Tem festa
Desafio 02mai22 — Clube da Escrita
Minha menina celebrou seus 29 anos. Caramba! O tempo passa mesmo voando. Ela ama, ardorosamente, seu aniversário. É genético, acho. Amo o meu. Não me importo com festa. Mas a garotinha… faz questão. Absoluta! Assim desde que se conhece por gente. O que dava um nó nesta mãe. Não pense que é porque ela desejava coisas impossíveis. Eu é que estava meio quebrada às vezes (na maioria). Uma desgraça.
Claro que acompanhavam o desenrolar da vida, na medida do possível e das responsabilidades. Mas dar conta de realizar o sonho da menina festeira era meu. Simples? Sim. Não acontecer? Jamais. Pra mim, veladamente, até poderia ter conotação de dor e peso. Pra ela, sempre, de carinho, envolvimento e felicidade. Eu fazia questão. Absoluta!
A cada ano uma vontade. Entrava o mês de maio e lá vinha ela, cheia de argumentos, explicando como “precisava” da sua festa. Confesso — lá vinha a dualidade. Eu sofria. Eu amava. Acumulava com o perrengue diário. Matando uma alcateia por dia. Entretanto… “A Vida é Bela” *. Acreditava eu ser essa a melhor forma de lidar com tudo. Em vista disso, tem festa! Enfim, suas festas, ano a ano, balizavam nossas vidas. Pura energia. Paixão. Superação. Vibração. Celebração. Este sempre foi seu ritmo — repleto de “ãos”. Contagiante.
Naquele ano, seus 11, uma boneca transformou-se no sonho das meninas. Queriam ter. Queriam ser. Cara, a danada da boneca! Filha, a mãe não consegue fazer a festinha e te dar a boneca. Prefiro a festa mami. A festa vai ser da Bratz então. Beijos melados. Pulos e apertos. Gritos. Sorrisos. Euforia. Minha missão foi dar vida à boneca. A Bratz será nossa anfitriã. Imaginamos ela gigante. E a dublê de artista entrou em ação. Tintas. Papel em metro estendido no chão da sala. Filha, deite-se aqui. Faz a pose da boneca para eu riscar o molde. Cuidado! Não pode amassar ou rasgar o papel. Que farra! Faço a base. Crio os detalhes. Sob os olhares e pitacos da perita. Noites e noites de trabalho. Ainda providenciar os complementos da decoração, composição da mesa, balões, fazer docinhos, bolo, gelatinas, salgadinhos, comprar as bebidas. Enrolar as balas nos papeis coloridos. Ah, essa era uma das tarefas mais festejadas. Não podia faltar a alegria das franjas coloridas dos papéis de bala. Muitas balas.
Cedo, começamos a romaria ao salão de festas do prédio. Desce a decoração, enche balões, prende, monta tudo, desce comes e bebes, monta a mesa. Desce um mundo de brinquedos para compor a diversão. TV e vídeo game, para um campeonato, barraca e uma turma de bonecas, jogos diversos — dominó, pega varetas, memória, cartas. Livrinhos infantis, aparelho de Cds (na época era o máximo), tv e karaokê para zoeira completa. De adulto, só eu. Nossas festas eram assim — criançada do colégio, do prédio, seus amigos, amigos do irmão. Rendia uma bagunça boa. Muita liberdade. Muita diversão.
Ao final, recolhemos tudo. Romaria de volta pra casa. Limpamos o local. Juntos. Nós três — eu, ela e o irmão. Carregamos a caixa de presentes. Já tarde. Sentamos no chão da sala. Abrindo presente por presente. Curtindo cada embalagem. Cada detalhe. Lembrando cada momento. Rindo. Gravando tudo da memória. Exaustos. Felizes. Pra sempre.
* Alusão ao filme “A Vida é Bela”, de Benigni, onde pai e filho, separados da mãe, são enviados para um campo de concentração na Segunda Guerra Mundial. O pai usa a imaginação para o filho acreditar que está numa brincadeira, na tentativa de protegê-lo de qualquer sofrimento.