O que é a escrita para mim?
Escrita é natureza.
Escrita é renascer.
Escrita é ser árvore…
Atingida cedo pelas dores do viver crescer me parecia um desafio.
Conforme eu espichava me transformava no revés de uma borboleta. Me sentia presa em um casulo de decisões, expectativas e aspirações.
A faculdade me lapidou em série para ser mais uma oficial maior da ciência. Mas escutava sem ouvir. Olhava sem assistir. Trabalhava sem parar. Vivia sem refletir.
Conforme meus cabelos brancos cresciam eu não me reconhecia.
Onde estava a minha essência?
Onde estava a menina que adorava cheirar as conchas do mar?
Onde estava a criança que deitava no banco de trás do carro e olhava para o céu?
Onde estava a pequena que ao ouvir o ritmo do molho de chaves do seu pai vinha correndo de braços abertos para o amor?
Cadê a Juliana?
Em que esquina ela se perdeu?
Onde ela se escondeu? Dentro de uma armadura que trouxe proteção para ferimentos mas que tapou seus ouvidos dos cantos dos pássaros? Ou ainda uma armação que não deixa sua pele receber os raios de sol.
Juju estava a um passo de adentrar em um mundo sem volta. Num lugar sem espaço para brincar, onde sonhar é uma raridade.
Até que um dia topou e trombou numa esquina com a palavra. Numa livraria de rua ganhou um exemplar de uma poesia do Manoel de Barros que dizia mais ou menos assim:
Um passarinho pediu ao meu irmão para ser sua árvore.
Meu irmão aceitou.
No estágio de ser árvore meu irmão aprendeu de sol, de céu e de lua mais do que na escola.
No estágio de ser árvore meu irmão aprendeu para santo mais do que os padres lhe ensinavam no internato.
Aprendeu com a natureza o perfume de Deus
Seu olho, no estágio de ser árvore, aprendeu o melhor azul.
E descobriu que uma casca vazia de cigarra esquecida no tronco das árvores só serve pra poesia. (…)
A poesia e a escrita foram meus estágios árvore.
Com elas aprendi a ver o colorido.
Aprendi a dar forma para o que estava disperso.
A ter olhos mais generosos para o mundo.
Renasci.
Refloresci.
Desfio #002 setembro de 2021
