Sobre os Ataques da Esquerda e dos Marxistas contra o Anarquismo e o emblema do “não vote, lute!”

André Tunes
Do Pseudo-Intelectual
9 min readNov 30, 2020

Como já esperado as eleições municipais 2020 foi concluída, e em vários locais a esquerda perdeu. Com isso os setores da esquerda começaram as acusações contra o movimento libertário e sobre o emblema de “não vote, lute!”, vamos analisar de forma crítica e materialista se tais acusações são realistas.

A 1º presunção é que o emblema do “não vote, lute!” não condiz com a realidade, já que o “lute” no movimento anarquista é quase ou inexistente, isso é, para os setores da esquerda, o lute está ligado as visões de greves gerais, de insurgências anarquistas, está vinculado a visão que esse emblema é a capacidade de revolução.

Se isso fosse realmente verdade, não teríamos anarquistas realmente lutando, não quer dizer absolutamente que tal luta tenha alguma relevância enorme na sociedade, apenas que o “lute” é feito por vários grupos e indivíduos, cada um com suas limitações, esperar que anarquistas em grande parte isolados nacionalmente, dispersos em pequenos grupos em diferentes localidades, formalize uma revolução ou revolta armada do nada, sem recursos, sem bases materiais concretas é pura ingenuidade, como também é uma utopia desses setores da esquerda.

Vamos analisar essas questões de que se não votamos, é porque já existe uma suposta organização nacionalmente capacitada a fornecer armamento e bases materiais a classe trabalhadora.

Isso não passa de um ataque emotivo e infundado, dado que além de ser uma ideia estúpida, também é a demonstração empírica que os setores da esquerda esperam de forma esperançosa, e praticamente de forma fideísta, que não eles, mas os outros devem fazer tais preparativos, já que tais setores fazem sua parte votando nos candidatos de esquerda, para assim disputar ou ocupar os espaços de poder a favor da classe trabalhadora. A revolução, as greves, as insurgências fazem parte de um conjunto concreto de fatores determinantes, uma greve, até mesmo localmente precisa de fatores para se realizar tais greves, mas se tanto o Estado quanto os empresários fornecem todas as “ferramentas anti-greve” como se pode ter uma? Se temos um governo de esquerda no poder, e esse garante supostamente alguns benefícios estatais para as empresas, e isso limita a própria luta proletária, qual o sentido dos setores da esquerda defenderam a ideia de greves? E isso pode ser também para as insurgências e revoltas armadas, como podemos ter uma revolta armada, se a própria esquerda condena as leis a favor do armamento? Dizem-nos que a população não está preparada para possuir armas, mas a população não é formada pela classe trabalhadora? Como podemos então cogitar revolta armada, primeiro sem as bases materiais para a compra de armamento, e segundo, com leis contra o armamento que faz com que a classe trabalhadora fique desarmada e despreparada para todas as insurgências que poderiam se transformar em revolta armada? Então delimitar que se não votar, é porque já está organizado em milícias armadas é um ataque desconectado da realidade, quando é da própria esquerda que provém a defesa irrestrita contra o armamento e a revolta armada!

Disso, não se pode concluir que o emblema “não vote, lute!” traz uma esfera organizacional armada, já determinadamente configurada para gerar greves gerais e expropriações dos latifundiários e da classe rica, sendo que é os setores da esquerda que restringem essa possibilidade através da ideia do voto e de ocupação e disputa dos espaços de poder estatal.

Concluindo, a 1º presunção não se confirmar com a realidade material em que se quer aplicar o ataque.

A 2º presunção está em assumir que em São Paulo, os 4,39 de votos brancos, os 9,76 de votos nulos e os 30,81 de abstenções fazem parte de uma propaganda do “não vote, lute!”.

Ao pressupor que os 3.652,457 (44,96%) milhões de paulistanos(a)s fazem parte de uma propaganda libertária contra o voto, ou que são anarquistas é literalmente fazer um ataque falacioso e incongruente com a realidade. Tanto os votos brancos quanto os nulos apresentam uma característica que os candidatos não representam ou tem a aprovação dos eleitores, isso é o que é chamado de democracia burguesa, algo organizado para essa obtenção e possibilidade.

Falam que tudo é política e envolve política, ou seja, o próprio ato de não votar é um ato político, expressar que aquelas 44,96% de pessoas que não votaram são despolitizados não consiste de forma esporádica em uma verdade, sim existe uma ignorância no seio popular sobre a política, hoje muito evidente através da polarização e do fundamentalismo ideológico de vários grupos em ambos espaços políticos (direita e esquerda), só não é certo que assumir que o ato de não votar, é um ato despolitizado, quando se mantém que tudo é e envolve política.

