o blues que seu solecismo me causou.
A mulher andava devastada pelos corredores feitos para bíbolos. Carregava um maço de brushcetta sem medo — se é que você a compreenderia. A enorme sala estava cuidadosamente limpa, com bonsais e sofás retrôs convidativos. Respirou fundo antes que tomasse a decisão de encontrar sua psicanalista, Catacrese. “Eita mulherzinha de boa índole.” Antes que pudesse se aconchegar na metáfora, ouviu seu nome ecoar pelos quatro cantos:
— Alecrim!
Acendeu sua droga e sem repugno caminhou até sua doutora. É claro que foi examinada de cima à baixo e recebida com um olhar zeugma: cada traço avistado era um ponto negativo. Sentou na poltrona com os pés para cima do braço do cômodo e no meio de cada tragada, se lembrava de cada detalhe que lhe levou até ali. Catacrese mal conseguia se concentrar com tamanha quantidade de fumaça que tomava conta da sinestesia.
— Mas me diz Alecrim, você admite esse blues?
Ela parou para pensar. Seus neurônios não trabalhavam de forma eficiente à essa altura. Os pensamentos anacolutos iam de encontro com o dito cujo, da noite em que foi despedaçada e ali enxergou seu amor próprio cair feito babosa. Os olhos marejados deixavam evidentes o peso de uma ferida recém-aberta.
— Diagnóstico de Solecismo. O tratamento começa por dentro, cê entende, Alecrim? De qualquer forma, vou lhe indicar um psiquiatra, doutor Hipérbato é um grande amigo meu e garanto que ele vai dar sentido a essa sua bagunça sentimental.
Secou as lágrimas convencida de que estaria curada mais rápido do que imaginou. Antes de sair do consultório, deu um longo abraço na psicanalista, daqueles que desacelera seus batimentos. Sentia-se em casa e como uma última despedida, revelou o inconveniente:
— Solecismo? Eu achava que era alguma Silepse.
Esse texto foi escrito como o segundo desafio do Clube da Escrita, cujo tema foi Ressignificado.
