Queria um lar

Pollyana Teles
Comunidade da Escrita Afetuosa
2 min readFeb 28, 2024

Tinha sete anos. Em uma casa de quatro cômodos. No alto do telhado a casa de João-de-barro. Quando estava sozinha na varanda chamava por ele. Estava intrigada como ele e a esposa não paravam no ninho. Estamos construindo o lar de nossos filhos — respondeu a ela. Minha casa é muito sem graça, saio da sala, caio na cozinha, se entro no quarto todo mundo noticia. A casa das minhas amigas é enorme com escada, espelhos grandes. João a ouviu, atentamente, se tem um lugar sagrado para nós é o nosso canto. Bem simples. O necessário para nos proteger. Uma porta. Uma passagem. Uma câmara interna — assim que chamamos o quarto. Aquele que quiser nos fazer mal, não consegue entrar. Quando o vento sopra forte, aprecio como brisa, não entra o redemoinho-de-poeira. Não há nada que admire em sua casa? Ela ficou uns minutos em silêncio. Pensou que seria bom ter uma câmara interna como a de João, ao menos não veria a briga de seus pais. Meu pai tranca mainha no quarto deles. Ouço os gritos dela, não há lugar na casa que consiga me esconder. Você me levaria para sua casa João? Ele não esperava por esse pedido. Não posso te levar, vão dizer o que falam a bico serrado sobre mim que construí essa casa com engenhosidade para confinar minha parceira. Lenda. Lenda urbana. Somos livres. Pássaros. Fazemos dueto durante nossas tarefas. Não há amor dentro de uma prisão. Há dor. Um dia ela acordou. A porta do quarto de mainha estava aberta. Dormia. E nunca mais abriu os olhos.

--

--