Coding Rights no G20: um empurrãozinho para ter criptografia, gênero e proteção de dados na agenda de digitalização

Kimberly Anastácio
Coding Rights
Published in
3 min readJun 29, 2017

“A globalização pode ter uma face humana”.

Com essas palavras, a chanceler alemã Angela Merkel recebeu em Hamburgo, entre os dia 18 e 19 de junho, entidades da sociedade civil para o Civil20 Summit, evento organizado por e para a sociedade civil trocar reflexões críticas e perspectivas políticas sobre a agenda do Grupo dos 20, os principais países industrializados e economias emergentes.

O G20 funciona como um fórum internacional informal que foi criado inicialmente para coordenar políticas de reforma no sistema financeiro. Hoje, o grupo se debruça sobre temas dos mais diversos, que demandam envolvimento e participação de todos os setores da sociedade. O C20 é um dos seis grupos de engajamento (Business20, Labour20, Science20, Think20, Women20 e Youth20) que propõem recomendações de políticas, monitoram e avaliam a implementação dos compromissos do G20.

Recentemente, a digitalização se tornou um ponto constante de discussão no G20. A Alemanha, país-presidente do grupo em 2017, estabeleceu o tema como uma das prioridades do ano. Ainda assim, essa priorização não se reflete no C20: há pouco engajamento de entidades e ONGs que lidam com o tema nesse espaço e, potencialmente por isso, a digitalização acaba sendo muito associada com a automação e perda de empregos dentro dos países do Grupo dos 20, e não com direitos humanos na economia digital.

A Coding Rights esteve presente no C20 Summit tentando mudar esse quadro. Nosso objetivo foi trazer questões digitais para o evento de forma a garantir algum compromisso (ainda que leve) com a proteção de dados pessoais e a importância da criptografia para as/os usuárias/os da Internet. Assuntos desse tipo ainda são de difícil compreensão para ativistas que possuem expertise em áreas mais específicas, como proteção ambiental e direito trabalhista. Ainda assim, a reação das entidades presentes no evento à proposta foi positiva.

Também participamos de um workshop sobre desenvolvimento econômico das mulheres. Na ocasião, participantes destacaram a inclusão digital como uma prioridade para meninas de todo o mundo. Aproveitamos para trazer a discussão do uso de tecnologias para o empoderamento das mulheres e a importância da criptografia para proteger as nossas identidades online. Também nos envolvemos do único espaço do evento sobre digitalização, o workshop “A agenda de digitalização do G20: por que a sociedade civil deve se importar?”. Participantes demonstraram interesse em compreender como a Internet e as novas tecnologias impactam as agendas de ativismo de praticamente todos os grupos e movimentos sociais.

O ponto alto do evento foi a fala proferida pela chanceler alemã, Angela Merkel, na cerimônia de encerramento do C20. Além de destacar a liberdade de expressão como um direito fundamental (à luz dos protestos que entidades alemãs tem organizado para a reunião do G20, que acontecerá em algumas semanas em Hamburgo), Merkel levantou a pauta da privacidade em um mundo globalizado. Segundo ela, a digitalização é uma realidade na economia atual e a proteção de dados deve ser prioridade, inclusive através da construção de normas internacionais nesse sentido.

A proposta de Merkel poderia ser mais uma passo na humanização da globalização. Embora o debate sobre criptografia, proteção de dados, privacidade e tecnologização da vida possa parecer distante do ativismo e do conhecimento dos movimentos sociais mais tradicionais, como os sindicatos, ONGs de pequenos agricultores, entidades de proteção ao meio ambiente e de educação infantil, essa edição do C20, demonstrou que a distância não se justifica. É preciso unir esforços para assegurar os direitos para os quais lutamos há tempos, agora “digitalizados”.

A participação mais incisiva da sociedade civil através do “Civil 20” começou durante a presidência russa em 2013. Desde então, organizações da sociedade civil tem buscado participar regularmente no grupo. Ano que vem, a presidência estará em mãos latinas e teremos o primeiro encontro do G20 na Argentina. Esperamos que a pauta digital se faça mais presente ao longo das discussões e que a sociedade civil engajada ocupe esse espaço. Se conseguirmos emplacar algumas linhas substantivas nos textos finais do G20 da Argentina (ou ao menos no C20) sobre criptografia e dados pessoais, já teremos avançado em relação a 2017.

Enquanto isso, é possível acessar as recomendações do C20Summit desse ano aqui.

--

--