Gabriel Estácio
Construção
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6 min readJul 26, 2020

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Imagens produzidas por Gabriel Estácio. Todos os direitos reservados.

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A CRIAÇÃO DE DEUS

Várias vezes me pergunto em qual momento os corações de Adão e Eva começam a se desvirtuar do “propósito original” do homem, quando é que abrem espaço para a corrupção. É fácil dizer que é no momento em que Eva ouve da serpente que Deus havia mentido para eles. Bom, esse é o momento da consumação do pecado, mas quando que a possibilidade de pecar surgiu?

Se eu tivesse que escolher um, diria que foi no momento em que Adão recebe de Deus autoridade sobre todo ser vivente. Ali, é bem provável que tenha surgido em Adão o sentimento de superioridade, uma ideia de príncipe do Senhor, porque enquanto Deus era Deus sobre o universo, ele seria deus sobre a terra e tudo o que nela havia.

É difícil de acreditar que a queda tenha sido causada somente pela fala de satanás. Lembre-se de que ele ainda não possuía o conhecimento do bem e do mal, então não consigo crer que, por mais bobos que eles pudessem ser, o primeiro casal não desacreditaria de Deus porque uma serpente disse que o Senhor era mentiroso.

Fato é que Adão cai sendo enganado a partir da sua própria soberba, seu desejo de ser igual a Deus. O encontro diário com o Senhor não foi um obstáculo para Adão esquecer sua missão e posição no universo. Ele quis ser mais. Ser homem não foi suficiente. Adão quis ter em si mesmo um deus.

A partir desse acontecimento, vemos diversas histórias onde o homem se coloca num pedestal, seja entre Gênesis e Apocalipse, ou depois de Apocalipse. Não a toa, Deus precisa instituir como mandamento “não tenha outros deuses além de mim”. O problema é que a maioria entende isso como Deus falando de outras entidades mitológicas, quando também tá inclusa na lista a possibilidade do meu eu ser baal.

Um grande exemplo são as monarquias. Dificilmente você encontrará relatos sobre um reinado, seja em qualquer época que tenha acontecido, onde o rei não via a si mesmo como uma divindade. A Bíblia cita vários exemplos, a história pós-Jesus também. A própria igreja, inclusive, por muitas vezes validou indiretamente esse tipo de pensamento, com o famoso “direito divino dos reis”.

Lá pelo século XIV com o renascentismo, mas principalmente a partir do século XVIII e suas grandes revoluções políticas, as monarquias perdem sua força (apesar de ainda existirem de forma praticamente decorativa em alguns lugares do mundo) e levam junto consigo a influência da igreja. Se era impossível, naquela época, desassociar a imagem da igreja a do rei, no tempo pós-revoluções, o pensamento cristão também perde seu espaço e parte da sua influência na sociedade.

Daí entram de vez em cena a burguesia, o capitalismo, o pensamento racionalista e o antropocentrismo. É chegado o momento da criação de um ser divino: o homem como deus. A famosa obra de Michelangelo (referenciada na capa desse texto), pelas lentes da modernidade, é apenas uma imagem, algo mitológico. Não é mais sobre Deus criando o homem, mas sobre o homem na posição de divindade.

É inevitável dizer que, hoje, esse é o pensamento dominante. Reflexo disso é o crescimento no número de ateus na Europa, um berço do cristianismo, mas que hoje vive uma intensa crise de relacionamento com Jesus.

Há quem vá culpar o tal marxismo cultural, ou a dita doutrinação ideológica, há quem vá culpar o erro da igreja católica de se associar profundamente aos governos, a troco de influência política, sem considerar que um dia esse sistema ia ruir. Acredite você ou não nessas coisas, eu elegi o meu culpado: a natureza de Adão, ou melhor, o ego do homem.

No livro “Ego Transformado” (fica aqui a indicação. É pequeno, linguagem fácil e baratinho, e apesar de tudo isso, é simplesmente incrível. Leitura obrigatória para todo cristão), Tim Keller conta uma história sobre a Madonna.

