Sobre a Blindagem Ética-Institucional

André Tunes
Do Pseudo-Intelectual
28 min readJun 11, 2022

A miséria, a fome, a pobreza, a desigualdade socioeconômica é uma metanarrativa para o Poder. O que ocorre quando existe um vácuo no Poder, se não um Déspota preencher tal vácuo, enquanto isso, a crueldade, a exploração, a ignorância, a dependência contínua para com as autoridades é a prática do Poder. Nos parece constantemente que não tem como escapar dessa condição, lutamos aqui, fazemos protestos ali, nos manifestamos contra a cada injúria, a cada injustiça, a cada forma ou jeito que o Poder nos afeta no dia a dia, e ainda sim parece insuficiente, ineficiente, um gasto de energia humana, cansativo e exaustivo, vamos para casa — caso não sejamos presos –, tomamos banho, comemos, refletimos sobre os acontecimentos que nos marcaram nesses dias de luta, dormimos, acordamos e damos continuidade a nossas vidas, trabalhamos, nos divertimos, fazemos várias coisas, cada uma de um jeito diferente, um jeito único, mas, o Poder continua a nos amedrontar, você olha um jornal ou escuta um noticiário, e lá está ele com sua magnitude e esplendor: ditando, caçoando, mandando, obrigando, comandando, submetendo, menosprezando, consumindo, manipulando, mentindo, omitindo, alienando, provocando, guerreando, ou seja, aquilo que controla toda as suas ações, modificando seu comportamento a cada nova prerrogativa ou manutenção, formando sua personalidade e seus pensamentos, você sente, mas não consegue expressar, a magnitude e porque não, a forma extraordinária que o Poder toma conta de todos os aspectos da sua vida é realmente grandiosa.

Mas é estranho falar do Poder, como se fosse uma entidade, um tipo de divindade além e sobre a humanidade, falar do Poder dessa forma, seria apenas admitir a sua inexistência, assim como todos os deuses ou Deus que já passaram, ou, continuam no imaginário popular, uma simples expressão de rebeldia de seres humanos que não conseguem transpassar o próprio Poder, não, se o Poder fosse uma divindade, ele não existiria, não sentiríamos, apenas tentaríamos a todo custo, interpretar nossa incapacidade em colocá-lo além de nossa compreensão ou razão. O Poder faz parte de um conjunto de ações e instituições organizadas por nós humanos, ele não está além do ser humano, apenas tenta se colocar acima de todos, mas não o Poder, aquele ou aqueles que o enxergam como solução para N problemas sociais, econômicos, culturais, raciais, sexuais, de gêneros, etc… O Poder faz parte da organização dos humanos, continuará sendo em alguns pontos, independente a forma que a sociedade se organiza, e, ainda sim, ele vai continuar ditando como você, e todos que você conhece e circundam-no age, pensa, reflete, expressa, ele está lá, sempre em estado latente, que emerge conforme os seres humanos refletem seus valores, criatividade, ações em novas formas de organizar ou se relacionar, grupos e grupos tentam, pensam e até mesmo admitem que eles e não os outros, são melhores e capazes de gerenciar, controlar e administrar essas características do Poder, sempre para o ideal de “o melhor para a sociedade”, aqui nasce um dos paradigmas do conceito “Autoridade”, pôs o melhor para a sociedade não é aquilo que os sujeitos [1] que compõe a sociedade em suas multifacetadas formas pensam que é o melhor, mas é aquilo que a Autoridade que ministra o Poder diz que é, é ele junto a Autoridade que cria a Iluminação do pensamento para esses sujeitos, você, um mero ser humano que compõe a sociedade como um(a) servo)(a), um(a) troglodita, um(a) trabalhador(a), uma simples pessoa é apenas recompensada por esses sujeitos acima da humanidade, eles, e, não você, é que são capazes de dizer o que é bom ou não, quando e como, de que forma e grau as coisas são necessárias e imprescindíveis para você. Como já dito no começo, você compõe o grosso da metanarrativa do Poder, você é menos do que um peão em um jogo de xadrez, um(a) desconhecido(a), anônimo(a), perante vários — e não um, grupos que tentam independente os meios, conquistar o esplendor desse conceito chamado “Poder”, e assim usufruir da Autoridade que advém dele, e com isso, ditar, comandar … tudo o que forma a humanidade, até em seus pensamentos você é prisioneiro, dada a sua impotência de superar a realidade da própria Autoridade que te comanda, que manda, que você obedece, por que não consegue fazer nada além disso, mas, com certeza você busca de algum modo, conquistar tal Poder, para não mas obedecer ou ser comandado, e sim o fazê-lo, ter as outras pessoas em seu julgo, é logicamente dedutível que se você o conquistou, você atingiu uma Iluminação grandiosa, agora é você que sabe o que todas as outras pessoas que não tem tal Poder, ou sequer podem conquistá-lo, desejam, querem, como querem e quando querem, essa é a responsabilidade que advém com a Autoridade, uma Autoridade genuinamente burra.

