A internet e o debate político

Como digital influencers, páginas e grupos de redes sociais interferiram na campanha eleitoral

Confirma ESPM
ConfirmaESPM
5 min readNov 12, 2018

--

Por Walter Niyama

Crédito: @pedrocharges (Instagram)

A internet se tornou um espaço de debate e de deliberações nos últimos tempos, especialmente nas redes sociais. O Facebookhoje abriga além de perfis de pessoas que buscam amizades, também tem páginas e grupos voltados para assuntos políticos de diversos lados. Nisso ocorrem muitas discussões na web a respeito de medidas do governo, projetos de lei e até mesmo sobre os candidatos deste ano. E tal como os youtubers, pessoas com que divulgam suas opiniões são compartilhados na rede.

Muitos youtuberssão famosos por fazerem piadas ou mesmo análise de videogames dão suas opiniões a respeito de um determinado assunto político. Alguns dos mais destacáveis, Felipe Neto, Cauê Moura, disseram o que achavam sobre certos políticos e projetos de lei.

Há ainda youtubersfocados quase inteiramente ou completamente em política e pautas sociais e econômicas. Alguns dos mais famosos entre os internautas de direita são Nando Moura, conservador e figura polêmica que atrai tanto fãs quanto críticos. Seu canal também analisava música, mas esse assunto acaba ficando em segundo plano.

Na direita menos conservadora há Raphael Hilde, conhecido pelos movimentos anarcocapitalistas e libertários na rede e Arthur do MamãeFalei que ganhou fama por provocar e questionar manifestantes de esquerda. Futuramente iria se associar ao MBL, cujo um dos líderes é Kim Kataguiri. A força deles é principalmente na internet. A página do grupo no Facebooktem 2,8 milhões de curtidas. E nesta eleição foram eleitos respectivamente deputado estadual e federal. Figurando entre os mais votados.

Embora pautas mais progressistas fossem populares entre os youtubersfamosos, pela esquerda uma figura que ganhou destaque nos últimos tempos foi Santiago Spartakus com vídeos voltados especialmente para as questões raciais e direitos dos negros. Seu alcance também se deu por páginas defensoras de minorias e direitos humanos compartilhando seu trabalho.

O canal das Bee que reúnevlogueirosque abordam temas progressistas e sociais. Um dos nomes mais famosos entre eles é a youtuberJoutJout que além do humor foca em temas como feminismo e empoderamento das mulheres.

Nando Moura declarou apoio aos candidatos Jair Bolsonaro, Eduardo Bolsonaro, Gil Diniz — que possui o apelido de Carteiro Reaça — e Major Olímpio, deixando seus respectivos números e cargos que viriam a ocupar na descrição de seus últimos vídeos antes da eleição do primeiro turno. Todos eles conseguiram se eleger.

Raphael Hilde deu espaço no seu canal para candidatos com os quais se aproximava ideologicamente, fazendo vídeos a respeito de temas como segurança e corrupção em forma de bate-papo. Entre eles Paulo Demchuk (Pros), e os candidatos do Novo, Rodrigo Marinho, Carlos Sviontek e Priscila Chammas, bastante ativos na internet.

O canal das Bee fez um vídeo divulgando o #MeRepresenta, uma plataforma online fundada em 2016 por coletivos de mulheres, negros e LGBT+ com a função de aproximar eleitores de candidatos comprometidos com os direitos humanos. Várias páginas de teor mais progressista ou social também declararam ser contra a candidatura de Bolsonaro.

Youtubers mais famosos e populares também deram suas opiniões a respeito dos resultados do primeiro turno. A vlogueira e atriz Kéfera gravou um vídeo chorando enquanto lamentava o desempenho positivo de Bolsonaro. Felipe Neto criticou ambos os lados que foram para o segundo turno e decidiu por não apoiar nenhum dos dois.

O Facebook tem um papel nisso com a possibilidade de qualquer um criar uma página para defender suas ideias. Algumas das páginas mais destacáveis são as da esquerda, Quebrando o Tabu, Anarcomiguxos, Meu Professor de História, que normalmente apoiam liberação das drogas, legalização do aborto, feminismo e apoiam partidos de esquerda. Há também as de direita como a Tradutores de Direita, Socialista de Iphone e é claro o MBL. Há ainda várias outras páginas em diferentes espectros políticos.

As páginas propagam suas ideias e opiniões compartilhando links de notícias, textos analisando diversos assuntos e também memes, muitas vezes com o intuito de ridicularizar aqueles que pensam contrários a eles ou tentar comunicar de uma forma mais cômica e menos pragmática o que pensam. Elas ainda compartilham vídeos de influencersque vão de acordo com suas ideias e promovem o debate nos comentários e também em seus grupos onde os membros podem discutir melhor sobre determinados assuntos ou contribuir com conteúdo para ser publicado.

Rafael Grohmann professor de mestrado em Comunicação na Cásper Líbero, fala um pouco sobre esses grupos, “tem gente que chama isso de possíveis esferas públicas interconectadas já que esses espaços podem servir para a democracia, têm outros que vão dizer que isso serve mais para reforçar as suas próprias bolhas”, afirma ao explicar sobre como a tecnologia pode acabar fazendo as pessoas se isolarem, interagindo apenas com usuários que defendem os mesmos pontos de vista.

E os efeitos da rede para a realidade puderam ser vistos quando, às vésperas do primeiro turno da eleição, foram convocados dois atos depois da popularização da hashtag#EleNão, em protesto contra o candidato Jair Bolsonaro (PSL) que disputou o segundo turno com Fernando Haddad (PT). Milhares de pessoas compareceram na primeira manifestação. Um ato em favor do candidato também foi feito em resposta.

Alguns partidos veem nisso uma oportunidade de atraírem mais apoiadores e patrocinam conteúdo de digital influencersque falem bem deles ou de seus projetos, prática essa que é malvista de modo geral pelos usuários e que já causou polêmica. Em 2014 houve grande desaprovação com relação ao canal Você Sabia? Voltado para curiosidades e que gravou um vídeo falando bem da Reforma do Ensino Médio e que recebeu dinheiro do Ministério da Educação.

Um caso mais recente foi o da twiteiraPaula Holanda, jornalista e influenciadora considerada de esquerda, que recebeu dinheiro da agência Lajoy para falar bem de candidatas do PT — o que seria uma propaganda irregular.

A polêmica nesse sentido foi mais além, devido aos acontecimentos no exterior. O Facebookviu seu valor de mercado cair quando estourou o escândalo de que os dados de seus usuários foram usados para favorecer a campanha de Donald Trump. Por causa disso a rede social começou a excluir páginas que compartilhavam fake newse também a banir perfis falsos.

Vozes da extrema direita digital estrangeira como Alex Jones e Paul Joseph Watson acusaram a rede de estar disfarçadamente censurando opiniões que não fossem de esquerda. Algo semelhante aconteceu no Brasil quando páginas ligadas ao MBL foram derrubadas.

Perto da eleição, algumas das principais pautas em discussão foram discursos considerados de ódio, extremismos, até pela polarização entre esquerda e direita, personificada em Bolsonaro, e notícias falsas. Propagadas tanto em redes como Facebooke Twitterquanto o próprio WhatsApp.

“Se eu tenho uma sociedade com conservadores e reacionários eu vou ter a internet como um espelho disso. Os discursos de ódio são amplificações de algo que já estava na sociedade, isso não dá para a gente esquecer”, identifica Grohmann, que acrescenta que o problema não está na tecnologia e que ela permitiu uma maior vocalização das opiniões políticas das pessoas.

--

--