elogios inusitados, cep e envivecimento

Bruna C.
com café me expresso
2 min readDec 3, 2019

foi quando elogiaram minha caligrafia, logo depois de ouvir que tenho “letra de professora” enquanto preenchia um formulário aflita com os últimos dígitos do cep que sempre desaparecem quando precisamos deles. ali avivou minha criança interior e seu antigo sonho de ser professora.
ainda em busca do código de endereçamento postal, me encontrei na memória daquela menina, como se fosse eu de novo. em tempos mais calmos, uma eu que ainda fazia planos e tinha curiosidade pelo futuro, não medo dele. e que naturalmente conseguia memorizar informações importantes.

tenho algumas teorias sobre o envelhecer. de primeira, é inevitável. assim como são inevitáveis as crises de idade, que costumam ser mais cruéis nos múltiplos de 5. a dos trinta que me aguarde.

mas parece que todo esse processo é atenuado ao reviver lembranças infantojuvenis. sem demasia, pois quem vive de passado é museu. precisa ter espaço pra decepções futuras, sempre. é vivendo que se aprende, né? e viver é tentativa e erro. e depois tem a culpa pelos erros. só depois da culpa, o aprendizado. seria conhecimento acumulado um sinal da velhice? longevidade. porque a gente enquanto sociedade não costuma lidar bem com a velhice, né? que nunca me chamem de velha. quero chegar ao fim da vida com meu diploma de trouxa. podem me chamar de trouxa, tá na categoria de elogios inusitados. pra mim, ser trouxa é sinônimo de experiência de vida.

outra teoria é a possibilidade de burlar o sistema. não falo do aspecto biológico, porque isso é muito black mirror. mas de compreender o envelhecer de outras formas. de formas mais gentis, de coração aberto. buscar novas sensações. ou novos significados para as sensações já conhecidas.

sensação de envivecer. é sobre continuar vivendo, aprendendo e ensinando. foi o que eu senti quando lembrei da minha criança interior. sabe aquele formulário que eu tava preenchendo? ele me levou a um projeto muito especial. plantar alface foi só uma das coisas que aprendi por lá. e nunca vou esquecer da pessoa que me ensinou, pelo sorriso e pela frase que ela me disse:

— acabei de aprender e já tô ensinando!

photo by Matthew Oosthuyse

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