Essa pequena exposição, ou, vamos colocar dessa maneira, essas simples linhas, nos falam o quão contraproducente é lutar, já que nos parece impossível e até mesmo improvável que algum dia, em algum momento poderemos deixar essas bases de lado, e nós mesmos tomarmos as rédeas, responsabilidades e diretrizes do que afeta, desafeta, influencia ou não nossas vidas em sociedade. Você sabe, em protestos ou manifestações isso é evidente, essa improbabilidade se torna real, grupos denunciando suas ações, grupos entregando você para as autoridades caso fuja das rédeas e leis que tais grupos esboçaram, ou grupos criticando suas ações ou maneiras de protestar. E lá está, nenhum espaço para o vácuo de Poder, está preenchido por grupos que já se colocam sobre as pessoas que ali se encontram, é de acordo com tais princípios éticos que você deve agir, deve ser compatível, deve ser submisso, nesses momentos, de manifestação popular, onde aquela fagulha acedente, e mesmo que momentaneamente lhe dê uma esperança de liberdade, de criatividade, de força, o Poder retorna contra você, não lhe deixa ser livre, ser criativo, a realmente reivindicar aquilo que lhe pertence, não, que nos pertence, simplesmente é incompatível ser você e ter Poder, uma coisa é a destruição da outra, se você tem Poder, você não é mais você, seus pensamentos, suas ações, seus valores, sua personalidade é reduzida a manutenção, proteção e permanência do Poder, ser você é identificar suas fraquezas, suas vulnerabilidades, suas dores, suas alegrias, ser você é ser apenas um ser humano entre bilhões de outros seres humanos, passível de erro e culpa, arrependimentos e acertos, isso é ser você, já isso, é impossível tendo o Poder, você erra, não ele, então consequentemente suas ações erradas estarão certas, você sente dor, mas não ele, ou seja, você é invulnerável, a natureza do Poder é clara, a carcaça que o carrega deve ser Iluminada, deve estar acima da simples humanidade. O Império protege o Imperador, essa é a chave de entender o por que de Impérios, Estados, Repúblicas, Federações, Reinos serem a defesa irrestrita de seus Imperadores, Governadores, Presidentes, Reis, etc…, da mesma maneira, é a religião (ou, o sentimento religioso como a fé) que protege Deus ou deuses, e o que forma isso, se não aquele precioso vácuo de Poder, o esplendor dele não está ali? A Iluminação não está ali? A própria esperança ou responsabilidade, razão ou emoção de que se preencher esse vácuo, poderá fazer diferente, poderá mudar as coisas, salvar as pessoas, proteger os ideais?

Observe, nas escolas, universidades, nas assembleias comunitárias, em pontos onde uma coletividade é organizada para discutir, debater, formar ou administrar algo/alguma coisa, ali se encontra sujeitos com diversas capacidades, de várias características, eles irão de algum modo, depositar as soluções para tais pautas de acordo com seus próprios conjuntos de valores, vão se sentir ameaçados caso um outro conjunto de valores vá de contra, não teria como ser diferente, cada local, cada época, cada singularidade que compõe os sujeitos que formam a sociedade tem isso latente em seu próprio ser. Mas ali, nesses momentos existe o Poder? Claramente que não, o Poder do qual falamos, do qual nos afeta é uma instância acima disso, acima dessas discussões, desses encontros, como já expressado, ele é um conjunto de ações e instituições, então, naqueles encontros para discussões, debates, etc… é o assumir da responsabilidade, assumir as rédeas — mesmo que de forma curta, do que está acontecendo e como vai ou irá afetar-nos no dia a dia, você está em pé de Igualdade e Equidade com todos os outros sujeitos que estão ali, mesmo diante de suas diferenças, grau de instrução, experiência de vida, não há Poder, há Equidade.

Protestos em 2013/14, manifestações 2016 — contra a Copa do Mundo no Brasil, manifestações e protestos de menor quantidade em toda República Federativa Brasileira, uma das atuais manifestações é relativo a brutalidade e assassinato de um homem negro (João Alberto Silveira Freitas) no supermercado Carrefour de Porto Alegre no Rio Grande do Sul, esse caso ascendeu tal manifestação, houve quebra-quebra, ação direta por parte dos manifestantes — podendo ou não ser anarquistas –, e, nessa ação direta, ainda mas devido as eleições municipais, acusações como infiltrados para deslegitimar tais manifestações, táticas partidárias para entregar tais “infiltrados” para a polícia seria natural, não se pode manchar os candidatos — de esquerda, nessas épocas, o votar sempre será mais importante que o lutar, mesmo dizendo que as duas coisas não são excludentes, nesses momentos temos a evidência física e racional, que sim, são excludentes! E tudo isso para não apenas proteger as instituições do Estado, mas para garantir a subida ao Poder. E temos a blindagem institucional, não é apenas as forças coercitivas do Estado que garante a sua permanência, sua insistência, é aqueles que também desejam assumir o Poder, a Autoridade dessas instituições e forças coercitivas que ela mantém, uma teoria e doutrina como a libertária, que tenta a todo custo, deslegitimar tais instituições, luta não apenas contra elas, mas também contra uma parcela de partidários dessas instituições, e ainda sim, em uma ingenuidade ou mesmo arrogância, tentam defender esses partidários diante um “inimigo comum”, mas é óbvio que essa defesa está ligada a uma falsa concepção de que, tais partidários fazem parte de uma “não esquerda”, ou melhor, de uma esquerda liberal, e a esquerda que tais libertários visam uma aliança, um conluio ou uma conciliação é as extremistas, é aquelas que lutam contra esse “inimigo”, para tais libertários, essa esquerda existe fora das instituições, fora da Autoridade, então, como podemos compreender ou entender que essa ala extrema da esquerda pode não fazer parte da institucionalidade, dada a característica intrínseca de tentar, ou, ocupar todos os espaços de Poder?

Dúvidas a parte, a blindagem institucional também constituí um valor ético inerente, isso é, assume o correto e o certo que é através das instituições do Estado que os direitos lutados, as pautas políticas a favor da classe trabalhadora, alcançara ou almejará uma ruptura gradativa com a lógica capital-mercado dentro do ordenamento jurídico e parlamentarismo.

