O Despertar
Três da manhã.
Começa a cantoria.
O sabiá-laranjeira canta alegremente.
Ainda é noite.
O sol não nasceu.
O sabiá, sentado no topo da árvore como um locutor animado, anuncia o dia que irá amanhecer.
— Fica quieto, sabiá maldito, não está na minha hora!
Maria se vira na cama, cobre os ouvidos com o cobertor.
O sabiá é insistente.
Continua sua cantoria, afinal, já são três da manhã.
Maria levanta,
de mau humor,
arrastando os pés,
vai ao banheiro.
Quatro horas.
O velho despertador quadrado de plástico preto toca. O som metálico é contínuo e estridente. João se vira na cama, vira novamente. O despertador insiste, e insiste mais um pouco.
Está na hora.
Ele aperta o botão.
Silêncio.
Agora escuta o tic, tic, tic do ponteiro de segundos martelando as palavras em sua mente:
Levante, levante.
Segundos, minutos se passam até que ele se vira, senta na beira da cama, vencido pelo relógio.
Levanta, se veste e sai para pegar o ônibus.
Cinco horas.
O celular toca uma melodia irritante.
Clara suspira, gostaria de ficar mais um pouquinho na cama.
Tá tão gostoso…
A melodia volta, e a luz do celular ilumina o quarto.
Ela olha o horário, desliga o despertador do celular e começa a ver as mensagens que chegaram à noite.
Levanta,
se espreguiça,
boceja e se prepara para mais um dia de trabalho.
Enquanto isso, Clara escuta o barulho do celular da vizinha no andar de cima. Este faz um som arranhado.
— Acorda, vizinha — ela pensa.
Logo o som cessa. A vizinha deve ter acordado e foi tomar banho, pois Clara escuta a água correndo.
Ao sair de casa, meia hora depois, encontra a vizinha saindo também.
— Bom dia, vizinha.
— Bom dia, Clara.
Seis horas.
O despertador branco, estilo vintage, toca uma música suave.
Fernanda rola, se espreguiça, levanta e vai acordar as crianças.
Beijinhos nas bochechas macias.
Abre as janelas e deixa o sol entrar.
— Bom dia, meus amores.
Na casa ao lado, o rádio-relógio preto com números digitais desperta Jerson e Vanessa.
— Vambora, vambora, tá na hora — diz o locutor da rádio Bandeirantes.
E despeja as notícias do dia como uma enxurrada em dia de tempestade.
— Ah — diz Vanessa — , por que você precisa escutar isso logo cedo?
Jerson responde:
— São as notícias, amor, precisamos saber o que acontece na cidade e no mundo.
Ela levanta, de cara amarrada, e vai se arrumar.
Sete horas.
Marina e Mário se espreguiçam na cama enorme, escutam os pássaros: bem-te-vis, papagaios e um tucano ao longe. Um sorri para o outro, apaixonados. Olham para o relógio.
Estamos atrasados.
Dão risada, se beijam e levantam, felizes por estarem juntos.
Dez e meia.
Suzana volta da ginástica e bate na porta de Vinicius.
— Levante, seu preguiçoso.
Não foi para a escola?
Perdeu a condução?
Ficou no videogame a noite toda e agora não consegue levantar?
Ela bate com força na porta de madeira.
— Levante já, neste instante!
A porta se abre, e o adolescente descabelado, de olhos ainda meio fechados, olha para ela sem entender o que está acontecendo.
O sabiá-laranjeira, sentado no topo da árvore, observa a cidade acordar.
Amanhã ele será, novamente, o primeiro a despertar.
Alice Murray Reimer
Setex 1