Os sabores do afeto

Domingos são dias bons desde então.

Acordávamos com a vitrola vindo do andar de baixo tocando de MPB a jazz com Nat King Cole, passando por boleros e tangos.

Antes de mesmo de tomar o café outros perfumes invadiam a casa.

Comida de domingo é uma tradição na família, era quando se ouviam histórias da comida da famigerada bisavó paterna ou o feijão da vó materna, a torta de maçã da madrinha.

O cardápio sempre especial variava ao humor do chef.

O molho de tomates para a lasanha, cozinhava lentamente, com a chaleira de água quente sempre a postos.

Primeira lição! Na cozinha como na vida, o tempo é o senhor, “não apresse o rio, ele corre sozinho”.

Outros domingos havia um peixe assado recém comprado na Ceasa, ou pescado no rio Coxim, e era servido com acompanhamentos multicoloridos, verde, laranja, vermelho, um festival de cores e sabores.

Mas a rainha de todas as refeições era a paella.

Feita no tacho de ferro na churrasqueira caseira no fundo do quintal.

Cada ingrediente colocado merecia uma lição nova, uma razão de ser.

Paciência Escolhas Conviver

Os encontros de domingo foram lições saborosas e afetuosas sobre viver, sobre ser quem somos.

Silenciosamente, por trás de cada receita, havia mensagens sobre os relacionamentos, convivência, afetos, os alimentos da alma.

Eu não sabia que estas lembranças tão cotidianas me acompanhariam vida afora e nem poderia imaginar que essas memórias dos domingos em família me consolariam em dias difíceis.

Tampouco supunha que eu repetiria estes rituais de almoços aos domingos pra sentir novamente aqueles sabores, perfumes e o coração aquecido.

Hoje sei que a cada domingo descobri um pouco mais sobre quem eu sou e quem somos nós juntos.