A segurança psicológica — e a responsabilidade de cada um

Ana Laura Vieira de Andrade
clubedaescrita.cc
Published in
5 min readApr 3, 2023

Quando as pessoas se sentem psicologicamente seguras são capazes de contribuir mais, aprender com seus erros e fomentar a inovação.

Você já sentiu uma sensação de bem-estar após uma reunião em que você contribuiu com ideias e mudou o rumo de um projeto? Você já teve aquela sensação de que aprendeu algo importante com um erro, mais do que participando de um curso?

O tema Segurança Psicológica surgiu na década de 60, mas teve destaque em 1999 por Amy Edmondson, professora da Harvard Business School.

Ganhou relevância no ambiente corporativo quando a Google conduziu o Projeto Aristóteles (1), um estudo investigando o que faziam as equipes mais eficazes da empresa. Os altos executivos acreditavam que bastava combinar as melhores pessoas — as mentes mais brilhantes reunidas no mesmo time.

Após alguns anos de estudo, os resultados foram surpreendentes: não existem regras e/ou padrões milimetricamente definidos que garantirão que o trabalho em equipe seja eficiente, mas concluíram que existem 5 características nos times eficazes: segurança psicológica, confiabilidade, estrutura e clareza, significado e impacto. Sendo a segurança psicológica a de maior relevância.

Na visão de Amy Edmondson(2), um ambiente psicologicamente seguro tem como crença compartilhada a possibilidade de assumir riscos interpessoais, o que significa que as pessoas:

  • sentem-se confortáveis para propor novas ideias sem serem julgadas;
  • sentem-se seguras para mudar de ideia ou discordar;
  • estão em um ambiente no qual a vulnerabilidade não é punida;
  • sentem-se seguras em correr riscos, pois a cultura de feedback facilita a correção de rota.

Você já ouviu seu líder falar que mudou de ideia 15 minutos após uma decisão ou no dia seguinte? Você se sente tranquilo para discordar de algo e apresentar um novo ponto de vista? Você recebe feedbacks claros e sinceros que te ajudam a melhorar? Se todas as respostas forem sim, isso significa que é possível assumir riscos interpessoais nesse ambiente.

Por outro lado, quando há um ambiente de baixa segurança psicológica, as pessoas não se mexem — com medo, se fecham, se autocensuram e redirecionam sua energia para o gerenciamento de riscos, prevenção da dor e autopreservação.

Nesse ambiente a cultura do silêncio surge de mansinho e como um mecanismo de defesa para gerenciar impressões as pessoas preferem:

  • não fazer perguntas — para não parecer ignorantes;
  • não admitir erros — por medo de julgamentos;
  • não apresentar ideias — para não parecer intrometido;
  • não criticar o status quo — para não parecer negativo.

E assim, um círculo vicioso se inicia — se eu falar, sou julgado, portanto, não falo e nem contribuo!

Em um momento em que a necessidade de inovação, diversidade, reskilling, empatia e habilidades emocionais são um imperativo para o sucesso dos negócios, não há espaço para ambientes com baixa segurança psicológica.

Na minha visão, o primeiro passo para implementar um ambiente psicologicamente seguro é conectar esse tema à cultura organizacional, apresentando quais são os valores e crenças que fomentam esse ambiente. A mensagem deve ser clara, objetiva e ter o patrocínio da alta liderança.

Além disso, atuar no desenvolvimento das Lideranças, em todos os níveis, para que entendam o que é, quais os impactos e como incorporar comportamentos específicos que contribuam para promovê-la. O líder da atualidade precisa gerenciar times diversos, ser carismático, ter empatia, autorregulação, habilidades emocionais e sociais e um ego bem controlado. Desta forma, será capaz de promover um ambiente onde as pessoas tenham autonomia, conversem de forma aberta e sincera, expressem suas ideias e confiem umas nas outras.

Também é fundamental atuar na conscientização das equipes para que compreendam que o ambiente de trabalho é responsabilidade de cada indivíduo e uma jornada guiada pelo próprio time. Sem dúvida, o líder, por ser o “maestro” da equipe dá o tom e influencia muito o ambiente. Por outro lado, os membros da equipe influenciam uns aos outros e colaboram para criar esse ambiente. Isso significa que cada um pode fazer o que está ao seu alcance, como por exemplo: se conectar com os demais colegas, apoiar, escutar uns aos outros e adotar uma postura de aprendiz ao longo da vida, contribuindo e fazendo a diferença no time.

Gosto muito da abordagem dos 4 Estágios da Segurança Psicológica(3), desenvolvida por Timoth Clark, fundador e CEO da LeaderFactor. Segundo ele, a segurança psicológica segue uma progressão baseada em uma sequência natural de necessidades humanas.

Essa abordagem pode ser o alicerce de um programa estruturado que irá promover um ambiente onde as pessoas são incluídas, aprendem, contribuem e têm permissão para discordar e divergir.

O primeiro estágio é a Segurança de Inclusão, que satisfaz a necessidade humana básica de se conectar e pertencer. Ao pertencer a um novo grupo ou sociedade, as pessoas desenvolvem um senso de identidade compartilhada, e interagem com seus membros sem medo de rejeição ou humilhação, aumentando a confiança, a resiliência e a independência.

O segundo estágio é a Segurança para Aprendizagem, que satisfaz a necessidade humana básica de aprender e crescer. Permite que as pessoas se sintam seguras à medida que se envolvem em todos os aspectos do processo de aprendizagem — fazer perguntas, dar e receber feedback, experimentar e até cometer erros. As pessoas ficam mais dispostas a ser vulneráveis, assumir riscos e desenvolver a resiliência no processo de aprendizagem.

O terceiro, a Segurança para contribuir, satisfaz a necessidade humana básica de contribuir e fazer a diferença. As pessoas se sentem seguras em contribuir usando suas habilidades e capacidades para participar do processo de criação de valor. Sentem-se empoderadas por meio da autonomia, da orientação e do encorajamento em troca de esforços e resultados.

O último estágio, a Segurança para Desafiar o Status Quo, satisfaz a necessidade básica humana de querer melhorar as coisas. As pessoas sentem-se seguras para desafiar o status quo quando não há retaliação ou o risco de prejudicar a reputação pessoal. Ter o respeito e a permissão para discordar e divergir quando achar que algo precisa mudar. Permite superar a pressão pela conformidade e nos dá a licença para inovar e sermos criativos.

Por fim, a segurança psicológica ajuda a promover benefícios não só para os funcionários, mas também para os empregadores. Ter um ambiente de trabalho saudável, onde as pessoas expõem suas ideias e habilidades sem preocupações e como consequência alcançam a inovação e o alto desempenho, ressalta a importância desse tema nas organizações.

Sim, é papel da liderança promover um ambiente psicologicamente seguro, mas como membros de uma equipe temos ao nosso alcance a oportunidade de fomentar — ou destruir — esse ambiente.

E você, está fazendo tudo que está ao seu alcance?

Referências:

(1) Google — Projeto Aristóteles https://www.nytimes.com/2016/02/28/magazine/what-google-learned-from-its-quest-to-build-the-perfect-team.html

(2) Amy Edmondson — Livro: A organização sem Medo

(3) Timothy Clark — Livro: The 4 stages of psychological Safety

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