem ou simplesmente brilhassem, faziam a alegria da garotada.
Às vezes era quieto; outras, tagarela. Na verdade, ele observava mais do que falava. Assim contavam seus colegas. Marquinho também estava entre os mais altos da turma do 401. Mas foi o tamanho de sua criatividade que o fez maior ainda.
- Achei muito bacana esse dinossauro! , disse-lhe certa vez, o coleguinha Carlos Augusto.
- Eu curti mesmo foi esse sapo enorme e com cara de mau, dizia o outro.
- A estrela azul me encantou, falava a romântica Ritinha.
E na hora do lanche, os meninos corriam para o campinho:
- Vem jogar bola com a gente, Marquinho! Ele olhava sem graça, ria com um canto da boca e voltava para sua distração preferida.
Todos notavam e entendiam que Marcus Vinícius — seu nome de batismo — se divertia mesmo era recortando papel. Mas ainda não sabiam que aquela forma de brincar era o que também marcaria a vida de todos eles.
E foi assim que em uma tarde de sol quente, uma equipe de um projeto de leitura visitou a escola. Queriam saber se havia alunos que gostassem de escrever ou desenhar. Pois iam produzir um livro a partir das histórias criadas ou contadas pelas crianças.
Muito sábia e atenta ao talento de seus alunos, a tia Matilde lembrou do Marquinho. E falou também dos outros alunos que o ajudavam a dar asas a sua arte.
- Eles trazem de casa folhas de revistas, páginas de jornais e o que acham que pode virar personagens nas mãos dele, contou. E sentia um frio na barriga quando falava sobre isso. Era alegria misturada com emoção, porque ela também se sentia parte daquela história.
Todos ficaram bem felizes com a chance de mostrar o que o amigo sabia fazer. Então tiveram a ideia genial de criar o livro O Menino que Gosta de Cortar Papel*. Foi feito todo à mão, ilustrado com as criações em papel, coladas em páginas bem coloridas e grandes. Ficou bem lindo e cheio de muita dedicação.
Na noite do lançamento, o menino que gostava de recortar papel deu autógrafos. Fez muitas fotos. E até saiu em matéria de jornal. Alunos, professores e a escola em peso vibraram e se divertiram muito. Afinal, eles estavam muito orgulhosos. Haviam, sem perceber, dado uma linda lição a todos: A da igualdade, do respeito e da amizade verdadeira.
Marcus Vinícius** era um menino autista. Mas para os colegas, ele era simplesmente o Marquinho, o gênio dos papéis. E, a partir daquele dia, uma verdadeira celebridade.
* Título do livro criado pelos alunos da escola Panorama XXI, em Belém do Pará.
** O nome do personagem foi trocado.