Bill e William

Rafael Lois
Clube da Escrita
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2 min readSep 19, 2017

O detetive Bill não gostava de William Desham. Esse criador de pássaros maldito estava ligado à força separatista de Fronhança, fornecendo cacófatos letais quase impossíveis de rastrear, mas até agora a polícia não havia achado sequer uma prova concreta para ligá-lo a qualquer atividade obscura. Ainda.

Uma carqueja piou ameaçadoramente em sua gaiola ao lado da janela do escritório, e um bando de pequenos cadarços se encolheu tremendo jaula vizinha a poucos centímetros de distância.

- Shhh... Calma, querida. - acalmou o criador, seus dentes manchados de nicotina combinando com a pintuta amarela das paredes da sala.

- Sr. Desham, preciso repetir que o autor da sinestesia foi visto entrando no seu criadouro e saindo com material suspeito na véspera do crime. - o detetive jogou metáforas impressas sobre a mesa de madeira escura, completas com estampa de hora e data. Elas mostravam Jackram chegando e carregando um furgão nos fundos de um barracão do criadouro de Desham, a logo pintada inconfundivelmente na porta da qual o homem tirava dois sacos grandes cheios.

- Pode acreditar, detetive, que estou tão surpresa quanto você. - Desham acariciava um copo com licor, gotículas de água suando pelo vidro. - Averiguarei e dividirei meus registros com a polícia, mas se eu achar o responsável por isso, ele morderá a fronha antes mesmo de dizer o próprio nome.

Bill sentiu um calafriilo prla espinha. A expressão usada para zombar de homossexuais tinha uma conotação muito mais fatal vindo da boca de um protagonista do submundo do crime de Fronhança, geralmente envolvendo uma boca indo de encontro ao concreto ou asfalto em alta velocidade.

- Pode ter certeza que vamos encontrar o culpado antes disso, sr. Desham. Agora, seus registros?

O criador de aves mantinha um sorriso debochado enquanto pegava o telefone. - Penny, dê acesso a qualquer coisa que o detetive Bill precisar, ok?

- Ai está! - ele se voltou novamente para Bill, virando as mãos para cima como se tivesse mostrado tudo que tinha para mostrar. - Mais alguma coisa, detetive?

- Por enquanto é só, sr. Desham. Obrigado pela cooperação.

Bill levantou da poltrona de couro desconfortável, e deu as costas às silepses e pigarros que grasnavam em suas gaiolas. A certeza que quem quer que ele achasse seria mais um alcaçuz de William Desham borbulhava na boca de seu estômago, mas havia uma oportunidade também.

Ele olharia os arquivos e registros fingindo buscar somente o culpado pela sinestesia caótica nas docas, esperando que o criador deixasse à mostra detalhes incriminadores de outros delitos.

"Sua arrogância vai abrir a porta da sua cela, traficante maldito..." ele pensou uma última vez antes de deixar a sala.

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Rafael Lois
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Escritor amador. Criador do mundo de Rhuhilia. Dono da página Contos de Rhuhilia no Facebook http://facebook.com/rhuhilia