Entretanto, existe uma verdade e veracidade nesses 44,96%, a irrelevância, a ineficiência e a separação que os setores da esquerda estão das massas, da população como um todo. É muito demonstrável, como o marxismo com suas ramificações é indiferente para as massas, se o Marxismo cogita ser a “eterna ciência do proletariado”, que supõe que é a única “teoria revolucionária capaz de libertar a classe trabalhadora”, evidentemente se prova o contrário. Se o vote, não lute é capaz de sustentar 3.652,457 milhões de pessoas contra o voto, também se demonstra que essa quantidade de pessoas não foi alcançada pelo Marxismo, e, pode ser, que sequer sabem ou conhecem algo relativo a tal ideologia. Prova também que a militância político-partidária seja dos partidos marxistas no parlamento, seja pela militância Marxista fora dele, nem sequer é relevante, todo o trabalho de base é descartável para essa quantidade de pessoas.

Obviamente pode se mencionar que o candidato do PSOL, Guilherme Boulos, somou 2.168, 109 (40,62%) de votos, porém, podemos concluir que o PSOL e o Boulos é Marxista? E além disso, podemos presumir que esses 40,62% de votos é inteiramente e apenas de Marxistas? Claro que não, ali várias pessoas de diferentes percepções e ideais votaram, da mesma forma que essas características podem ser mencionadas no candidato reeleito Bruno Covas do PSDB, a luta pela via do voto, é uma luta inútil, exatamente pela: a) a distância que o Marxismo está da classe trabalhadora; b) O romantismo através da biopolítica (Foucault) que ocupar e disputar os espaços de poder, condiz com uma possibilidade de luta; c) Que votar no “menos pior” é um juízo de valor e ético na representação dos interesses da classe trabalhadora no parlamento, e d) A ideia que se pode votar e lutar ao mesmo tempo, quando que, descrimina e ataca a própria noção de luta, através de aspectos do: se não votar, elege “fascistas”, e como já é explícito no movimento socialista, o fascismo se derrota na luta e não nas urnas!

E temos que mencionar que o voto branco não computa para legenda, e o voto nulo não traz a anulação das eleições, isso é uma notícia falsa e mito no imaginário popular, toda a questão eleitoral se traduz apenas na computação dos votos válidos, isso é, daqueles que possuem os documentos eleitorais para votar, e entrar em uma estatística, votos válidos, votos nulos, brancos e as abstenções traduzem apenas a quantidade de eleitores em determinados locais e no território nacional, a política não é feita pelos votos ou não-votos, e sim pelas coligações existentes entre as variadas legendas, isso é visível quando candidatos com menos votos se elegem, enquanto que aqueles candidatos com mais votos não. Um caso foi o candidato Tiririca trazendo alguns candidatos que não possuíam votos para se eleger.

A 3º presunção consiste paradoxalmente em imputar que o anarquismo é irrelevante como movimento para a luta proletária, enquanto acusam os mesmos de serem os responsáveis pela ascensão da direita.

Se você assume que o movimento libertário é irrelevante para a luta proletária, assume também que tal movimento não possui força e nem mesmo contingente de pessoal para ser relevante, isso mostra que os ataques contra os anarquistas partem de um medo e receio, como de uma falácia, ao mesmo tempo que se assume uma característica a-crítica de compreender a própria insignificância do Marxismo e setores da esquerda. É melhor concluir que é a galera do não vote, lute!, é a culpada por eleger os candidatos de direita, do que admitir a própria distância que se encontra da classe trabalhadora. É melhor sustentar a hipótese de que sendo uma “ciência proletária” as teses marxistas e marxianas não erram e são infalíveis, do que aceitar que tal “ciência” não se encontra na realidade , é apenas um artifício e propaganda para ainda ter uma “esperança” que tal ideologia é funcional e viável.

Concluindo, tal presunção é uma falácia, e também um tipo de negação da realidade, impor ou supor que é culpa do não votar e disso, é culpa dos anarquistas que a direita está poder, é não compreender como funciona a política e a própria democracia burguesa!

E por fim, para não prolongar as opiniões infundadas dos Marxistas e da ala esquerda no geral contra os anarquistas, a 4º presunção consiste em afirmar que as “eleições são uma farsa” e também imaginar que, enquanto não existe uma organização armada, uma revolução e nem fagulhas insurrecionais, votar é necessário.

As eleições são uma farsa, mas por que? Se elas são uma farsa, como se pode concluir ou até mesmo pressupor que votar no menos pior é necessário? Que ocupar e disputar os espaços de poder são o oposto da farsa, isso é, que são integras? Não há ai uma posição idealista e pequena burguesa, baseada no próprio status quo do sistema capitalista?

