Análise do filmes “Estrelas Além do Tempo”

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7 min readAug 27, 2021

Por: Bianca de Cássia Freitas e Livia Marques / Orientadora: Profª Mirtes de Moraes

RESUMO

Com a temática envolvendo o racismo e a segregação, a obra “Estrelas além do tempo” do Diretor Theodore Melfi, busca debater e confrontar os arquétipos sobre mulheres negras, nos EUA nos anos 60. Exibindo a trajetória e a carreira de Dorothy, Katherine e Mary, o filme aborda como elas sofreram perante a sociedade extremamente preconceituosa e tóxica, onde tais mulheres eram sujeitas a situações desumanas, em um contexto sem empatia e sororidade. Todavia, apesar dos empecilhos, o trio se uniu para fazer diferença na NASA e nos EUA, mulheres negras e inteligentes, que mostraram que sua capacidade não cabia em um preconceito tolo. Desse modo, este artigo visa analisar a obra com um olhar mais aprofundado, refletindo acerca dos comportamentos da sociedade do século passado e da sociedade atual, que ainda permanece racista.

Palavras-chave: racismo, segregação, preconceito, mulheres, negras

No filme “Estrelas além do tempo”, baseado em fatos, a temática do racismo é abordada de maneira principal, isto é, a questão central da história é a ruptura da barreira contra o preconceito racial e, em paralelo, a questão de gênero. Dessa forma, o filme retrata a história de três mulheres negras: Katherine, Dorothy e Mary, trabalhando no departamento de matemática da NASA na década de 60, na qual os Estados Unidos travavam uma corrida espacial com a Rússia, na denominada Guerra Fria.

A década de 60 nos Estados Unidos foi fortemente marcado pelo movimento da minoria negra que visionava a abolir a segregação racial no país. Apesar dessa pressão gerada sob as autoridades do país, a transformação demorou a ocorrer, sendo possível observar que ainda hoje essa problemática está presente na sociedade e que vidas negras ainda são sacrificadas pela ignorância e racismo de uma parcela da população e até mesmo pela negligência de alguns governantes. Dentre os movimentos, os mais expressivos foram: a Conferência da Liberdade Cristã do Sul (liderada pelo pastor Martin Luther King, conhecido mundialmente por sua luta), Black Power (nome derivado do livro de Richard Wright) e o Partido dos Panteras Negras (organização de resistência policial da Califórnia).

Figura 1- Martin Luther King em um dos seus discursos a favor dos direitos civis nos Estados Unidos da América — Movimento Black Power. Disponível em: <https://www.gestaoeducacional.com.br/martin-luther-king-historia/>. Acesso em: 14.05.2021
Figura 2- Pantera Negras em 1968. Crédito: Pirkle Jones. Fonte: National Museum of African American History and culture. Disponível em: <https://www.google.com/search?q=martin+luther+king+jr+movimento+black+power&sxsrf=ALeKk03dChYHP2DbhFFpdedvyChm0XeC7g:1623856550783&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=2ahUKEwjK_v-GuZzxAhVArJUCHeEcAyoQ_AUoAXoECAEQAw&biw=1366&bih=657#imgrc=T5setWNsRWR2JM>. Acesso em: 14.05.2021
Figura 3- Movimento Black Power: as origens histórias da luta civil contra o racismo. Disponível em:<https://www.google.com/search?q=panteras+negras&tbm=isch&ved=2ahUKEwi82r2IuZzxAhVvs5UCHSNYBMsQ2-cCegQIABAA&oq=panteras+negras&gs_lcp=CgNpbWcQAzIFCAAQsQMyAggAMgII>. Acesso em: 14.02.2021

A trama retrata situações em que Katherine, ao sentir vontade de ir ao banheiro teria que correr uma longa distância para utilizar o banheiro exclusivo para pessoas de “cor”, é obrigada a tomar café de uma cafeteira diferente da dos colegas de trabalho por conta da sua cor de pele e é impedida de participar de reuniões e assinar os relatórios por ser uma mulher negra. Assim, vale destacar a primeira situação, já que seu chefe, ao perceber que Kathy se ausentava em alguns períodos do dia, perguntou a ela qual o motivo da ausência e a resposta que recebe o indigna tanto que ele leva toda a equipe até a porta do banheiro e quebra a placa que indica que aquele banheiro era só para pessoas brancas.

