Recortes de 2023

Clô Azevedo
Comunidade da Escrita Afetuosa

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06/02/23

Não quero ficar carregando esse sentimento no meu peito. Não foi nada tanto assim que não possa ser perdoado e seguir em frente, mas podíamos falar! Só prá tirar esse mau entendido do meu coração. Não quero um fantasma dentro de mim. Mais um!

Qual sentimento é esse? De espera? De rancor? Mágoa? Parece nunca cessar por aqui. Eu quero acabar com ele. Quero elimina-lo de dentro de mim. E qual a melhor forma? Aceitando as coisas como elas são, sendo flexível ou deixando pra lá. Encarando. Não quero ficar carregando esse sentimento pela vida inteira. Pelo meu pai principalmente. Dá muito trabalho ficar carregando isso. Quero eliminar essa situação da minha vida.

14/03/23

Agora são 23:50. Faltam 10 minutos para o meu niver. Assisti um filme chamado A Baleia e chorei muito. Tudo a ver com minha história com meu pai. Com a maioria dos pais talvez. A história se repete. Eu vi no ator a mesma aflição que meu pai sentia me pedindo desculpas toda hora. Eu vi o desespero dele. A vida dividida entre o amor que ele queria ter vivido e a filha abandonada. E a força descomunal que ele fez para dizer para ela que ela importava. Que ela era incrível e importante na vida dele. Liberei minhas energias. Quantas coisas para falar, quantas coisas estou sentindo. Chorei muito agora. A cada dia entendo mais meu pai. O desespero dele para que eu soubesse de alguma maneira tudo o que ele não conseguiu me dizer durante anos. Que estrago essas coisas fazem na gente. E a gente nem sabe.

19/03/23

A sensação é estranha. Não sei porque faço essas coisas. Eu deveria ter parado naquele dia e não ter tentado mais essa ideia estúpida de ser amiga de alguém que não tem a mínima capacidade de discernir nenhum tipo de relacionamento. Vamos fazer um esforço de parar por aqui. Tenho saudades daquele passado que nunca existiu. Na real foi tudo fake e nunca mais vai existir. Ele é uma pessoa cheia de problemas. E aquele dia foi um presente que o universo me deu. Eu não posso mais viver pensando nisso. Eu não posso mais. Porque não é isso que eu quero. Eu quero que fique tudo bem, mas já entendi que não vai ficar. Porque eu me coloco neste lugar de novo? De querer ficar perto? De fingir que tá tudo bem quando não está? Então parar naquele dia. Porque não dá, nunca vai dar para ser amigo. Levantar amanhã não será fácil.

31/03/23

Eu falei para a Érika que amo você. Eu amo você do jeito que você é. Acho que é o amor mais puro que já senti. Ele é doce, compreensível, adorável, sincero, sem preconceitos ou expectativas. E você nunca vai saber. Você nunca vai deixar eu te dar. Você nunca vai entender o que é isso. Eu não vou poder ficar. Vou ter que ir mais uma vez porque não quero me machucar. Achei que ia suportar. Mas vejo que não. Sinto solidão. Eu nem preciso mais tanto de você ou da sua presença. Eu só te amo. E eu queria que você soubesse. Eu passei esse tempo todo querendo que você me quisesse.

04/04/23

Eu quero tirar essa dor de mim e não sei como. Já era a dor da minha mãe. Eu nasci nela. E só soube viver assim. Eu só conheci essa dor. Não conheci outra coisa neste lugar. Estes dias tenho pensado nisso. Como uma pessoa que nasce no mato e nunca viu o mar. Existe vida lá fora? Como deve ser? Hoje pensei que esta é minha missão de vida. Meu maior desafio. O maior de todos que já enfrentei até hoje. Um ruído que tem sido imenso dentro de mim. Sair dessa dor. Como? Eu não sei. Essa dor me guia o tempo todo. Tristeza eterna que carrego comigo. E o mais triste é que não sei viver sem ela. Como vou viver sem ela? Como se não houvesse outra saída para mim. Vejo que tudo na minha vida girou em torno disso. Minha infância. Minha juventude. Meu trabalho. Meus relacionamentos. Eu vivi em função de atende-la. De nutri-la, de fugir, de me afundar nela, de tentar compreende-la. E de odiar a mim mesma por não saber “ser” sem ela. Meus mecanismos foram criados para ela. Ela foi minha companheira por todos esses anos. Norteou minha vida. Calculou as rotas por mim. Me dominou esse tempo todo. Mas hoje estamos nos encarando. Ela sente que não tô mais aguentando, e que tá na hora dela ir. E eu choro porque é mais uma partida na minha vida. Mas essa precisa ser, precisa acontecer. Será a maior de todas. Como vou fazer isso? Como vou deixa-la? Eu quero ir, mas quero ir em paz. Eu preciso sair desse lugar que eu passei a vida inteira. Ficou claro. Me libertar. Não quero mais ser dominada por isso. Ao encara-la de frente me surpreendo que o ruído tenha cessado. Foi uma sensação engraçada. Aquela carência se transformou. Aquela que gritava dentro de mim. Dormi profundamente e hoje acordei descansada. Sentindo que um peso saiu de mim. Aquela criança que chorava esperneando por atenção silenciou. Como se tivesse aceitado pela primeira vez que nunca vai acontecer o que tanto ela queria. Já foi. Não será nessa vida. O carinho e o afeto que nunca veio e nem nunca virá por ele. Porque ele já morreu. E minha criança silenciou.

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Clô Azevedo
Comunidade da Escrita Afetuosa

Ajudo pessoas a contarem suas histórias através de seus ambientes.