Meu garoto
Entre meu avô adotivo e eu, cinquenta anos de diferença. Cinquenta
medos bobos, cinquenta ansiedades. Cinquenta motivos para o silêncio.
- Vovô, preciso contar uma coisa para você.
O silêncio ia e vinha como maré calma naqueles olhos azuis. No
parque, as árvores se acotovelavam para assistir.
- Eu não tenho interesse nas meninas. Eu gosto mesmo é dos
meninos.
De súbito, meu avô enrijeceu.
- Você não é gay.
Tive impressão de ser conduzido à guilhotina.
- Quis te contar porque confio em você… Meus pais ainda não
conseguem me entender e…
O carinho do velho me interrompeu.
- Para mim, você não é um gay, mas somente meu neto.
Vovô segurou minhas mãos chorosas e jurou fidelidade. “Deixa de
tristeza, garoto, que eu te amo do seu jeito!” Respirei, enfim. Por
insistência do avô, tiramos uma foto de lembrança. Nele, o sorriso por
merecer tamanha confiança. Em mim, a careta para segurar o choro.
Saímos do parque rindo, falando alto, de mãos e braços dados.
Chegando em casa, meu velho não se conteve:
- Acho que pensaram que somos namorados.
Foi assim que nunca mais nos desgrudamos.
Henrique Vitorino