Começando bem: tradução voluntária

Sheila Gomes
Comunicaminhos
Published in
4 min readMar 13, 2017

Sabe aquela sensação de ter que atirar para todo lado quando começamos na carreira e não sabemos exatamente o que fazer? E qual é a maior dificuldade de quem está começando na tradução ou na interpretação? Bom, tomando por base as perguntas frequentes nos grupos profissionais, é a falta de experiência. Assim como em outras profissões, para que alguém contrate um tradutor ou intérprete iniciante, é preciso provar de alguma forma que você “conhece o riscado” e sabe o que é esperado de um profissional. E para chegar lá, é preciso conseguir experiência real e prática suficiente para ter e inspirar a confiança necessária de que fará um bom trabalho quando entrar no mercado “de verdade”.

Ainda bem que, com o crescimento da internet, surgiram muitas iniciativas baseadas no voluntariado que podem suprir essa necessidade de experiência, e o profissional iniciante ainda pode ajudar alguém ou alguma causa em que acredite. Há muitas oportunidades assim, em áreas as mais diversas, inclusive voltadas a especializações nas quais a pessoa possa querer investir mais adiante.

E para começar com o pé direito, é importante ter em mente que:

  1. O trabalho, mesmo sendo voluntário, deverá ser prestado de forma profissional, com a mesma atitude, dedicação, cuidado e seriedade que se adotaria caso fosse um trabalho pago;
  2. A ideia principal é colaborar no projeto, seja qual for, não apenas aproveitar a oportunidade para proveito próprio, e sim unir o melhor de dois mundos, criando prática e colaborando ao mesmo tempo;
  3. É preciso entender o que é esperado do trabalho, inclusive conhecendo melhor a instituição, grupo ou pessoa que o promove. Este é um passo que pode evitar problemas mais adiante e também uma prática a ser estendida à vida profissional depois;
  4. Pode ser uma boa oportunidade de promover a profissão, educando o cliente (não deixa de ser cliente porque o trabalho é voluntário) e deixando a melhor impressão possível. Essa é uma demonstração de compromisso profissional que marcará seu nome de forma positiva;
  5. Intérpretes e tradutores ainda são pouco conhecidos do público leigo: lembre-se de que você provavelmente será a única pessoa do meio que o público com o qual você vai trabalhar conhecerá. Isso significa que você representa a profissão para este público. Pense no significado disso em termos de apresentação profissional e de como você divulga nosso trabalho. Essa é uma das melhores formas de inspirarmos respeito pela(s) nossa(s) profissão(ões): mostrar às pessoas o que fazemos de verdade.

E agora vou aproveitar para falar um pouco das iniciativas de que participo e participei. A principal é o OmegaT, uma CAT tool de código aberto, livre (open source and free software) e gratuita para uso por qualquer pessoa. O OmegaT, além de ter sido criado por tradutores programadores, também é traduzido voluntariamente por várias pessoas que acreditam no projeto. Além da interface do programa em si, pode-se traduzir (e atualizar) o manual e o site também. É uma ótima oportunidade para quem pretende ter experiência em localização, por exemplo.

Outro projeto de que participo ativamente é o do WordPress, uma das plataformas de sites mais usadas no mundo (mais de 42% dos sites que existem em 2021 são baseados em WordPress). Há grupos de voluntários no Brasil todo, que organizam encontros presenciais periódicos, outra ótima forma de se promover profissionalmente, fazer contatos e entender como funciona “o outro lado”: desenvolvedores e suas formas de trabalhar. Também colaboro virtualmente, traduzindo a própria plataforma do WordPress, plugins, legendando vídeos, até criando materiais de orientação.

Já traduzi artigos no Global Voices, um site voltado à democratização de notícias, com matérias sobre e para países em desenvolvimento, traduzidas em vários idiomas e com crédito aos tradutores. Na época em que colaborei havia um grupo de controle de qualidade para revisar as traduções, que era uma boa oportunidade de receber críticas construtivas e melhorar o trabalho. Outro projeto em que já colaborei na tradução foram cursos do Coursera, que hoje inclusive usa a mesma plataforma de tradução que uma agência para a qual presto trabalhos pagos. E finalmente, também participei da equipe de tradução da documentação da linguagem Python, contribuindo com a localização e a criação de um site de orientação para quem mais quiser cotribuir e não sabe por onde começar.

Fazer parte de grupos de tradutores, no Facebook ou presencialmente, ajuda a conhecer bons projetos, pois você pode encontrar pessoas que tenham trabalhado neles e que podem contar como foi a experiência. Além de que fazer networking é uma das formas mais eficientes de entrar e se manter na profissão. Mostrar disposição para trabalhar ajuda a criar uma boa reputação. Participe do que puder e pesquise também sobre a experiência de outros tradutores que fazem ou fizeram trabalho voluntário, como a María Tatay Sanzsegundo. Há inclusive sites agregadores de oportunidades de voluntariado, como o Atados, que podem ter projetos de tradução também. Boa sorte e boa jornada!

Godspeed!

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Sheila Gomes
Comunicaminhos

Tradutora que constrói as pontes possíveis entre comunidades. Também localiza sites, software e jogos.