Em manifestações ou protestos, não tem apenas anarquistas, existem outros grupos ideológicos, até que ponto podemos supor que para tais grupos ideológicos, manifestações ou protestos são espaços de poder que devem ser ocupados pela ideia-forte e se tornar preponderante na luta? Dificilmente podemos saber, não que dizer que tal hipótese deva ser negada, se enquanto tal movimento é um espaço de poder a ser conquistado, a ser “domado”, consequentemente a blindagem surgirá, as vezes não como vontade desses grupos, mas devido a ética que provém disso, o efeito é visto. Como não existe um movimento de massa qualitativo que mantenha uma liderança ou comando em tais protestos, e mesmo que tenha, é visível que para os vários grupos ideológicos de esquerda, é pelo partido[2] e instituições estatais que a luta se concretiza, dado a questão de “consciência de classe” é os grupos ideológicos que constituem uma consciência “maior” que tem uma certa noção ou visão do que é “necessário” para uma luta genuinamente revolucionária.

Dessas questões, existe uma certa característica que não pode ser ignorada, a burocracia e corrupção. Como existe toda uma esfera política-institucional para a manutenção da Autoridade, a melhor maneira de controlar, de manusear, de administrar as bases do Poder é por um controle rígido e centralizado, representado pela classe política que compõe a “administração da coisa pública”, todas as decisões que o grupo em que você faz ou fez parte nas discussões e debates políticos, todas as suas escolhas referente a isso, é dominado pela rigidez e centralidade da classe política, só é legal, só é legítimo se passa pela autorização estatal, qualquer coisa que não condiz com os aparatos legais e jurídicos do Estado, é tido como ilegal, como crime [3]. Portanto, as ações coercitivas do Estado, de todo seu ordenamento jurídico é contra as ações que visam a abolição de sua Autoridade (seu Poder), e não contra o crime em si, a impossibilidade e ineficiência das instituições estatais em prevenir a criminalidade é uma de suas principais características, essas questões é exatamente porque o Estado garante e cria as desigualdades sociais, o que mantém o monopólio coercitivo dele é a preservação dessas desigualdades — por mas que pareça que tais desigualdades são quase “inexistentes” como aparenta em alguns países. As relações de assimetria do poder como dizem, é a prova direta dessas questões de desigualdade social, um Poder que não tente ou almeje estar acima dos seres humanos, que não mantém e detém monopólios coercitivos, é uma carcaça vazia de sentido, de conteúdo, de potência em si. Como poderia um poder ser “poderes” dada as características internas de sua qualidade? A ideia de criar uma pós-estrutura do Poder, onde este último, significa potência e condição ao mesmo tempo, é uma ideia além de estúpida, insignificante, ora eu poder ter conhecimento (condição) é diferente e muito de aquele que detém o poder do conhecimento (autoridade), eu poder ir e vir (condição) é diferente daquilo que me impende de poder ir ou vir sem autorizações legais (autoridade), poderíamos trazer N exemplos dessas diferenças, mas a realização do Poder é a instituição que provém de cima, da existência de classes sociais baseada na sua desigualdade social (naquelas características de assimetria), isso é o que é Autoridade.

O oposto dessa Autoridade, é o que foi cunhado como um neologismo pelo Joseph Déjacque [4], o termo “Libertário”, como é contrário a forma e organização da Autoridade, ela se baseia na organização de baixo (base) das classes sociais, na ideia geral de que não se pode ser governado e nem governar impondo sua autoridade ou recebendo essa autoridade de outrem. Tal ideia é sinônimo de anarquia, não do tipo mutualista, mas do tipo socialista revolucionária, a anarquia como sistema, não como dialética, como superação e controle, não como equilíbrio entre autoridade e liberdade, anarquia como organização sociopolítica, e não como lei. Essa diferença entre a anarquia de Déjacque (libertário) e a an-arquia de Proudhon (mutualismo) é importante, mesmo podendo ser confundida como anarquia, o mutualismo é o sistema, é a estrutura da sociedade idealizada, e an-arquia é produto dialético, é uma abstração. A ruptura que advém desse neologismo é brusca e direta [5], e isso vai marcar uma cisão importante na AIT [6], vai mostrar verdadeiramente que uma ideia de uma organização de cima, pelo Estado (Autoridade — Autoritarismo) e uma organização de baixo, da base (Libertária) são totalmente contrárias, uma autoridade impõe, manda, comanda, já uma direção libertária, forma, organiza e mantém uma autonomia e liberdade, a autoridade centraliza, a libertária descentraliza, a autoridade conserva o Poder nas relações sociopolíticas, a libertária tenta criar a equidade nas relações sociopolíticas, tal autoridade burocratiza as tomadas de decisão e a administração daquilo que concerne no “bem-estar” da sociedade, enquanto que a libertária opta por questões de democracia direta — apesar de o autor defender a adhocracia no lugar da democracia direta; Para simplificar essa discussão, a democracia direta é um tipo de departamentalização vinculada a organização territorial do Federalismo Libertário, enquanto que a adhocracia é um tipo de organização temporária, autônoma, variável e adaptativa multidisciplinar, melhor atribuída a uma nova forma de concepção territorial — União Territorial Libertária [7]. A diferença entre a Autoridade e aqui podemos dizer a Liberdade (dentro da doutrina libertária) é explicita. Por isso mesmo, as questões da blindagem ético-institucional é contrária a qualquer forma de organização libertária, não apenas a forma de luta, de ações é diferente, como sua própria ética e moral é contrária as visões estatais e autoritárias.

