Eu, UX Writer: Será que faço design com as palavras?

Talita González
conexadesign
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4 min readApr 12, 2021

Recentemente, minha mãe perguntou no que eu trabalhava. Hesitei. Pensei durante alguns momentos sobre como responder. E, para simplificar, disse a ela: “Eu organizo e simplifico o conteúdo que você vê na tela do celular quando abre um aplicativo. Tudo o que você lê para conseguir fazer uma transferência bancária pelo aplicativo do banco, para conseguir ver um filme na Netflix, acessar seu e-mail ou compartilhar alguma coisa no Facebook é feito por uma pessoa que tem a mesma profissão que eu, como UX Writer.”

E então ela fez uma pergunta fundamental: “Nesse caso, você só escreve as palavras?”.

Completei a resposta dizendo que, na prática, não era apenas escrevê-las. Meu trabalho era criar, por meio do conteúdo, a melhor experiência possível para as pessoas que utilizam um aplicativo, website ou interface. Para isso, porém, havia etapas anteriores às palavras.

Assim como minha mãe, muitas pessoas e organizações têm dúvidas sobre o que é ou qual é a função de UX Writer. Eu, particularmente, gosto de fazer uma analogia sobre a profissão e a Air fryer.

Obrigada, Adrian Birdsong Hutchison, por esse maravilhoso ensaio fotográfico com a sua Air fryer

Ah, e se você quer se aprofundar também na discussão sobre a Air fryer, vale ouvir o Braincast #300 (Airfryer, a NASA na sua cozinha (ou não)).

Essa é uma discussão pertinente. Não há resposta certa ou errada. No entanto, para mim, o trabalho de UX Writing não pode ser apenas pela escolha de sinônimos e palavras bonitinhas, claro.

Para organizar, simplificar e organizar o conteúdo, com o objetivo de oferecer uma experiência melhor e adequada à pessoa usuária, não dá para ser apenas a “Pessoa das Palavras”. Ser chamada pontualmente para resolver um problema de caracteres na interface não é bem lá a melhor opção.

Talvez a confusão exista pelo fato da profissão ser recente. Uma pesquisa de 2020 da consultoria Everis, com redatores ao redor do mundo, identificou que UX Writing é um campo novo na área de User Experience. 46% dos entrevistados disseram ter até três anos de experiência, enquanto 13% têm menos de um ano.

Antes do termo UX Writing surgir, as interfaces, como um todo, tinham poucas palavras, e ziguezagueavam entre copywriting e uma escrita mais técnica, sem preocupação com a consistência ou tom.

A partir de 2015, principalmente no exterior, as organizações, assim como os designers, começaram a ver as palavras como uma parte fundamental para a experiência das pessoas usuárias. Por meio do conteúdo, a escrita com foco no usuário pode ajudar a criar interfaces mais concisas e relevantes.

Aqui cabe uma frase perfeita da Torrey Podmajersky, UX Writer no Google e autora do livro “Redação Estratégica para UX”, lançado em 2019:

“Words are half of the design that people use.”

Afinal, quando pensamos em qualquer interface, não dá para imaginá-la sem palavras, certo? Assim como não consigo imaginar usar uma palavra sem pensar em quem vai ser impactada por ela.

UX Writer e o que mais?

O título UX Writer ainda pode ter diferenças entre países e empresas. É comum encontrar cargos como Content Strategist, Content Designer e UX Copywriter.

A pesquisa da Everis aponta também que, além de escrever, os profissionais atuam na estratégia, nas pesquisas e nos testes junto à equipe. Não vou entrar aqui na definição exata sobre as funções. Mas, é por essas e outras que não dá para ser apenas a “pessoa das palavras”.

Diagrama criado por Guy Ligertwood

Vale lembrar que, antes do termo “writer”, vem UX. Na prática, nos referimos à metodologia de “User Experience Design”, uma abordagem de design centrado na pessoa usuária. Ou seja, que tem como foco a solução de problemas reais de forma simples e viável.

Escrever é uma forma de fazer design

Sempre gostei de criar. Mexer em todo pacote Adobe, principalmente Photoshop, Illustrator e After Effects é quase uma terapia para mim.

Atualmente, porém, é por meio das palavras que faço design. Elas fornecem clareza, dão sentido, significado e acessibilidade a tudo.

As mensagens de qualquer produto são elaboradas com um motivo muito nobre. Nós ajudamos as pessoas usuárias a atingirem seus objetivos através da linguagem. Já parou para pensar sobre isso?

Como venho escrevendo nesse texto, nada é por acaso. Será que os termos utilizados estão de acordo com o Guia de tom e voz e com o contexto?

Por isso, para manter a consistência de todo conteúdo, o Guia é um dos primeiros entregáveis e ponto de partida de um(a) UX Writer, caso ainda não exista. É por meio dele que criaremos uma relação de confiança e fidelidade entre o produto digital e a pessoa usuária. É, mais uma vez, o design por meio das palavras. Isso falaremos em outro post.

A função de UX Writer ainda tem muitos desafios. A pesquisa da Everis pontuou os três principais na relação UX Writing X empresas:

  • Reconhecimento: importância da escrita com foco no usuário e a “humanização” da conversa entre as pessoas e a tecnologia do produto;
  • Interface: as palavras também são interfaces. Os Ux Writers podem ajudar a desenvolvê-las;
  • Diversidade: envolver as pessoas usuárias no desenvolvimento da linguagem para que a comunicação reflita a diversidade local e cultural. Isso ajuda a impactar as conversões, além de gerar confiança e satisfação no produto.

Para terminar, trago uma frase de Andy Well, UX Content Manager da Adobe, e co-autor do livro Writing is designing:

“…You have to be willing to be an evangelist and to spread the gospel of UX Writing; get designers excited about words, and how they can be used as design tools.”

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Talita González
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Content Designer | Product Writer | UX Writer na Vivo (Telefônica Brasil) | Organizo e simplifico o conteúdo para torná-lo acessível