Figura 4- Chefe de Katherine quebrando a placa que indicava o banheiro para negros. Estrelas Além do Tempo.Direção: Theodore Melfi.Produtor: Peter Chernin. Produtora: Jenno Topping. Produção: Twentieth Century Fox. EUA, 2016.

Além disso, a personagem Dorothy assume perfeitamente uma mulher ativista, de modo que supervisiona uma equipe denominada “computadores negros” e aguarda melhores oportunidades para si e para sua equipe. Em cena marcante que expõe sua habilidade, ela descobre que um computador da IBM será implementado realizando inúmeros cálculos em frações de segundo, ameaçando seus empregos. Dessa forma, ela, junto a seu grupo, se atualizou em estudos de programação e, então, acabam por gerar um novo setor para elas.

Outra personagem é Mary que possui personalidade forte e sonho de se formar na faculdade de engenharia. Apesar de seu marido e colegas de trabalho a insultarem com comentários preconceituosos, ela mantém qualidade em tudo que faz e acaba por mudar a opinião de todos. Nesse momento do filme, ela se inscreve para um treinamento de engenheiros e tem sua candidatura reprovada e diz: “Toda vez que tivermos a chance de avançar, eles mudam a chegada”. Assim, mostrando que para mulheres negras não havia igualdade de direitos.

Figura 5- Mary no tribunal.Estrelas Além do Tempo.Direção: Theodore Melfi.Produtor: Peter Chernin. Produtora: Jenno Topping. Produção: Twentieth Century Fox. EUA, 2016.

Como parte da segregação racial ocorrida nos EUA os negros não podiam trabalhar em condições formais e humanitariamente aceitáveis, pois na época exalava-se um pensamento do darwinismo social, ou seja, em que o branco é um ser superior e não deveria conviver no mesmo ambiente que o negro. O filme traz uma representação do que havia nos anos 60, na NASA havia um setor afastado dos demais, em um prédio simples e desleixado, onde localizava-se o “grupo de computadores do oeste”. Tal setor era ocupado exclusivamente por mulheres negras, que trabalhavam ali de forma temporária, seu serviço era basicamente conferir alguns cálculos (trabalho que hoje é exercido por computadores). Todavia, apesar de exercerem um trabalho essencial para época, as negras ali presentes eram menosprezadas e tratadas com repulsa.

Outro ponto que destaca o racismo e a segregação abordados no filme, gira em torno da personagem Mary Jackson. Ela, como as outras integrantes do grupo, trabalha no setor de computadores, fazendo cálculos, porém, por ser extremamente inteligente, destaca-se e é chamada para participar provisoriamente do setor de engenheiros. Dessa forma, os outros funcionários (brancos) notam que Mary realmente possui um raciocínio divino, porém os homens ali presentes sentem seu ego ferido por uma mulher negra ser melhor que eles. Logo, exigem que Mary faça faculdade de engenharia, no intuito de sabotá-la, pois negros não são bem-vindos na universidade da Virginia.

Mary, momentaneamente fica aborrecida pois sabe da segregação e preconceito existente na universidade. Ademais, não recebe apoio de seu marido, que perante a situação encontra-se pessimista e diz que não há justiça para os negros e que a liberdade não é concedida aos oprimidos. Entretanto, Mary não se oprime, toma decisão de ir a júri solicitar a permissão para estudar o ensino superior e ser a primeira mulher negra da turma de engenharia. Felizmente, consegue e ultrapassa o obstáculo da sabotagem, feito pelos engenheiros da NASA.

No início do filme também é retratado a ausência de sororidade de forma sútil, porém nítida. As mulheres brancas que trabalhavam na NASA também não ocupavam cargos altos, geralmente encontravam-se num nível hierárquico inferior, porém superior às mulheres negras. Dessa forma, ao invés de demonstrar sensibilidade e se aliar, optam por querer se mostrar superior na tentativa de se emancipar e tornam-se mais próximas aos homens brancos em cargos altos. Em dados momentos em que a personagem Vivian Mitchell se dirige ao setor de computadores, ela demonstra seu desprezo dizendo que não esperava ter que ir até ali para conseguir uma funcionária para o grupo de tarefa espacial (referindo-se a Kathy).