E um dos principais agravantes da blindagem, é deslegitimar, é desqualificar os movimentos sociais que detém uma certa organização da base para suas ações, desde acusações de arruaça pela mídia e a direita política, e infiltrações [8] pela esquerda política, a tentativa de diminuir a raiva, o ódio que os sujeitos naquele momento tem contra as instituições, contra a ordem estabelecida (status quo), mas também não podemos enxergar tais ações como um tipo de ideal ou meios para alcançar uma sociedade igualitária, livre e equitativa, tais ações devem ser analisadas dentro de uma ótica estética, uma questão que provém da própria vontade humana de destruir seja para criar, ou para desabafar, essa estética, contrária a estética do status quo, é perigosa, é também ultrajante, como pode sujeitos miseráveis, pobres, ignorantes e medíocres queimar ou destruir igrejas? Queimar ou destruir monumentos históricos ou artísticos? Como pode destruir ou saquear lojas e comércios? Onde fica a ordem e a lei? Essas questões podem ser resumidas naquilo que é chamado vácuo de Poder, ora, nessas horas, mesmo que o grupo seja infiltrado, não há Poder embutido nessas ações, existe apenas a ação, ação estética e destruidora, mas continua sendo uma ação “descontrolada”, o controle sobre outros, sobre ação dos outros é o que dá a função para a blindagem ético-institucional, você pode agir, pode fazer, mas sobre o controle do Estado, das instituições autoritárias, esse é o certo e correto, caso contrário, caso escape dessa funcionalidade, a coerção cai sobre você, como Deus cai sobre o pecador.

A violência, as ações de destruição, os saques feitos em momentos de protestos/manifestações pela classe oprimida é sempre deslegitima, arruaça e vagabundagem para as instituições autoritárias, para a classe média-intelectual, para militantes partidários (algumas ideologias de esquerda e direita) e para a elite capitalista, a estética do desastre [9] consome a manutenção tanto do status quo quanto das próprias ações destruidoras dos sujeitos que se manifestam e protestam. Tudo que foge a ordem e a lei, que saiu da lógica do sistema capitalista, aparece como a estética do desastre, uma configuração do imaginário popular em desistir da mudança, pôs caso ocorra, ela trará o ruir, o fim, a destruição da humanidade, da natureza, tal perspectiva representada cinematograficamente [10] dessa estética, influência a opinião popular de forma forte e direta. Um poder deve ser constituído, deve permanecer, caso contrário, a visão apocalíptica toma conta, toma forma, e aqui nessas representações cinematográficas sobre o apocalipse, sobre a destruição da ordem e da lei, o vácuo de Poder é recuperado, ele se mantém e contém essa estética, como sempre podemos observar nos filmes ou séries desses temas, esse vácuo de poder, ou desenvolverá alguma instituição que reconstitui o Poder, ou, tal vácuo vai ser preenchido por uma instituição pior e mais brutal que a anterior.

As questões que advém dessa estrutura da blindagem ética-institucional se torna a própria estrutura de todos os movimentos sociais anticapitalistas, em algum ponto, o medo ou receio que o desastre ocorra, caso ninguém ocupe o Poder será visível, e até mesmo será base de luta dos movimentos sociais anticapitalistas. Não é difícil achar nesses movimentos, sujeitos que desclassificam o anarquismo como um tipo de utopia (aqui como pressuposto de idealismo romântico), devido a estética do desastre, como não será mentira expor que, objetivamente, o anarquismo para esses sujeitos não é uma forma de luta, um tipo de organização, é apenas um fim último a ser alcançado depois que toda a humanidade alcançar a iluminação, uma moralidade sublime, um senso de justiça extraordinário, por isso, nós enquanto libertários, devemos lutar ideologicamente em consonância com outras ideologias “pragmáticas”, nossa forma de lutar, de agir, de ser anarquistas é algo irrealizável a “curto e médio prazo”, e a longo prazo só pode ser feito se o curto e médio foram concretizados.

Como poderemos ser o que somos e agir igualmente a isso enquanto anarquistas, se estamos submetidos a lógica e estrutura dessa blindagem? Somos enquanto minoritários nos movimentos anticapitalistas obrigados a seguir esses supostos objetivos que nos dizem? Temos que aceitar que todos os sujeitos que compõe esses movimentos querem a anarquia, mas para isso é necessário justificar o fim com os meios necessários para se chegar? Devemos votar em candidatos da esquerda política, devemos se aliar aos socialistas autoritários, aos reformistas, aos marxistas autonomistas devido que a “luta deles são mais realista”? Se não temos como escapar do pragmatismo das estruturas dessa blindagem ético-institucional devido a sua estética do desastre, como então podemos continuar a ser anarquistas? Acredito que essas questões são apenas justificativas ingênuas de competição ideológica (de ser a ideia-forte dos movimentos sociais).

Sabemos muito bem que as massas não são a-ideológicas, que não são anticapitalistas, antiestadistas, antiteístas, ateístas, etc…, porém isso não é justificativa para que a doutrina libertária [11] seja jogada para escanteio. No Brasil, praticamente toda a sociedade é religiosa ou mantém algum tipo de crença mística e espiritual, para muitos dos movimentos sociais anticapitalistas alinhados visão de esquerda marxista, divulgar o ateísmo, e pior, o antiteísmo é atacar a própria perspectiva revolucionária socialista, como se pode contrariar a crença ou religião das pessoas, enquanto elas são alienadas a isso? Como já dito, isso faz parte da estética do desastre, do vácuo de Poder, manter as pessoas alienadas espiritualmente é manter preponderantemente a competição pelo Poder de controlar essas pessoas, com isso você entende porque os socialistas do tipo autoritário e a esquerda política constantemente defendem o Estado Laico, e nunca o ateísmo e antiteismo para as massas. Para eles, o Estado e a Religião (ou podemos colocar a crença mística-espiritual) não são aspectos de uma mesma composição alienadora, exploratória e autoritária. Piort Kropotkin resume bem esse pensamento, ao dizer:

