Crítica | Homem-Aranha: Longe de Casa

Adam William
Adam William
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5 min readJul 8, 2019

Foi com Tony Stark, o Homem de Ferro que este universo começou. E é com Stark que ele irá terminar. Pelo menos é assim que Homem-Aranha: Longe de Casa (Spider-Man: Far From Home) fecha em definitivo a Saga do Infinito, questionando se Peter Parker (Tom Holland) será “o novo Homem de Ferro” para o universo.

Sucedendo os eventos de Vingadores: Ultimato, a primeira visão do mundo sem Tony Stark e Steve Rogers não é tão melancólica quanto poderia ser. E de fato, tal melancolia não vestiria bem um filme do amigão-da-vizinhança. O que chama atenção nesses primeiros minutos é a pressa com que a trama se constrói para empurrar o herói em uma jornada que flerta com conceitos mais profundos dos quadrinhos, mas não vai tão “longe” quanto o título sugere. Afinal, é do Marvel Studios que estamos falando e este filme é acima de tudo, um epílogo.

Assim, somos apresentados à duas tramas distintas: Peter Parker e seus amigos saem em uma excursão pela Europa, enquanto Nick Fury (Samuel L. Jackson) e Maria Hill (Cobie Smulders) unem forças com Quentin Beck (Jake Gyllenhaal) para lidar com a ameaça dos Elementais, monstros de fogo, água, terra e ar vindos de outro mundo e que agora ameaçam o nosso. Não tarda para que as histórias colidam, o que forçará Peter em um conflito que o definirá enquanto o herói que ele sempre aspirou a ser.

A grande evolução que Longe de Casa nos apresenta em comparação a De Volta ao Lar é a direção nas cenas de ação. Retornando na direção, Jon Watts demonstra um maior controle de câmera e inventividade que fazem grande diferença nos grandes momentos do herói, resultando em planos-sequência curtos, mas aproveitando muito melhor o personagem e os cenários onde as cenas se desenrolam. E se o filme anterior carecia de uma sequência de ação memorável — ainda que o Abutre de Keaton fosse muito interessante visualmente –, Far From Home tem um dos melhores embates envolvendo o herói, remetendo diretamente aos quadrinhos, algo que era devido ao espectador desde que o Aranha de Tobey Maguire enfrentou Octopus no metrô — isso 15 anos atrás.

Por baixo da máscara pela quarta vez, Tom Holland não apenas se mostra à vontade no papel de Peter Parker, como também se aprofunda mais no íntimo do personagem. Se antes seus problemas passados eram abordados por entrelinhas, agora o garoto mostra um certa vulnerabilidade que faltava à sua versão do teioso. O Homem-Aranha é e sempre foi um dos personagens mais carregados de dramas pessoais e agora podemos ver parte desses dramas surgirem no MCU, em parte pelo pilar principal do herói — Tony Stark — ter sido removido da história, mas principalmente pelo texto de Chris McKenna e Erik Sommers — dupla que co-escreveu De Volta ao Lar e Homem-Formiga e a Vespa — optarem por abordar mais de Peter e menos do Homem-Aranha.

Já o Mysterio de Gyllenhaal recebe todo um tratamento que faz com que o personagem — um vilão de segunda nos quadrinhos — seja crível e vá além de só funcionar: aqui, Quentin Beck tem toda uma motivação que não somente convence, mas se encaixa no MCU sem descaracterizar o personagem. Sua presença não somente é enaltecida pela atuação de Gyllenhaal como também pelo texto que faz de Quentin Beck uma antítese de Peter Parker: mais maduro e seguro de si, o personagem é tudo que Parker gostaria de ser e a evolução de sua subtrama só convence devido a química do ator com Tom Holland.

Já aos personagens coadjuvantes, não há muito o que fazer senão funcionarem como um artifício de roteiro — Nick Fury, MJ — ou protagonizarem gags bem elaboradas — Tia May, Brad, Ned Leeds — e surpreendentemente o personagem secundário de maior destaque é o Happy Hogan de Jon Favreau. O personagem age como um pseudo-mentor do herói e ajuda na devida passagem de bastão — a escolha de AC/DC na trilha só evidencia isso –, atribuindo um contorno mais significativo nessa questão, pois além de interpretar o segurança de Tony Stark, Favreau esteve presente no início do MCU, dirigindo o Homem de Ferro que deu o pontapé inicial de tudo. Um detalhe que faz toda a diferença para quem acompanhou toda a jornada.

Se Watts acerta na condução de seus bons e ótimos personagens, o roteiro se atrapalha ao tentar equilibrar todas as tramas dentro de um filme de duas horas. O ritmo do longa, algo tão bom em De Volta ao Lar é sacrificado durante toda a primeira metade, que parece não chegar a lugar nenhum — parte disso se deve aos Elementais serem menos interessantes que ver uma aranha tecendo sua teia –, mas corrigindo-se após uma “reviravolta” já esperada pelo público familiar à este universo. Após uma emblemática sequência — que deve valer o 3D –, o filme finalmente mostra a que veio e encaminha-se para um dos embates finais mais legais em um filme de super-heróis. Não só em termos visuais, já que a sequência é também responsável por nos re-apresentar ao Homem-Aranha, com este sendo um herói muito mais completo e próximo dos quadrinhos agora. E também permite um gancho sensacional na primeira cena pós-créditos que promete deixar qualquer fã do teioso emocionado e empolgado pelo futuro do personagem.

É intrigante analisar Homem-Aranha: Longe de Casa pelo que ele é, não pelo que devia ser. Começa como um epílogo para uma história contada durante 11 anos — com o herói entrando subitamente após a metade dela — e termina como uma aventura que redescobre seu protagonista e o coloca no seu lugar de direito: não necessariamente no holofote da Marvel, mas em Nova Iorque, perante seus cidadãos comuns que por vezes o amam, por vezes o odeiam. É verdade que se perde um pouco nesse meio, mas encontra seu caminho, deixando claro que esta é uma nova fase para o herói. Homem-Aranha. Herói — ou ameaça?. Vingador. Amigão-da-vizinhança.

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Adam William
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