O que a escrita é para mim?

Jaqueline Lima
Clube da Escrita Afetuosa
3 min readSep 28, 2021
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A escrita para mim é feita de momentinhos especiais. Vividos ou pensados. Desde de criança. Na infância e adolescência gostava de poesia, inspirada por tantos… Fernando, Cecília, Machado, Manuel, Carlos, Vinícius, Mário, Cora, Adélia, Olavo, João. Era tanta intimidade que me sentia meio sobrinha, ou amiga, ou da família mesmo.

O tempo foi passando, o gosto modificando, mas a escrita, ahhh, essa? Sempre dentro de mim! Fui aplicando nos projetos aqui e ali, nas aulas acolá, no material de publicidade, nos eventos e em todo trabalho realizado ao longo da vida. Vez ou outra socorria uma amiga em um desafio da empresa, uma irmã em um trabalho da escola, a mamãe em um cartão para uma amiga. “Dá uma ajuda no texto já que escreve tão bem!” Agora, olhando pra trás acho que nunca prestei a devida atenção a isso: de que eu “escrevia bem”. Pensava que era só uma maneira de me pedirem ajuda e já que eu sempre estava por ali, ia eu mesma. Até que entendi que eu escrevo bem, porque eu gosto de escrever e porque eu gosto de ler e porque eu gosto de viver.

Escrever me transporta para outras dimensões, nem sempre é telúrico, mas é muito prazeroso, mesmo que o texto não saia lá essas coisas. Dia desses li uma frase que mexeu comigo: “E se a única pessoa travando sua escrita for você?” Pode ser. Por muito tempo pensei que não podia, mesmo quando escrevia.

Outro dia ganhei um livro da minha madrinha-escritora-tia Zali, que ganhou esse livro da amiga-autora-filha famosa Vilma Guimarães Rosa. O livro é o ‘Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai!’ (com dedicatória e tudo). Nele, Vilma conta as histórias de quando era filha e via seu pai preparando os ‘tesouros publicáveis’. Revirando, repassando cada manuscrito, muitas vezes. Deparei com uma página de ‘Remimento’, onde João Guimarães fazia correções, rabiscando o próprio texto datilografado, bem ali pela página 86. De acordo com Vilma ele sempre dizia que “tudo tinha de ser falado na forma.” Quem sou eu pra contradizer esse alquimista de letras, mas me fez pensar na minha forma de escrever. Essa que venho construindo desde de sempre, com todas essas influências, vivências, desde os tempos das poesias da infância. É uma eterna construção! Estuda aqui, lê, lê, lê, lê ali, faz curso, conversa, encontra, discute, debate, participa, frequenta e escreve, escreve, escreve, escreve pra sempre…todo dia! Mas tudo isso tem que ser feito com gosto, por prazer, com amor.

Sigo assim, me redescobrindo, descobrindo novas ‘de mim’, caminhos antes não pensados, mas com uma certeza: de que a escrita para mim é a descoberta de todas as vidas que eu quero ter.

Como disse Adélia Prado no poema “A Serenata” (falando de amor, mas valendo pra vida de escritora). “Estou no começo do meu desespero / e só vejo dois caminhos: ou viro doida ou santa.” Apesar de estar falando de outra coisa, já que Adélia narra a inquietude de uma mulher de meia idade diante do amor, as vezes é assim que me sinto diante da escrita. Vou tentando acertar o passo, e como continua dizendo Adélia: “De que modo vou abrir a janela, se não for doida? / Como a fecharei, se não for santa?”

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Jaqueline Lima
Clube da Escrita Afetuosa

Sou de Belo Horizonte e sempre gostei muito de ler. Sou escritora. Gosto de viajar, de dançar e tomar um bom vinho com os amigos. Amo livro de papel !