Preguiça
— Chefe… Encontramos mais uma…
O tom de voz abatido do cabo antevia o horror na alma do delegado. Nunca em seus vinte e lá se vão anos de carreira ele trabalhou numa operação que trouxesse tanta angústia e vontade de se afastar.
Nos últimos dias, uma mãe preocupada ligou para a 42a DP porque sua filha não fazia contato a mais de três dias. Ela disse que a jovem e uns amigos haviam alugado uma casa no Recreio dos Bandeirantes para passar o feriadão, mas já era terça-feira e nada de ela ligar. O delegado prometeu mandar uma patrulha até o endereço, para ter certeza de que estava tudo bem. Mal sabia ele que entraria em um pesadelo.
Não demorou muito para a patrulha solicitar perícia, pois haviam achado um corpo. Com a voz da mãe pesando em sua consciência, o delegado decidiu acompanhar.
O muro da casa tinha a aparência decaída, com o cimento aparecendo em várias partes onde a tinta havia descascado, e outras onde o limo havia tomado conta. A porta de madeira entreaberta estava apodrecendo nas dobradiças.
A casa em si parecia razoável, bonita até, mas algumas teias de aranha denunciavam o abandono que ela sofria entre as temporadas alugadas.
Logo no quintal da frente havia uma piscina, não muito grande. Os técnicos forenses andavam em volta e dentro da piscina. Uma jovem de vinte e poucos anos estava deitada sobre uma lona úmida no chão da piscina, sua pele de um branco cadavérico.
— Afogada, enrolada na lona. Não havia muita água na piscina quando chegamos, mas pelo peso do tecido ela não conseguiu se levantar. — disse um deles. — Encontramos outros dentro da casa.
Haviam três no total, contando com a garota na piscina. Cada um em um cômodo diferente, envolvido e morto pelo que parecia uma perversão das máquinas de Rube Goldberg, armadilhas elaboradas para trazer a morte às vítimas numa cerimoniosa lentidão.
— Jesus amado… — coisas assim faziam o delegado questionar o quanto havíamos falhado com o sacrifício do messias.
— Chefe! Há uma pessoa aqui! — um dos cabos gritou, dos fundos da casa.
Ao lado de uma churrasqueira de tijolos, quase colada com o muro que dividia o terreno com a casa vizinha, havia uma portinha que ligava a um cômodo que servia de depósito. Os policiais lutavam para libertar uma jovem que chorava desesperada de um emaranhado de fios de arame, objetos alinhados e outras coisas.
— Ele estava lá! Olhando pela janela! — ela balbuciava, quase sem forças. — Ele só olhava! Ele e aquela cara de preguiça horrorosa…
— Calma, minha filha. Você está segura. — o delegado acalmou-a. — O que você se lembra?
— Eu acordei no meio daquela bagunça, e pela janela aquela preguiça me olhando, as coisas se mexendo… Aí ouvi um barulho, pareciam gatos brigando, e a preguiça não estava mais lá… — a jovem tremia, os olhos fechados. Ela tinha um corte no pescoço, mas por pouco ela não teve a carótida perfurada.
— Aquela maldita… preguiça…