Nossas raízes

Gabi Canhete
Comunidade da Escrita Afetuosa
3 min readApr 17, 2023
Foto de Emma Gossett na Unsplash

Araraquara, numa tarde de Abril de 2023

Oi Alile. Miga, sua loka. Risos.

Você deve estar pensando, “como assim, a Gabi está me escrevendo do nada”, depois de tanto tempo? Pois é menina. É que essa semana, pensei tanto em você. Durante minha última sessão de terapia, conversa vai, conversa vem, voltei pra minha casa da infância e lá estávamos nós: em cima da nossa árvore dos segredos. Lembra?

Eu ficava esperando ansiosamente as férias de Julho, só para que você viesse me visitar. Era só uma vez por ano, mas o suficiente para alimentar nossas raízes. De conexão. De troca. Confidências. Subíamos nesta árvore e esquecíamos do tempo ali. A gente se sentia grande e forte, como os galhos grossos que nos acomodavam. Quantas horas passávamos naquele tronco. Os pensamentos nas nuvens. Falando da escola, das descobertas de pré adolescente, da expectativa do primeiro beijo. A única pressa era o chamado da minha mãe: “meninas, venham comer”.

Na copa da árvore, quantos sonhos, imaginando como seria a vida quando crescêssemos. E olha só para nós hoje. Crescemos. Como aqueles galhos que cada ano estavam maiores, o que significava que podíamos subir mais alto. Quanto mais longe do chão, maior a imaginação. Crescemos.

E não só nós. Joaquim já está com 8 anos. E também gosta de subir em árvores miga. E você não sabe… Dias atrás lá estava ele, brincando com o João, no pé de Pequi que temos aqui em casa — e que inclusive você precisa conhecer. Meu pai fez um balanço de madeira pra gente colocar lá. Até ai beleza, Joaquim sentou no colo do João e os dois balançavam juntos. Quando o balanço subia, Joaquim se pendurava no galho da árvore e depois voltava para o colo do João. E assim foi, 1,2,3 vezes, até que na hora de voltar para o colo do João, Joca caiu no chão.

Eu só escutei o barulho. E já corri lá para fora para ver o que tinha acontecido. Adivinha? Meu menino quebrou a clavícula. Na hora, ele começou a gritar de dor. Deitei ele no sofá e achei que era só a dor do tombo mesmo. Só que ele não conseguia se mexer. E vi que era coisa séria. Se fiquei brava com o João? Você me conhece né prima e eu também te conheço bem, pois tenho certeza que se estivesse aqui, na minha frente, ia me perguntar isso. Risos. Fiquei sim. Na hora. Eita pai desnaturado! Isso lá é brincadeira de se fazer com o filho?

Fomos para o hospital e ainda bem que não foi preciso fazer cirurgia. Essas crianças tem o super poder de se recuperar rapidinho.

Imagina se fosse a gente que caísse da árvore, hoje? Ia demorar uns bons meses para tudo voltar ao “normal”. =) Normal entre aspas, pois nunca fomos assim “tão sãns”, né? Ai, ai, até parece. Sabe que se pudesse voltar ao tempo, teria subido em mais árvores e escalado noutras superfícies.

É. Eu sei que sou nova ainda. Mas depois que as crianças nasceram, sinto que fiquei mais medrosa, sabia? Mas faz parte do crescimento. Do meu. Do deles. Também sei.

E sabe o que é que você não sabe? Escrever essa carta me ajudou a sintetizar a conversa da terapia. Já que não dá para voltar na casa da infância e subir de novo na árvore dos segredos, acho que vou subir no pé de Pequi aqui de casa, para romper essas barreiras internas e ver a vida com novas perspectivas. Estou precisando disso. De frio na barriga. Aventuras. Daquela empolgação toda que a gente sentia e compartilhava. Era tão bom…

Por hora, me despeço por aqui. E embora a gente não se veja mais como gostaríamos, tudo bem. Como dizia a vovó, o importante são nossas raízes. E você para mim, é como um adubo na minha árvore da vida.

Amo você. Da sua miga-loka-e-prima-querida, Gabi.

Auroramod2ex2

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Gabi Canhete
Comunidade da Escrita Afetuosa

Escrevo para por a casa em ordem. Seja bem vinda(o) ao Que Habita Em Mim.