O segredo do amor

Michelli Pessoa Marinho
Clube da Escrita Afetuosa
3 min readMar 30, 2022

Nunca pensei em casar. Na infância, minhas bonecas não queriam filhos ou maridos. Elas eram independentes. Estudavam, trabalhavam e seguiam sozinhas. Nada contra um namorado, mas sem laços matrimoniais.

A terapia me fez entender um pouco isso. De onde surgiu essa ideia e o porquê. A minha versão adulta casou. Comento que fui ‘atropelada pelo destino’ ao encontrar meu marido. Ele sempre quis família. Eu, não.

Quando o amor se instala, você vive um turbilhão de sentimentos. São borboletas diárias no estômago até atingir o ápice. Minha criança, certamente, estaria surpresa com a mudança de planos. E de vida.

O amor. Lembrei dele semana passada. Do quanto muda destinos e inspira pessoas. Neste mês, meus pais completam quarenta e três anos de matrimônio. Descobri que meus sogros também aniversariam, sessenta e cinco. E os dois casais celebram datas com dois dias de diferença.

Essa conjunção de coincidências e ar de felicidade, me recordou da matriarca da família. Dona Chiquinha, minha avó materna. E uma das nossas conversas. Uma das minhas melhores memórias afetivas.

É como se voltasse no tempo e fechasse os olhos. Posso até ouvir a música e ver o ambiente. Estávamos celebrando os sessenta anos de casados dos meus avós. Bodas de diamante. Festa na família Pontes de Medeiros. Todo mundo arrumado e feliz por eles. Doze filhos. Dez sobreviveram. E ninguém perdeu aquele dia.

Já no final, cheguei mais perto da aniversariante. Questionei qual era o segredo de um relacionamento duradouro. Ela sorriu e falou: “paciência, minha filha”. Não entendi naquela época. Hoje, após três anos de casada, penso o mesmo. Vovó sabia das coisas.

A paixão se esvai rapidamente. O amor cria raízes, cresce e ocupa o espaço inabitado. É necessário que seja regado para que dê frutos e continue a florescer. A rotina sacrifica. Destrói afetos. Faz dos versos, o poema mais sofrido possível.

Voinha me ensinou (ali) que é preciso mais que amor para que uma união dê certo. É um querer misturado com oportunidades e pitadas de cessão. De si e do outro.

Qualquer relação passa por inúmeras fases e turbilhões de problemas. E só funciona se há intenção + mão na massa. Quando o ‘querer estar junto’ supera a adversidade. Que ainda vale e (sempre) valeu a pena.

Eu acrescentaria mais alguns itens. Respeito. Cumplicidade. Lealdade. É fazer pelo outro até mais que por você. É estar lá nos bons momentos e principalmente, nos ruins.

Meu avô já estava bem debilitado naquela época. E partiu após alguns anos. Há quase dez, voinha se foi. E deixou mais que herança.

Mãe, bisavó, esposa. A força que o amor é construído diariamente. Colocando tijolo por tijolo na obra da vida. A crença de que tudo é possível quando os dois estão dispostos e que os dias serão incríveis tendo amor. Esse, o melhor sentimento de todos. O mais difícil e duradouro também.

Ah, voinha. Além da saudade, o amor é maior. Ele — sempre — é. Você me contou seu segredo. Demorei anos para entender. Até que um dia, me percebi no seu lugar.

Desafio 2 — Mar — 2022

--

--

Michelli Pessoa Marinho
Clube da Escrita Afetuosa

Jornalista e Radialista. Escritora no @afetodeversos e @vozesdaescrita