Medo

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Comunidade da Escrita Afetuosa
2 min readMar 20, 2023

Sempre tive boa memória. Não posso negar que isso me ajuda bastante no dia a dia, quando estou trabalhando, estudando e até nas conversas com pessoas próximas, já que acabo me lembrando dos detalhes de situações boas e não tão boas.

Mas de um tempo para cá, tenho percebido que as memórias de experiências ruins vêm se sobressaindo. Ando vivendo um período mais “sombrio”. Esses momentos não são novos, já que me lembro de ter passado por isso antes algumas vezes. Mas é como se agora, talvez por eu estar mais velha, eu os contemple mais, tentado entendê-los. Talvez seja também reflexo da minha busca por autoconhecimento, seja por conta de terapia, astrologia, filosofia e tantas opções disponíveis atualmente que tem me levado a caminhos inexplorados por mim antes.

Uma dessas memórias que insistem em retornar aconteceu quando eu era criança, por volta dos 7 anos. Um dia normal na escola. Deu o horário de sair, tocou o sinal e fomos para a porta da saída, como de costume. No portão, aquela aglomeração cheia de crianças, adultos, peruas escolares, ônibus e os carros passando na rua.

Alguns minutos se passaram, e a concentração de pessoas foi diminuindo. Já era possível ver as peruas saindo e levando as crianças, os pais encontrando com os filhos e indo embora. E eu procurando, aquela que todos os dias sem falhar costumava estar lá. “Mãe, cadê você?” era a única coisa que passava na minha cabeça. Eu indo de um lado pro outro, com o coração começando a apertar, já sem a multidão para me dar esperança de apenas não a estar vendo.

Pronto, fechou o portão, só restava eu. Nesse momento a inspetora de alunos me levou para a secretaria. “Valéria, fica aqui sentada, enquanto sua mãe não chega”. E eu que era uma criança que costumava ser tão controlada, naquele momento chorei, me desesperei. “Mãe, cadê você?”

E eu hoje penso, porque já como adulta, ainda sinto o mesmo medo que senti aquele dia só de lembrar dessa história? Por que não me divirto ao me lembrar de algo que é relativamente tão comum acontecer com toda criança?

A única certeza que temos nessa vida é a de que todos iremos morrer. Minha mãe, para minha sorte ainda é viva. Mas pensar que um dia o “mãe, cadê você?” será definitivo, me remete ao mesmo medo de que senti aos 7 anos.

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