Um pouco mais que 6 frases

Carolina Miashiro
Clube da Escrita Afetuosa
3 min readFeb 13, 2022

O medo aparece em muitos momentos da minha vida e gera em mim o sentimento de vergonha, principalmente do julgamento alheio. Agora mesmo, escrevi cinco ou seis frases (ou um pouco mais) sobre mim e, logo na sequência, os apaguei, pelo medo da exposição.

Em alguns momentos é fácil notar que se trata de medo, mas algumas vezes o danado vem disfarçado: “vou emagrecer primeiro”, “estou ocupada”, “este não é meu lugar”, “eu não sou escritora”. E assim, o medo vai ganhando suas batalhas.

Porém, junto com ele vem um desconforto. O desconforto de estar paralisada e de saber que existem outros caminhos possíveis.

Procuro nas minhas recordações da infância este mesmo sentimento. Lembro do medo que sentia na natação: a professora me colocava um pouco mais no fundo e me cobrava ficar lá. Eu achava que não dava conta, tinha que ficar no raso. Cheguei a chorar uma vez, dizia que doía o meu estômago, e de fato, doía. Eu ainda não sabia, mas a dor era um vazio de não me sentir acolhida no meu medo, de não saber o que ia acontecer se eu não fosse capaz de nadar. De não saber. De não saber que era assim que eu ia aprender.

Comecei a escrever este texto ontem, e estava com um mal estar tremendo. Era sábado. E no meio da escrita senti um sono pesado, que me ordenava um cochilo. Deixei o texto para depois e só voltei hoje, depois de pensar em mil caminhos possíveis. Então percebi que o sono veio como um reforço para o medo de colocar o próprio medo para fora. Talvez hoje eu não precise mais chorar quando não sei todos os passos do que virá, mas a emoção continua a vir.

Quanto à natação, minha mãe continuou a me levar às aulas, apesar do episódio de choro. E foi assim que mesmo sem concordar que a professora sabia o que estava fazendo (às vezes culpamos alguém no nosso processo de desenvolvimento), aos poucos fui me jogando, engolindo água e levantando a cabeça desesperadamente quando não dava conta. Mas alguns meses depois, fui recompensada e senti a sensação de acolhimento que a água traz ao nadar.

E lembro de mim tão corajosa em tantas fases da vida e das recompensas que superar o medo trazem por si só. Natação, apresentações na escola, primeiro emprego. Levantar a cabeça e prosseguir com ressaca depois de uma noite de exageros, pedir desculpas depois de uma briga, continuar a vida depois de uma traição, viver após a perda de pessoas importantes.

Lembro de ter feito um livrinho para minha irmã mais nova sobre os extraterrestres, logo depois de um episódio no Globo Reporter que causou grande impressão nas crianças da nossa geração. Ela estava com dificuldades para dormir e o livro a ajudou a se acalmar, trouxe uma visão diferente daquela que o programa havia mostrado: os ETs também podiam ser amigos. E foi assim que, tentando ajudá-la a superar o seu medo, eu me desfiz de muitos dos meus próprios medos.

Apaguei bem mais que seis frases no texto todo. Mas em compensação, vou apertar o botão de publicar. Hoje a vitória foi minha.

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