“Triste espetáculo é o de ver aqueles que se julgam revolucionários consagrar o mais profundo ódio aos anarquistas — só porque as concepções anarquistas sobre a liberdade, ultrapassam as concepções, mesquinhas e estreitas, que eles têm sobre o assunto, concepções essas que eles adquiriam na escola oficial do Estado! E, entretanto, este espetáculo é um fato real e positivo. É que o espírito de servidão voluntária foi sempre cultivado habilmente nos cérebros juvenis; e, atualmente, ainda segue a mesma norma, para perpetuar a submissão do indivíduo ao Estado.

Assim, a filosofia libertária acha-se um tanto ou quanto afogada pela pseudo-filosofia romano-católica do Estado. A história encontra-se totalmente viciada, mentindo-nos desde a sua primeira página, em que nos fala das realezas merovíngias e carlovíngias, até a última, em que nos glorifica o jacobinismo e esquece o povo na sua verdadeira obra criadora das instituições.

As ciências naturais são alteradas para as colocarem ao serviço do duplo ídolo — a Igreja e o Estado.

A psicologia do indivíduo, e ainda a psicologia das sociedades, são falsificadas em cada uma das suas asserções para se poder justificar a tríplice aliança do soldado, do padre e do juiz-carrasco.

[…] A moral, enfim, depois de ter pregado, durante séculos, a cega obediência à Igreja e à bíblia, não se emancipou senão para pregar a obediência ao Estado.

[…] E a glorificação do Estado e da disciplina, na qual estão empenhadas a Universidade e a Igreja, a imprensa e os partidos políticos, é tão bem feita que, até os chamados revolucionários não ousam olhar de frente para este fetiche.

Assim, o radical moderno é centralizador, estatal, jacobino ferrenho. E o socialista marcha em coluna cerrada com ele.

[…] o socialista dos nossos dias não sabe … senão invocar, em todos os sentidos, os mesmos deuses: o Estado e a ditadura para se salvar das abominações e ignomínias do regime econômico, abominações e ignomínias criadas pelo mesmo Estado e pela mesma ditadura”. O Estado e seu papel histórico

Os anarquistas se encontram em total oposição contras as ideologias autoritárias, não é através de alianças táticas, de conluios críticos ou de semelhanças contra um “inimigo em comum” que tal oposição pode ser diminuída, controlada ou manipulada. O proceder, a luta e categoricamente falando: “O que fazer”, já deveria ser não apenas consenso, mas regra e obrigação para o movimento libertário como um todo! Porém são divergências, confrontos e contrariedades que enfrentamos, variadas formas de conceber o que é anarquismo e anarquia, variados jeitos de formar organizações ou não, intrigas e mesquinharias se tornaram o triunfo em grande parte do movimento libertário, a estética do desastre alinhado a blindagem ética-institucional se tornou fator decisivo no “como fazer”.

Alguma determinada emenda ou lei visa fazer a reforma trabalhista [12], e com essa reforma vários “direitos conquistados” [13] serão revisados ou extinguidos, isso se transforma em uma pauta social e depois política, grupos ideológicos já estruturalmente determinados se embutem de criar coligações para manifestações que querem lutar contra isso, como também, esses grupos podem surgir espontaneamente junto as massas já manifestadas. Todas as manifestações ou protestos são ideológicos, todas eles estão divulgando um conjunto de ideias e valores relativos, obviamente grupos dispersos vão adentrar tais manifestações, os espaços de poder devem ser ocupados ou preenchidos, se não é pela sua ideologia, será por outras, consequência natural do vácuo de Poder, como deixar esses espaços e o próprio Poder nas mãos de grupos ideológicos diversos? Impossível, são as ideologias que ganham quando se mantém como uma ideia-forte no seio das massas manifestadas que vai conseguir se solidificar e assumir por um determinado período, os espaços de poder, e com isso, as oportunidades aparecem e posições para conquistar o Poder se tornam basicamente claras, como os anarquistas não visam, isso é, não ocupam os espaços de Poder e nem preenchem o vácuo de Poder, se tornam uma ideologia idealista (para usar essa forma de pejorativo descrito por vários grupos da esquerda política), uma prática não pragmática, por fim, uma utopia ingênua e romântica pequeno-burguesa, dado que tal ideologia visa apenas um tipo de “liberdade” utilitária que representa o grosso dessa classe, para todos os outros grupos ideológicos da esquerda política, o anarquismo não possui e nem tem algo como “O que Fazer” e “Como fazer”, dada a impossibilidade de lutar sem ocupar espaços e preencher o vácuo de Poder, essa concepção também traz a ideia de que com isso, pela falta de Poder, os sujeitos podem fazer o que quiserem e ficarão impunes, podem defender qualquer ideia que continuarão libertários, sustenta a ideia que sem Poder, sem um órgão central e controlador, que determina quais ações, que tipo de ações e como fazer essas ações, não há utilidade ou mesmo eficiência nas ações libertárias, reduzindo-as a ideia de arruaça e libertinagem.

Isso faz com que o movimento libertário se torne apenas uma nota de rodapé no socialismo e nas manifestações sociais, algo apenas como uma identidade de adolescente frustrado com a vida, com a família, com a sexualidade, uma fase rebelde que logo passa com as “experiências de vida”, uma ideologia alienada da realidade da classe trabalhadora.

