Ser sensível demais não é defeito

Melissa Setubal
consciência criativa
4 min readMay 5, 2015

Como lidar com uma pessoa altamente sensível (até quando é você mesma)

Choro à toa. Me canso fácil. Minhas emoções são à flor da pele. Preciso de tempo para ficar sozinha. Qualquer aumento na intensidade das minhas atividades eu já fico que nem barata tonta. Multidões me incomodam. Tendo a ser mais introspectiva. Entre outras características, sou assim desde que me entendo por gente. E desde então ouço que deve ter alguma coisa de errado comigo porque sou desse jeito: muito sensível. Alguém mais aí se identifica com isso? Ou conhece alguém assim?

Me acusam de fraca, manteiga derretida, histérica, dramática, antissocial, preguiçosa, porque não funciono como o mundo pede para funcionarmos. Uma sociedade que premia quem é extrovertido, acelerado, frio e calculista, e capaz de lidar com muitos estímulos ao mesmo tempo sem demonstrar sinais de desgaste.

Eu tentei ser tudo isso. Eu juro. Durante meus 10 anos no mundo corporativo, toda manhã me vestia da personagem da mulher superpoderosa, da mocinha sociável sempre com um sorriso no rosto, da pessoa incansável. Claro que nem sempre dava certo, mas eu comecei a achar que eu era mesmo essa pessoa, e comecei uma prática nada saudável: a de me desensibilizar.

Quando ser sensível é um defeito de fábrica, vamos tentando fazer gambiarras para fazer de conta que não somos, e nos adequarmos ao jeitão de ser que exigem da gente. Eu sabia que esse disfarce tinha prazo de validade, até porque corpo e mente davam sinais de desgastes. Como numa casa, as rachaduras, vazamentos, coisas que quebram e dão defeito, chega uma hora que de tanto insistir em ignorar os problemas que se acumulam, que tudo desmorona.

Daí que eu entendi que continuar agindo diferente de como eu me sentia por dentro, negando meus sentimentos, desmoralizando minha sensibilidade, julgando minhas características, era um dos crimes mais hediondos que eu poderia cometer comigo mesma. Não havia melhor escolha do que acabar com o indisfarçável: sou uma pessoa hipersensível.

imagem: pesquisa google

Chorar muito nem sempre é sinal de fraqueza ou de uma pessoa descontrolada emocionalmente.

O termo Pessoa Altamente Sensível (PAS) foi cunhado pela Dra. Elaine N. Aron em seu livro Pessoas Altamente Sensíveis (The Highly Sensitive Person), e define alguém que processa os dados sensoriais de forma excepcionalmente profunda devido a uma diferença biológica no seu sistema nervoso. Para as PASs, a informação sensorial regular é processada e analisada em um nível profundo, o que contribui para a criatividade, a intuição, e atenção aos detalhes.

A desvantagem é a tendência para tornar-se superestimulada muito rapidamente.

Somos cerca de 20% da população, e mesmo assim, ainda somos taxados como pessoas fora do padrão. Talvez porque percebemos mais as sutilezas das coisas que passam batido pelo restante das pessoas, ainda mais nessa vida corrida e agitada que vivemos hoje em dia. E como elas não tomam consciência dessas sutileza, ficamos parecendo meio estranhos para elas.

imagem: pesquisa google

Há algumas características mais comuns nesse tipo de pessoa, como as que descrevi no início desse texto. Mas elas não são regras. O que penso ser mais importante sobre isso, para começo de conversa, são duas coisas:

  1. Se você se identifica como uma pessoa altamente sensível (você pode fazer o teste aqui), isso não é um diagnóstico de uma condição de saúde. Isso simplesmente significa uma característica, que você pode usar a seu favor na sua vida. Ignorar ou desrespeitar essa característica pode te trazer muitos sintomas físicos e de humor incômodos que podem atrapalhar bastante a sua vida. Ou você pode aprender a respeitar e a usá-la de forma estratégica. Eu, inclusive, mudei de carreira por isso. Hoje, meu trabalho respeita e me premia por ser muito sensível. Quanto mais eu acolho e desenvolvo minha sensibilidade, mais tranquila, interessante e divertida minha vida vai ficando. Tudo foi melhorando: meu trabalho, meus relacionamentos, minha saúde física e mental, minha conexão comigo mesma.
  2. Se você identifica uma pessoa da sua vida como altamente sensível, você pode deixar a sua vida mais fácil e ainda apoiar essa pessoa a ter uma vida mais plena compreendendo melhor como elas funcionam. Minha mãe é ainda mais sensível do que eu. E isso causava muito atrito entre nós. Hoje, nosso relacionamento é fantástico. Foram muitas coisas que permearam essa transformação. A principal foi eu aprender respeitar o tempo e o humor dela. Por exemplo, não adianta eu tentar forçar ela tomar uma decisão na hora que eu apresento uma questão pra ela. Muito menos oferecer muitas opções de soluções. Como uma pessoa altamente sensível, isso deixa ela maluquinha, pois a cabeça dela vai em mil direções diferentes, e ela começa a ficar ansiosa, o que a deixa irritada, o que faz ela me dar uma patada, o que me faz ficar irritada, e aí já viu, né? Como agora eu entendo que é assim que ela funciona, eu aprendi a esperar o tempo dela para ela refletir sobre a melhor solução pra ela, ou eu já ofereço uma ou duas soluções que parecem mais adequadas ao jeito dela de ser. Eu sei, isso exige empatia e disposição. Mas veja quanto estresse e drama eu economizo, e quanto amor e sorrisos eu ganho nessa história. Vale muito a pena esse investimento!

Originally published at http://www.melissasetubal.com.br on May 5, 2015.

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