“A casa grande não está preparada para ver nós crescendo”

A importância do Afrofuturismo na arte, na moda e nos sonhos do bairro Mario Quintana.

Sthefany Canez
Comunicação Socioambiental
4 min readJun 21, 2023

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Por Sthefany Canez

Falar sobre Afrofuturismo é pensar além do conceito da palavra. “Nós devemos um jeito de cuidar uns dos outros, como se fossemos uma única tribo”. A frase é dita no filme Pantera Negra, um dos principais exemplos do movimento político, entretanto, foi originalmente de acordo com o Nexo Jornal, por um filósofo branco em 1994 chamado Mark Dery responsável pelo ensaio “Black to the Future” em uma entrevista feita com três intelectuais negros: escritor Samuel Delany, o escritor e músico Greg Tate e a crítica cultural Tricia Rose.

Mas não é ele quem tem os méritos dessa organização, mas sim artistas como Sun Ra e a escritora Octavia Estelle Butler, que conviveram na pele com o auge da segregação racial nos Estados Unidos. A partir dessas vivências, deram o pontapé inicial para imaginar a negritude em meios políticos, estéticos e culturais, graças a dois alicerces: a ficção científica e a fantasia. Assim conduzem o negro ao protagonismo que deveria ser o seu lugar, uma urgência de resgatar o seu passado para imaginar o futuro do seu povo, uma utopia da ancestralidade.

A chegada no Brasil

Nos últimos anos, devido à globalização, o Afrofuturismo começou a ser mais difundido no país, uma artista pioneira que usou e continua usando deste meio político é Gaby Amarantos. Entrevista concedida para o programa Mini Saia da GNT em 2020, ela disse: “A tecnologia e o despertar político me fez querer entender mais sobre a minha ancestralidade, para querer entender mais sobre essa parada do Afrofuturismo”. O movimento ganha mais força com a presença da diversidade cultural que há nos diferentes estados: as múltiplas religiões, a beleza dos povos indígenas, Iorubás (povo de origem africana) e as riquezas de elementos estéticos do Norte e Nordeste.

Uma importante referência internacional é a cantora americana Beyoncé Knowles, que além de enumerar muitos sucessos, procura conscientizar seu público sobre a história do povo negro, desde 2016 em seu álbum audiovisual “Lemonade”. Por mais que a temática principal do disco não seja sobre o Afrofuturismo, em seu discurso mostrou a importância de resgatar seus ancestrais para que assim o futuro possa ser persistente. Na introdução da sua última música do álbum, ela desabafa:

Você girou o ouro desta vida difícil

Beleza conjurada do que foi deixado para trás

Encontrou a cura onde não morava

Descobriu o antídoto em sua própria cozinha

Quebrou a maldição com suas próprias mãos

Você passou estas instruções para sua filha

Quem então passa para a filha.

Depois deste álbum, a cantora fez questão de persuadir ainda mais seu discurso de maneira mais clara em “Black is King” e por último em “Renaissance”. Por isso Beyoncé é exemplo para muitas pessoas , entre elas um dos moradores do Bairro Mário Quintana.

O Designer de Moda, Lucas Nunes da Silva, de 24 anos, apesar de não ter cursado moda e este ser seu grande sonho, ele é movido na sua arte pela estética do Afrofuturismo. Rodeado de mulheres, sendo elas as suas inspirações para seguir na área de atuação, elas também são as modelos presentes em seus desenhos.

O Designer de Moda, Lucas Silva — Crédito: Lucas Nunes da Silva
Desenho de uma mulher vestida inspirado em trajes africanos — Crédito: Lucas Silva

Para Lucas a moda é mais do que ato de criar roupas, é um ato político. Eu me expresso no vestir, eu me expresso no usar”. Ele também faz questão de tentar romper barreiras nas suas vestes. O Designer entende que por onde quer que vá, as pessoas do bairro o acompanham: “A comunidade é minha família, sou de todas as famílias, não sou só de uma”. E ainda tem consciência que a sua própria vitória serve de reflexo para as próximas gerações: “se um sobe, todos sobem”.

Desenho de uma mulher vestida com o decote aberto — Crédito: Lucas Silva

Por mais que tenha conquistado muitas coisas através de sua arte, ainda deseja ir mais longe e obter mais conhecimento com intuito de ajudar quem sempre esteve do seu lado.

Assim como diz o ditado Iorubá, “Exu matou um pássaro ontem com uma pedra que só jogou hoje”, o aspirante à moda sabe que sua batalha de hoje com o objetivo de vencer na vida, é uma luta pela qual seus antepassados travaram desde antes, e indiretamente também o moldaram até o presente, já que como disse, “a casa grande não está preparadao para ver nós crescendo”.

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