Contraposto a Vivian, Dorothy supervisora e programadora tem um senso coletivo admirável. No decorrer da trama Dorothy apresenta papel essencial, sempre motivando as outras mulheres e ajuda a colocá-las em melhores posições dentro da NASA, sendo que, quando surge a oportunidade dela se tornar oficialmente supervisora, diz que só assumirá o cargo caso possa levar as outras meninas do setor de computadores. Tal ato, demonstra que por mais que ela quisesse um cargo melhor, não estava disposta a abandonar suas parceiras, ela queria uma mudança coletiva, onde se uma avance todas avançam juntas!

Figura 6- Dorothy e sua equipe no momento que receberam a promoção.Estrelas Além do Tempo.Direção: Theodore Melfi.Produtor: Peter Chernin. Produtora: Jenno Topping. Produção: Twentieth Century Fox. EUA, 2016.

Diante das mudanças ocorridas na vida de Dorothy, Mary e Kathy, uma outra questão é levantada: a Maternidade. Assim, com tal conquista de cargos melhores (todavia, ainda sim com o racismo tóxico no ambiente de trabalho), os homens e maridos das personagens começam a questionar o papel de “mãe” que elas exercem, numa tentativa de associar que elas não estavam sendo boas mães por trabalharem demais. Esse pensamento machista logo se refuta, pois, as mulheres conseguem conciliar a família e trabalho.

Embora a obra “Estrelas que brilham” seja um filme que retrata os anos 60, existem temas que ainda são existentes na social atual. Apesar da segregação não ser descaradamente nítida hoje, ainda há pontos sensíveis a serem expostos, por exemplo a presença de pouco negros nas universidades, cerca de 18,3% com idade entre 18 e 24 anos — dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2018. A pouquíssima quantidade de mulheres negras em cargos altos, 8% apenas no Brasil, segundo dados da consultoria Indique Uma Preta. Ou seja, é necessário colocar a inclusão na prática e agregar ao movimento para um ambiente igualitário, como diria Angela Davis “Numa sociedade racista, não basta não ser racista. É necessário ser antirracista.”

Figura 7- Personagens e suas respectivas inpirações. Estrelas Além do tempo. EUA.2016. Disponível em: <https://www.google.com/search?q=personagens+estrelas+al%C3%A9m+do+tempo&sxsrf=ALeKk01ES1V91CcbUyUglAvB14wlSWVvCQ:1623858843899&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=2ah>. Acesso em: 14.05.2021

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SANTOS, Greicielle. Pesquisa analisa o filme “Estrelas além do Tempo” e

aponta silenciamento da voz feminina na ciência. Portal UFLA. Disponível em:

&lt;https://ufla.br/noticias/pesquisa/13084-pesquisa-da-ufla-analisa-o-filme-

estrelas-alem-do-tempo-e-aponta-como-a-voz-feminina-foi-silenciada-na-

ciencia-durante-e-apos-a-corrida-

espacial#:~:text=Uma%20pesquisa%20realizada%20na%20Universidade,aos

%20c%C3%A1lculos%20matem%C3%A1ticos%20na%20Nasa.&gt;

ANGELES. “Estrelas Além do Tempo”: história real é ainda mais otimista.

VEJA. Disponível em: &lt;https://veja.abril.com.br/blog/e-tudo-historia/estrelas-

alem-do-tempo-historia-real-e-ainda-mais-otimista/&gt;. Acesso em: 16 Jun. 2021

ANDRIOLO, Felipe. O que podemos aprender com o filme “Estrelas além do

tempo.” Administradores.com. Disponível em:

&lt;https://administradores.com.br/artigos/o-que-podemos-aprender-com-o-filme-

estrelas-alem-do-tempo&gt;.

ESTRELAS ALÉM DO TEMPO. Direção: Theodore Melfi. Produção: Donna

Gigliotti, Peter Chernin, Jenno Topping, Pharrell Williams e Theodore Melfi. Los Angeles: 20th Century Fox, 2016 DVD. (127 min.). Produzido por Fox 2000 Pictures.

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Esse projeto integrador tem como proposta repensar os estereótipos que aprisionam a diversidade da sociedade