Recursos Humanos ou Relações Humanas, qual futuro queremos?

Heloísa Marques Villela
clubedaescrita.cc
Published in
5 min readNov 17, 2023
Foto Cori Emmalea Rodriguez

Imagine ter mais horas no seu dia para você se exercitar, ficar com a família, estudar, encontrar com amigos, fazer um curso de música ou teatro — seja lá o que te faça feliz.

Isso pode ser possível se você tiver um trabalho com tecnologia e recursos a sua disposição para te ajudar a ser uma pessoa mais produtiva.

Imagine ainda que, nesse trabalho, você vivencia real conexão com as pessoas. É um ambiente onde todas e todos se importam uns com os outros, falam sobre seus sonhos e suas preocupações. Um ambiente onde o erro é bem-vindo e temos espaço seguro para experimentar e testar sem julgamento.

Gostou do que imaginou?

Quando leio sobre tendências para o futuro do trabalho vejo que muito se fala em tecnologia como aliada, a inteligência artificial que vai tornar o nosso trabalho mais produtivo, profissões que deixarão de existir para dar lugar a outras que ainda nem existem e, o principal, para máquinas não tomarem o trabalho de humanos precisamos ser humanos.

Essa ideia de que precisamos ser humanos me intriga, e me faz ponderar sobre o que nos tem feito menos humanos.

Eu diria que é a falta de conexões.

Sei que a vida está uma loucura e mal achamos tempo para nós mesmos. As vezes não temos tempo nem para as pessoas que moram em nossas casas — é no máximo um bom dia e boa noite. Quem consegue tempo para se conectar com colegas de trabalho faz um verdadeiro milagre.

E aí entra a pegadinha da vida!

Futuristas, como Amy Webb e Gerd Leonhard, apontam tendências que mostram que o futuro do trabalho será sobre as pessoas e as suas relações, estamos passando por várias transformações no aqui e agora que nos levam por esse caminho. Se queremos estar nesse futuro precisamos olhar para as pessoas e valorizar essas relações. Precisamos fazer o que falamos que não temos tempo para fazer.

“No passado os empregos dependiam dos músculos, agora dependem do cérebro, mas no futuro vão depender do coração”
Minouche Shafik — Diretora da London School of Economics

Evidências das transformações no agora

Estamos vivendo a grande crise de saúde mental. Danos mentais e a saúde são causados pelo trabalho e pela forma como as relações estão sendo tratadas. Uma crise que se intensificou ainda mais com a pandemia da Covid 19. Desde que essa “gota d’água” caiu em um copo que há muito já estava para transbordar só se fala nisso.

Sempre ouço que, para cuidar da saúde mental, é preciso separar a vida pessoal do trabalho, como se fossem mundos diferentes. Não acredito que seja possível separar a vida pessoal do trabalho. Em nosso trabalho, seja qual ele for, existem pessoas e relações. Se cuidarmos com mais carinho dessas relações, conseguiremos transformar nossa relação com o trabalho.

Além da crise da saúde mental, temos a crise da alta performance, a crise do propósito, a crise geracional (várias gerações trabalhando juntas na mesma equipe), e temos vários movimentos que surgem para cada uma dessas crises como por exemplo great resignation, quiet quitting, entre outros.

Se nós listarmos todas as crises, movimentos e dados que evidenciam esse período de transformação que estamos vivendo teremos mais uns dois artigos sobre o tema.

O que conexões entre as pessoas tem a ver com tudo isso

Em suas pesquisas, Brené Brown tem revelado muitos insights sobre como a vulnerabilidade impacta nossos relacionamentos e a forma como nos conectamos com outras pessoas.

De acordo com essas pesquisas, a vulnerabilidade é a chave para criar conexões autênticas e genuínas entre as pessoas. Brené define vulnerabilidade como a coragem de se expor, de ser uma pessoa autêntica, mesmo quando não temos controle sobre o resultado disso. É se permitir ser visto como realmente somos, com todas as nossas imperfeições e emoções. É o que nos define enquanto humanidade e nos difere das máquinas.

Conectando com as tendências do futuro do trabalho, a vulnerabilidade, a abertura ao erro e o ambiente de segurança psicológica, nos ajudam a conectar com as outras pessoas e a construir relações mais saudáveis.

A tendência existe graças a algumas empresas que já perceberam as vantagens da estrutura organizacional focada em pessoas e suas relações, e um outro movimento — que não é novo — vem ocupando mais espaço, chamado de People Centric (pessoas no centro).

Nesse modelo, o centro da estratégia de uma organização está voltado mais para pessoas do que para sistemas. São práticas e políticas que visam criar um ambiente onde as pessoas sejam capazes de trazer mais autenticidade, mais delas mesmas, ao invés de precisarem vestir máscaras para se encaixar nos tradicionais modelos organizacionais. Promovendo uma cultura humanizada e cheia de conexões.

As vantagens para as empresas:

· Retenção de talentos

· Aumento da produtividade

· Promoção da inovação e da criatividade

· Ambiente de vulnerabilidade e segurança psicológica

· Resiliência e capacidade de adaptação

· Satisfação de clientes

· Reputação e marca empregadora fortalecida

A conclusão disso é: se ainda estamos olhando para as pessoas apenas como recursos, estamos fazendo errado. Pessoas são pessoas!

Eu quero aquele ambiente imaginado no começo deste artigo, esse é o trabalho dos meus sonhos e eu tenho certeza de que é o seu também. A boa notícia é que nós podemos começar a construir esse futuro que queremos hoje mesmo, é o primeiro passo de cada pessoa que transforma as organizações.

Procure criar essas conexões, ir além do bom dia, boa tarde e boa noite. Procure conhecer quem está à sua volta, você pode se surpreender com o que descobrir. A cada planejamento vamos incluir, abrir espaço para as vulnerabilidades, criar as políticas e iniciativas que favoreçam esse ambiente de boas relações.

As boas relações sempre trazem bons retornos e é assim que vamos construindo a nossa rede do bem.

Enquanto lideranças, colegas de trabalho e pessoas, precisamos virar a chave de recursos humanos para relações humanas e suas conexões.

Fontes e referências:

7 movements that will help you understand the future of work

The future of jobs report 2023

Keys to a true People Centric culture at work

Saúde mental deve ser encarada como fator de produtividade

O poder da vulnerabilidade — Brené Brown

State of the Global Workplace Report — Gallup

The Deloitte Global 2023 Gen Z and Millennial Survey

Futuro do trabalho: 18 tendências que irão mudar nossa realidade — Forbes

How Quiet Quitting became the next big phase in the Great Resignation — Forbes

Is Quiet Quitting real? — Gallup

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