Essa visão ideológica dos outros grupos que compõe o movimento socialista e anticapitalista sobre o anarquismo aparece em vários momentos da história, como também no próprio meio anarquista, nos dizem para analisar o contexto atual, e que naquele momento agir era só daquela maneira, incrivelmente o contexto atual e o modo de agir sempre são os mesmos em todos os contextos e momentos que tiveram que ser, sempre tiveram que colocar as outras ideologias ou doutrinas contra a libertária, tiveram que se submeter a uma frente ampla de esquerda antifascista para adentrar aos ministérios na Espanha libertária, porque o momento e o contexto assim diziam, tiveram que se aliar estrategicamente a grupos autoritários para lutar contra um inimigo em comum, onde essa aliança estratégica é determinada pela ideologia autoritária, porque o contexto e o momento assim diziam.

Os sujeitos anarquistas manifestam uma forma de medo da própria anarquia, devido à materialidade das coisas, a anarquia “deve se adaptar” conforme a luta decorre, como a “consciência de classe” determina, se o país é extremamente religioso, então a anarquia tem que se adaptar a isso, e não fazer propaganda de pensamentos ateístas e antiteístas, se o país tem algumas leis e direitos que supostamente são benéficas a classe trabalhadora, não se deve pensar em criticar ou então debater melhorias, se deve sempre atuar contra a retirada dessas leis e direitos e protegê-los a todo custo, se o país mantém uma saúde pública “gratuita”, não se deve questionar tanto a gratuidade quanto a própria saúde pública, no momento e no contextual atual, debates, discussões, críticas contra as instituições do Estado estão fora de cogitação, críticas aos impostos e taxas tributárias? Capaz, isso é coisa de neoliberal fascista; Pautas relacionadas a necessidade de uma maior autonomia e liberdade econômica e política? Não, liberdade econômica é coisa de liberal, socialistas defendem um Estado socialista, então defender a liberdade econômica não é socialista; Criar uma organização realmente libertária dentro de associações econômicas visadas a sustentar o próprio movimento anarquista, e com isso intensificar tanto a propaganda, quanto a divulgação de textos libertários para as massas? Não, é impossível um “movimento anarquista” fora das massas, da realidade da classe trabalhadora!

Isso significa que o momento e contexto atual ofuscam de forma objetiva as questões táticas, práticas e estratégicas do movimento libertário sobre “O que fazer” e “Como fazer”. Em uma sociedade extremamente religiosa, o que fazer é estrategicamente imbuir o ateísmo e antiteismo como discurso e propaganda no seio dessa sociedade, como fazer isso teria que ser com escolas, ateneus e debates ao ar livre, isso ocorreu nas primeiras escolas modernas libertárias aqui no Brasil e em alguns lugares da Europa, atualmente existe uma Universidade Popular na França [14], uma estrutura coletiva e autônoma que mantém discursos e propaganda libertária.

Temos sempre a possibilidade de fazer ocorrer, de concretizar as bases, os fundamentos, as teses, os princípios libertários constantemente no dia-a-dia, porém, para isso é necessário uma estrutura que consiga sustentar essas possibilidades, e aqui cairemos na questão econômica do movimento — sem recursos, sem bases materiais não existe realização da prática libertária de forma coerente. Essa possibilidade de tornar real a anarquia existe em todo período histórico que se queira colocá-la, um devir histórico, uma iluminação ética, uma perfeição humana é contrassenso dentro dos ideais libertários, a ocorrência da anarquia é aqui e agora, como protesto, como revolta, como ações, como relações sociais, como liberdade, como igualdade e equidade, ela pode ocorrer e pode ser hoje!

Tudo isso se dá devido ao elo intransigente do termo “exemplo”, o que liga a teoria e a prática é o “exemplo”, nos dizem, devemos ser o exemplo através de nossas ações, isso é até correto em certo ponto, para o movimento libertário, a teoria-prática estão ligadas, a teoria sustenta a prática, e a prática desenvolve a teoria, o exemplo no meio anarquista não é uma práxis.

Tal concepção de “práxis” tem uma característica que os “fins justificam os meios”, devido a sua ligação dialética, ela se abstêm de uma questão ética e moral objetiva, o agir teleológico já está explícito, então qualquer meio para essa teleologia é justificada, como Gaston Leval argumenta:

“Mas a elasticidade da dialética segundo a qual o branco é preto e o preto é branco, e tudo pode ser interpretado nas mais diversas formas e sempre com lógica aparente, permite as posições mais opostas. Isso facilitou as múltiplas interpretações do marxismo e as táticas contraditórias dos diferentes partidos marxistas. Limitando-nos aos últimos trinta anos da história moderna, vimos os comunistas alemães proporem a aliança aos nazistas antes de Hitler chegar ao poder, Stalin aliado a Hitler, o que permitiu a eclosão da Segunda Guerra Mundial; vimos os comunistas torturarem Batista em Cuba e atacar Perón, por um lado, e apoiá-lo por outro; recentemente propuseram aos peronistas uma aliança eleitoral que estes rejeitaram. Hoje eles estão fazendo tudo o que podem para trabalhar em conjunto com os franquistas contra aqueles que proclamaram ontem que é necessário ser implacável. Vimos eles, desde o triunfo da revolução russa, proclamarem-se em todos os países simultaneamente internacionalistas e nacionalistas; ajudando abertamente o triunfo de Hitler ao dividir as forças anti-Hitler alemãs nas eleições de 1933, opondo seu candidato, Thaelman, ao candidato dos democratas e socialistas; Vimos que os comunistas franceses ‘alcançam os católicos’, enquanto lutam ferozmente contra os socialistas; vimos na Espanha, Largo Caballero, da esquerda marxista, ser conselheiro de Primo de Rivera; Como vimos antes de 1914, os social-democratas alemães votarem nos créditos de guerra, apesar de constituírem o partido marxista mais impregnado de marxismo no mundo. Foi visto, no parlamento francês, após a Segunda Guerra Mundial, os comunistas sempre votando com os direitos contra os governos liberais, o que levou ao triunfo geral de Gaulle contra o qual hoje eles chamam para lutar contra as partes que atacaram antes, a pretexto de defender a democracia.

