Supremo
Ele é minha paixão. É como sempre sonhei. Alto, longilíneo, elegante, discreto, sóbrio e, ao mesmo tempo, chama a atenção por seu charme. Supremo.
Aquela cena era recorrente. O carro preto, clássico, estaciona em frente a porta, à beira da calçada. A porta se abre. Não apareço de corpo inteiro, o close é nas pernas, até os joelhos. A barra do vestido preto denota a distinção. Harmoniosas, as pernas esguias, bem torneadas se lançam. Primeiro o pé esquerdo, depois o direito. Firmes. O manobrista já aguarda; entrego-lhe as chaves e sigo a passos ambíguos, fortes e delicados, firmes e suaves. Eu e ele voltamos de um dia maravilhoso de trabalho, finalizado com um jantar de negócios. Felizmente nossos clientes são muito agradáveis, nosso bom relacionamento torna esses jantares nada enfadonhos. Diria até divertidos. Entro pelo hall do apart-hotel onde moro, amplo, brilhante, aprazível. A recepção me intercepta com minha chave. Sorrio e agradeço a gentileza. Entro no elevador e subo; chego em casa. Hora de repousar e recarregar as energias. Ele fica próximo a cama. Já descalça, sigo para o banho, ainda elegante.
Ele é minha paixão. Platônica. Desejei ter um sapato scarpin preto, alto, bico fino, fechado na parte do calcanhar e do bico. Tiras finas e delicadas enlaçam o tornozelo e outra tira parte do centro desta em direção ao peito do pé. Um modelo clássico, atemporal. Sonho, acordada, com está cena por cerca de 30 anos.
Não tive meu carro preto clássico.
Não morei no apart-hotel.
As pernas esguias e bem torneadas já não são assim.
Os passos… foram mais em zigue-zague.
Os divertidos e prazerosos jantares de negócios não ocorreram.
Não tive o scarpin supremo.
Ainda!