Não é o voto que elege necessariamente os candidatos ao poder, é as coligações que somam os votos válidos e assim elegem taticamente candidatos de menor quantidade de votos, como também, não é pelo voto que se manterá uma hegemonia de esquerda dentro do parlamento, mas sim o conluio e alianças com a oposição! As eleições são uma farsa, porque o voto é irrelevante e inútil dentro da democracia burguesa, tal estrutura já foi desenhada e edificada para que não aja uma ruptura brusca, revoltas sociais e insurgências pelo território, você tem apenas a ilusão de escolha e de cidadania, ocorre exatamente o contrário, enquanto ditadura burguesa, o ditador já é determinado com toda a classe política escancaradamente atuando em consonância, o filósofo Noberto Bobbio demonstrou que é impossível existir uma esquerda sem direita, e uma direita sem esquerda, então para ser uma farsa tanto as eleições quanto a própria democracia representativa burguesa, não se pode assumir que exista de fato uma oposição entre direita e esquerda, quando a diferença entre elas é apenas ideológica, mas a razão de ser não muda por causa disso, se a direita mantém e faz a manutenção do status quo dentro de uma lógica de inigualdade social, a esquerda visa a reforma do status quo através da lógica de igualdade social, essa oposição é apenas simbólica e discursiva, tanto que até mesmo das próprias ideologias, as oposições são simbólicas, veja por exemplo a ideologia fascista, internamento existia oposição os ideais fascistas de Mussolini, no Nazismo idem, no marxismo existe oposição entre os ideais, no liberalismo, etc…, a estrutura do conceito continua o mesmo, sua realidade não muda devido a essa oposição simbólica, apenas a maneira de administrar tal oposição é feita. Maior ou menor igualdade/inigualdade é indiferente enquanto existe a ilusão de meritocracia, da exploração da mais-valia, do fetichismo das mercadorias, enquanto existe o sociometabolismo do capital, é impossível e improvável que a esquerda se eleita, governará sempre a favor da classe trabalhadora, medidas e ações contrárias aos interesses da classe trabalhadora existirá, porque mesmo governos de esquerda fazem parte da luta de classes.

Se vamos admitir a existência da luta de classes, devemos também aceitar que mesmos governos de esquerda estão delimitados por essa luta, e não é através de algumas leis, direitos e emendas a favor da classe proletária, que o antagonismo de classe diminui ou desaparece. Temos que entender que a própria classe política existe como uma esfera adicional da luta de classes, e seus interesses são a manutenção do Poder Política, e enquanto manutenção, utilizarão de qualquer ferramenta e artifícios para preservar isso, a ideia de “conquistar o Poder Político através da ditadura do proletariado” é uma ideia literalmente contraditória e natimorta, conquistar o Poder Político e reduzir a luta e o movimento socialista a essa conquista é pura propaganda anticomunista.

Para existir uma organização revolucionária e armada, para constituir insurgências sociais contra a ordem vigente, tanto os Marxistas quanto a esquerda, devem ser radicalmente anarquistas, caso contrário, caso ainda mantenha uma certa ingenuidade política e econômica, uma certa frescura e medo de assumir pautas que hoje aparentam ser da direita, sempre ficarão distantes do que as massas necessitam, desejam e almejam. Pautas contra a redução dos impostos e taxas tributárias, pautas a favor do armamento, pautas a favor da redução do Estado nas esferas pessoais e econômicas, como também, pautas sobre a educação científica e ateísmo para as massas, são necessárias e características socialistas, em algum momento, o desejo da revolta armada será confrontada pelas leis contra o armamento, se você acredita que é apenas na revolta armada que a “população terá uma consciência de classe” ao mesmo que ainda preserva as religiões e o Poder Político, tal consciência de classe será apenas uma desculpa para a dominação de um grupo minoritário contra as massas.

É necessário radicalizar, é necessário ultrapassar a mesquinhez e jacobinismo ultrapassado do Marxismo e da esquerda, uma alternativa comunista libertária é imprescindível para a luta revolucionária, uma base forte e congruente do que aparenta ser “pautas da direita” se faz mais do que nunca uma defesa, não para a manutenção do status quo que essas pautas da direita mantém, e sim para a ruptura brusca do status quo, através da própria noção de que tais pautas são importantes, tanto para a luta de classes ser abolida, quanto para desenvolver a consciência de classe no seio da classe trabalhadora!

Como é característico no movimento anarquista, ou a Revolução é Comunista ou não é Revolução!

--

--