É claro que essas atitudes contraditórias, muitas vezes imprevisíveis, que nem podem ser explicadas pelas táticas da ‘politique du pire’, levam a uma total ausência de moralidade”. [Gaston Leval, La Falácia del Marxismo]

Diferentemente da categoria de teoria-prática libertária que se define pelo termo “exemplo”, onde não há uma “ligação dialética”, mas sim uma determinação moralmente objetiva. Para a doutrina libertária, os meios e os fins são iguais, então deve-se agir e dar o exemplo do que os meios e os fins expressam, enquanto comunistas libertário(a)s os meios e os fins são o comunismo libertário, para sua prática o exemplo do que a teoria diz é necessário, a cada novas experiências, essa teoria irá se desenvolver ou ser “refutada” para formar novas teses a partir da experiência. Toda prática libertária, é uma ação moral baseada em um conjunto determinado eticamente, o exemplo reflete (ou deveria) refletir isso, por isso irá se ver críticas as experiências isoladas, as formas de ação direta, as alianças contrárias aos ideais anarquistas, se identificará o que é ou não “anarquista”, quais experiências são libertárias ou não, porque sem alguns fatores morais e éticos objetivos, tudo aquilo que se considera-se anarquista (seja por conta de ser contra o Estado, contra o Capitalismo ou ambos) seria anarquista sem discussão, toda experiência que se diz anarquista (como atualmente o Território Curdo, ou então as organizações como altermondialiste ou occupy) seria sem mais ou menos libertárias, e não é isso que ocorre no movimento e nos grupos anarquistas.

Podemos definir essa questão sobre o exemplo e sua constituição moral e ética, com o conceito “sectarismo”, ser sectário é agir moralmente dentro de valores éticos coerentes dando o exemplo do que a doutrina libertária sustenta, não agindo como uma forma de “seita” e sim como uma ação exemplar coerente e sensata dos princípios, teses, fundamentos que advém de toda a teoria libertária, ou seja, adaptamos nossas ações a teoria e a teoria as nossas ações. Retornamos assim a uma clareza de que “O que fazer” e “Como Fazer” está ligado ao exemplo que devemos sustentar através de todas as ações determinadas moralmente e eticamente pela doutrina libertária. Se a teoria fala sobre a liberdade [livre-desenvolvimento], devemos tanto na organização quanto no dia-a-dia sustentar através do exemplo isso dentro das características libertárias, se a teoria fala sobre a autonomia, idem, e assim sucessivamente; Se sabemos que é necessário uma educação científica, ateísta e antiteísta, devemos dar o exemplo disso, temos que criar escolas, ateneus, ou o quer que seja, para trazer essa educação a população! Se falamos sobre a necessidade de relações sociais igualitárias, equitativas e solidarias, devemos através do exemplo sustentar isso no próprio seio do movimento libertário, se falamos que a organização socioeconômica que almejamos é o comunismo anarquista, é através dessa organização socioeconômica que devemos nos basear nas ações diretas, nas pautas, na atuação sociopolítica, e para isso é o exemplo direto que essa organização socioeconômica funciona no hoje, no agora deve se manter. Um movimento anarquista que se retrai em um tipo de ideologia e uma vulgarização de conceber um “dogmatismo” ou melhor falando, de um “cretinismo”, está ocultando a própria fundamentação do que é o anarquismo, isso é, “Hoje, a anarquia é ataque, é a guerra contra toda a autoridade, contra todo o poder, contra todo o Estado. Na sociedade futura, a anarquia será a defesa, a prevenção contra o reestabelecimento de toda a autoridade, de todo o poder, de todo o Estado” [15], estamos e estaremos sempre atacando e guerreando contra toda a autoridade, todo poder, todos os Estados, não existe um Estado que possamos defender, nem mesmo aquele que supostamente proporciona “os melhores serviços públicos”, já que o posicionamento anarquista não é sobre um juízo de valor vulgar de “qualidade e preço” e sim sobre a liberdade e igualdade, enquanto o Estado existir, a desigualdade socioeconômica existirá, e com isso, toda a suposição de “melhor ou melhores serviços públicos” se torna um pretexto meramente subjetivo e utilitarista.

Não podemos nos enganar com o “pragmatismo” que provém das outras ideologias políticas dentro do que foi descrito como blindagem ética-institucional e sua estética do desastre, elas tem uma posição fantasmagórica sobre a liberdade, igualdade, equidade e autonomia, para tais ideologias, quanto maior o controle do Estado sobre determinados assuntos, quanto maior acesso à classe oprimida consegue ter dentro das relações capitalistas, quanto maior a distribuição de renda “conquistam” e determinam sua práxis, é o ideal proposto teoricamente! Podemos verificar isso através das discussões e debates acerca das políticas públicas entre os países terceiro-mundistas contra países primeiro-mundistas, esse aspecto é claro, o que determina eficiência e concretização do ideal é um maior acesso da classe oprimida e um controle rígido de alguns assuntos pelo Estado, uma comparação fraca, entre os países, que não constitui o exemplo (agir dando o exemplo com o que o ideal pressupõe, os meios e os fins são os mesmos) e sim com a práxis (agir das maneiras necessárias, independente as consequências para alcançar os fins desejados, essas maneiras necessárias já estão justificadas teleologicamente). Países escandinavos têm um maior índice de desenvolvimento humano, então devemos nos basear nas políticas públicas desses países para utilizar aqui no Brasil, ignorando os fatores sociais, culturais, econômicos, históricos, geográficos e demográficos que configuram cada nação.

