Velha demais

A sala. O computador. A batida do último ponto eletrônico. Festa de despedidas feita pelos colegas do trabalho. Conhecidos há poucos meses. Um sonho realizado. A aposentadoria tinha chegado. E agora? O que fazer com a liberdade recém-conquistada?

Sempre quis escolher a hora de acordar. Não ter chefe cobrando. Não trabalhar aos finais de semana. Passear com as cachorras sem hora para voltar. Fazer as unhas no meio da tarde. Ir ao clube em um dia de semana para tomar sol. Delícias conquistadas após trabalho duro. Seis meses de puro deleite.

E depois? Depois descobri que o trabalho tinha um papel decisivo na minha vida. Exagerado. Representava quem eu era na vida. Forte? Muito. Me descaracterizei. Me perdi. Me senti inútil. Velha para o mercado publicitário. Fui descartada como um lixo!

Todo o meu conhecimento acumulado. Todo o trabalho realizado. Pensado.

C

O

N

C

R

E

T

I

Z

A

D

O

Era nada! Nada.

Isso se refletiu em tantas outras coisas. Comecei a me achar feia. Flácida. Velha demais para botar as banhas para fora no biquini. Logo eu que nunca liguei para isso. Será?

A menopausa completou, com maestria, o meu entristecimento. A irritação aumentou e a libido diminuiu. A conta não fechava!

Busquei dentro de mim recursos que até então não imaginava que existia. Me voltei para o que mais gostava de fazer na infância: ler e escrever. Tive saudades do livrinho que fiz e que foi perdido no tempo.

Ainda estou em busca da Isabel que habita em mim. Forte, destemida, fraca, vulnerável, múltipla, sensível. Nessa busca me perco infinitamente.

Isabel Guedes — Comunidade da Escrita Afetuosa — Professora Ana Holanda: @anaholandaoficial — Uma Jornada pela Criatividade — abril — Exercício essencial1: Autojulgamento — (25/04/24)

Abrex1

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