Lady Di do Ipiranga

Vivian Ragazzi
Comunidade da Escrita Afetuosa
4 min readJun 28, 2024

Conheceu Márcio ainda muito menina. Era amigo de seu irmão Frederico, três anos mais velho que ela. Na primeira vez que o viu, ele perguntou: “É Diana por causa da Lady Di? Que chique! Você tem nome de princesa!”.

Via Márcio na escola, tão bonito, os cabelos castanhos compridos presos num rabo de cavalo, os cachos desmanchando-se no meio das costas largas. Quando se encontravam, Diana baixava os olhos, tímida com o cumprimento do menino que já estava no terceiro colegial.

Em casa, gostava de escrever poesia. Márcio era sua inspiração para as estrofes melosas nas últimas folhas do caderno. Quando ouvia música, fechava os olhos e se imaginava namorando o estudante, sendo sua própria princesa Diana. Frequentando as festas com ele, acompanhando-o para prestar Vestibular. Já se via mais velha também, os dois fazendo preparativos para o casamento. A lua-de-mel seria na Bahia, porque ela sabia que Marcinho gostava de praia. Depois viriam os filhos, dois ou três. Leonardo, Pedro e Mariana eram os nomes que sugeriria, mas ouviria a opinião dele também. Velhinhos, um iria com o outro no médico para fazer os check-ups. E combinariam de morrer bem idosos, com uma diferença de horas, para que nenhum ficasse triste. Encontrariam-se no céu, se reconheceriam e viveriam felizes no paraíso. Voltariam e repetiriam isso em todas as outras vidas que tivessem.

Mas ainda estavam nesta primeira vida, e conforme a amizade com Frederico se estreitava, Márcio passou a frequentar a casa da família. Aparecia lá para fazer trabalhos e depois jogava bola com o amigo. Às vezes pedia para tomar banho e saía cheirando a Quasar, com os cabelos molhados, do banheiro. Totalmente irresistível. Diana não sabia mais como disfarçar. Contar para o irmão estava fora de cogitação. Falar para ele também não era uma possibilidade — e se a rejeitasse? Ela jamais superaria.

Diana passava seus dias matutando o que fazer. Com isso, o tempo foi passando. As visitas continuavam, a adolescente tentando se concentrar nas lições, mas era só ouvir a voz de Marcinho na sala de casa que o coração disparava e tudo ficava para depois.

O ano estava no fim. Márcio e Frederico teriam um baile de formatura, coisa simples, no pátio da escola. Para Diana, aquele poderia ser o momento perfeito para tentar alguma aproximação. Quem sabe o rapaz também já tivesse percebido que ali havia algo?

Arrumou-se com seu melhor vestido, passou batom e lápis no olho, o que a fazia se sentir mais velha. Sentou-se na mesa com os pais. Logo Marcinho, usando terno, apareceu para dar olá. Pareceu surpreso ao cumprimentar Diana.

“‘Como você está bonita!”— exclamou, dando-lhe um beijo no rosto. Como sempre, aquele perfume que a causava arrepios.

Ruborizou. Nunca um menino tinha falado algo parecido. ‘É o destino. Tem que ser ele. Com certeza nossa história começa aqui”. Enquanto se afastava dela, percebeu que tinha alguém atrás dele. Uma moça que nunca havia visto na escola, loira, de olhos azuis, mais ou menos da idade do rapaz. Os dois estavam de mãos dadas.

“E esta é a Aline! Queria apresentá-la para vocês. O Frederico já a conhece, ela é minha namorada. A Aline estuda no Externato, está no terceiro colegial também.”

A mãe e o pai de Diana estenderam-lhe a mão, animados.

“Que bom conhecer você! O Marcinho é um menino de ouro, viu? Vão ser muito felizes, com certeza!”, exclamou dona Mercedes.

“Cuide bem desse garoto, hein? Muito prazer!”, apresentou-se seu João.

Aline sorriu, encantada com a simpatia dos pais do amigo do namorado. Estranhou um pouco o olhar da menina. Parecia surpresa com a situação toda e até triste. Mas devia ser impressão, porque a adolescente não devia ter nem 14 anos, com certeza ainda brincava com bonecas.

Diana precisava tomar um ar. Levantou-se dizendo que ia se servir de ponche. As lágrimas começaram a escorrer pelos olhos, borrando sua maquiagem. Sentou-se num banco próximo à pista de dança enquanto sorvia a bebida. O ambiente escureceu e os casais se apressaram. Os primeiros versos de I Have Nothing, de Whitney Houston, começaram a ecoar. Naquele ano de 1993, foi uma das músicas que a jovem mais ouvira pensando em tudo que poderia viver com Marcinho.

Agora, era Aline quem ele abraçava de rosto colado. De vez em quando, dava beijinhos na moça, carinhoso. Era ela que sentia seu perfume, não Diana. Era ela que iria para a Bahia na lua-de-mel, era ela quem envelheceria com ele. Não seria sua princesa.

Cansada de chorar pelo que poderia ter sido e não foi, pôs-se em pé. Foi ao banheiro, lavou o rosto, voltou para a mesa dos pais e decidiu que não seria princesa de ninguém, só de si.

--

--

Vivian Ragazzi
Comunidade da Escrita Afetuosa

mãe de gêmeos, jornalista e sagitariana (sim, acredito em signos)