Nos dizem que um Estado socialista (ditadura do proletariado) é melhor do que um Estado Burguês (ditadura burguesa) e vice-versa, qual forma de medir isso? Comparando os serviços prestados por ambas concepções de ditaduras?! As relações de classe, o fetichismo das mercadorias, a exploração da mais-valia, as organizações jurídicas, a brutalidade, a fome, a pobreza, a miséria, a coerção política e econômica, o controle de informações, de conhecimento e hoje da tecnologia, as questões sobre liberdade, sobre igualdade, sobre equidade, as relações de cooperação vs narcisismo, de solidariedade vs competição, e outras formas de relações (que no fim se determinam moralmente) são ignoradas, ou justificadas como “idealismo”, “falsa informação”, “propaganda anticomunista”, “propaganda anticapitalista”, “sintomas da revolução colorida”, e outras conspirações, onde tudo pode ser justificado como um meio para se atingir o fim proposto (teoricamente), tudo é válido, tudo é pertinente, qualquer um que critique essas justificativas, é considerado(a) louco(a) e lunático(a). E uma diversificada obra literária é produzida para defender e manter tais justificativas, tais meios, justificaram a escravidão como necessária para o desenvolvimento da sociedade ocidental, a misoginia, o racismo, o sexismo, a lgbtfobia, os meios que se utilizam para justificar é válido, mesmo com roupagem científica, filosófica ou racional. Enquanto os fins justificarem os meios, as pseudociências, a fé e a crença no mistico caminharam continuamente de mãos dadas com essas justificativas.

Continuará…

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1 O uso do termo “sujeito” é totalmente “neutro”, traduz qualquer gênero e sexualidade.

2 Aqui o conceito partido não é compreendido como tomar parte, mas como uma forma ou tática de grupos políticos dentro das instituições querendo chegar ao fim idealizado.

3 Estamos falando aqui sobre a questão de infraestrutura urbana e coisas relativas aos processos sociais como moradia, alimentação, saneamento básico, coisas que fogem a isso como crimes hediondos — assassinato, estupro, etc.., não fazem parte dessa questão, até porque qualquer sociedade sã e consciente sabe que regras sociais, além de serem características de coesão social, precede as leis e normas legais.

4 Joseph Déjacque (Paris, 27 de dezembro de 1821 — Paris, 18 de novembro de 1865), comunista libertário, tal termo primeiramente significou uma proposta oposta até então ao tipo de an-arquia (mutualismo) de Proudhon, o Libertário ainda continha as bases essenciais da anarquia, mas não tinha a estrutura econômica da ideologia mutualista de Proudhon.

5 Essa ruptura aparecerá de forma significante posteriormente na AIT.

6 Associação Internacional dos Trabalhodres

7 Consultar esses links: Departamentalização, Adhocracia e União Territorial Libertária

8Isso não quer dizer que não tenha grupos que criam essas confusões devido a ser realmente infiltrados para passar um ar de desqualificação que a mídia passa para os outros.

9 Ainda vivemos culturalmente condicionados pela sensibilidade romântica do século XIX que nos permite apreciar e aproximar esteticamente o terror. A sublimidade do desastre é uma característica estética de nosso tempo, exemplificada em centenas de filmes apocalípticos de Hollywood. Referimo-nos ao imaginário cultural da destruição iminente de nossa sociedade, onde as ruínas não são ruínas clássicas, mas nossas próprias cidades reduzidas a escombros e onde a natureza invadiu todas as criações humanas e recuperou seu poder na terra. Chegamos idealizar e estetizar a destruição a tal ponto que não chegamos a temê-la, mas a assumimos como inevitável, libertadora e (apesar dos conflitos éticos) bela e sublime. Mas a catarse e a admiração pela catástrofe só podem acontecer se o espectador estiver seguro, ou seja, se ele não for parte integrante — física ou afetiva — do que ali acontece. É por isso que vemos certa poesia nas imagens terríveis do desastre, porque nossas vidas não vão acontecer, porque o sangue não respinga em nós. Porque, na realidade, tudo isso não nos “afeta”. Miguel Á. Hernandez

10 Para mais informações consulte: Naturaleza muerta

11 Doutrina libertária diz respeito a um conjunto objetivo de princípios, fundamentos e teoria que sustenta o movimento, difere de ideologia que mantém uma subjetividade de valores e regras dentro do movimento, pode ser que se use o termo “ideologia” quando se fala de anarquismo e anarquia no decorrer anterior e posterior do texto, porém, ressalto que defendo a ideia de doutrina libertária, e não ideologia anarquista.

12 Apenas um exemplo, poderíamos colocar qualquer outra reforma, ou alguma lei X que não condiz com as necessidades da classe trabalhadora.

13 Se esses direitos estão dentro dos ditames políticos do ordenamento jurídico, isso é, fazem parte da constituição jurídica estatal, não é uma “conquista”, e sim uma autorização, conquistas permanecem, autorizações expiram.

14 Para informações consulte: Universidade Popular de Caen

15 Anarquia e Comunismo, Carlo Cafiero

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André Tunes
Do Pseudo-Intelectual

Dentro do jogo, o intuito é sempre está um passo a frente.