As telas estão ganhando

A Apple –com seu estilo já conhecido de apresentar os novos produtos– revelou no passado 27 de outubro os modelos repaginados de MacBook Pros. Utilizando o browser Safari, pude assistir em streaming as revelações das novas features dos laptops apresentadas por Phil Schiller, vice-presidente sênior de marketing. Como era de se esperar, as máquinas estão mais leves, mais finas, mais rápidas. Mas o que surpreendeu a plateia foi o lançamento da Touch Bar –uma barra de toque na parte superior do teclado que se adapta a comandos específicos relacionados ao aplicativo sendo usado no momento.

Porém, de todas as novidades tecnológicas feitas na apresentação, o que me impactou mais foi a melhora na qualidade das imagens vistas nas telas (atenção para o novo monitor ultrafino feito em parceria com a LG que apresenta resolução de 5K). Nos últimos anos, pudemos vivenciar uma evolução exponencial da resolução das telas de televisão e monitores de computador. Isto significa que, cada vez mais, assistir vídeos e trabalhar com imagens de forma geral serão experiências extremamente agradáveis, levando-nos a depositar inevitavelmente mais fichas do nosso banco de atenção nestas máquinas.

Kevin Kelly, em seu último livro The Inevitable, comenta em determinado momento que a decisão sobre como nosso descanso intelectual –momentos de lazer em que consumimos algum conteúdo enriquecedor– se resume atualmente a uma batalha entre livros e telas.

Não vou mencionar os benefícios que a leitura de livros impressos traz ao usuário (quem gosta de ler já sabe do que estou falando), nem comentarei que o livro impresso é uma interface sofisticada, aprimorada e amadurecida através de séculos, e que os outros devices têm ainda muito a melhorar.

Ao mesmo tempo, não posso ocultar uma certa mistura de Weltschmerz com preocupação pelo cenário vivido: as telas estão ganhando. Sem dúvida, os usuários ganhamos muito também com o avanço tecnológico em termos de produtividade, conectividade e entretenimento. E o que perdemos? Para começar, a capacidade para descansar e desconectar do mundo online.

Embora seja difícil medir com precisão as consequências do excesso de consumo digital, é bem provável que profissionais ligados a educação infantil e pediatria estejam vendo desdobramentos bem concretos no público jovem, ou não teriam publicado um relatório intitulado Media and Young Minds, em que alertam para o uso excessivo de mídias digitais por parte do público de 0 a 5 anos. O informe associa o alto consumo de mídias digitais a problemas como obesidade, distúrbios do sono e de desenvolvimento emocional/cognitivo e chega inclusive a propor aos pais a elaboração de um plano de mídia familiar, limitando o tempo de exposição a mídias digitais a não mais de uma hora por dia.

As telas estão ganhando. Só não podemos perder a liberdade de estar offline.

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Pedro Sigaud Sellos
Sistemas de Informação, Comunicação e Mídia

Associate Dean@MBRSCAUD & Professor @AUDubai; #Media #Leadership #DigitalStrategies #News #Entertainment. Currently living in Dubai.