À título de informação, para você entender bem a história, a Madonna no auge era alguém quase intocável. O que a gente vê hoje em dia em torno de artistas pop não é nada perto do que ela conseguia mover. Era a celebridade mais perseguida pelos paparazzis e extremamente influente naquela época, junto com o Michael Jackson. O que ela quisesse, com certeza teria. Se fosse impossível, alguém tentaria tornar possível. Esse era o peso da marca Madonna.

Bem, mas vamos a história. Numa entrevista pra revista Vogue, a Madonna disse o seguinte:

“O que me impulsiona na vida é o medo de ser medíocre. Esse medo é o que sempre me impele. Venço um de seus ataques e descubro-me como um ser humano especial, mas logo continuo me sentindo medíocre e desinteressante, a menos que faça outra coisa espetacular. Apesar de ter me tornado alguém, ainda tenho de provar que sou alguém. Minha luta não terminou, e acho que nunca terminará.”

E o Tim Keller termina dizendo: esse é o estado natural do ser humano. Demorou um tempo para eu digerir esse resumo dele, porque é difícil imaginar que alguém como Madonna tenha a mesma luta que eu, que você, e que Adão teve. O que muda com as mudanças sociológicas é a aceitação do ego inflado. Hoje, você não precisa combatê-lo, só precisa aceitá-lo, mas isso não muda o fato de que o deus homem precisa ser constantemente alimentado. Mesmo que tenha o mundo aos seus pés, ele sempre quer mais.

Tantos personagens marcantes da história caíram nisso, e o ego é tão implacável, que nenhum desses exemplos parece ser o suficiente para aprendermos a controlá-lo, a ignorar sua constante necessidade de atenção. O deus homem é cruel. Ele te atrai com a sensação da liberdade, mas quando você menos espera, está algemado. Você virou escravo. A sensação de poder que o antropocentrismo oferece nada mais é do que jogar videogame com o controle desligado: você até finge que seu esforço é importante, mas ele não tem efeito nenhum na prática.

Apenas Aquele que veio libertar os cativos é capaz de derrotar o deus homem. Você ora, faz campanha, e acredita que Deus te libertou da escravidão do diabo, mas se você não se libertar de si, do deus homem, ainda não passa de um mero escravo. Não adianta Deus derrotar o diabo na sua vida se você não se permitir ser derrotado.

Não, não estou dizendo que você é o diabo, mas que o deus homem é também uma oposição aos planos do Senhor. Nem tudo é culpa do diabo, se nós ainda somos os vilões da nossa história.

E o que é mais triste nessa história é que as igrejas atuais tendem a ser racionalistas, tendem a permitir a criação do deus homem. Se não fazem igual a congregação de Israel, fazendo um bezerro de ouro, elas fazem pior: permitem que o deus homem surja silenciosamente, se estabeleça, e equiparam a palavra do ego ao evangelho de Cristo.

Não é difícil perceber: olhe o mercado gospel. Pega a playlist “Mais Tocadas Nas Igrejas” no Spotify e vê o conteúdo do que está lá. A gente adora dizer que Deus é o dono da casa, que Ele é o convidado de honra e etc, mas a verdade é que esse é o deus homem, enquanto o Deus Santo está quase sempre do lado de fora da casa, lamentando por uma noiva que os homens renderam, que os homens tentam prostituir a todo momento.

Mas eu creio do fundo do meu coração que vai chegar o dia em que Deus não vai se importar se Ele é o convidado de honra ou não. Vai chegar o dia em que Ele vai meter o pé na porta e TOMAR o que é dEle pra si. Vai chegar o dia em que todos os postes de ídolos e todos os bezerros de ouro serão destruídos. Vai chegar o dia em que o deus homem será destronado, e todos os seus adoradores terão que se curvar diante do Rei da Glória. Grandioso e terrível será esse dia para os que não se renderam.

Esse dia virá, e é logo!

Gabriel Estácio, 26 de Julho de 2020.

Se você quer saber mais sobre isso, eu sugiro fortemente, mais uma vez, que você leia “Ego Transformado”, do Timothy Keller (é, de longe, um dos meus autores favoritos, se não o favorito). Pessoalmente, paguei 15 reais nele. É uma espécie de livreto, de tamanho pequeno, 48 páginas, linguagem simples. É ótimo pra quem tá começando, e é essencial pra todo mundo.

Aqui vai um link que eu indico onde você pode comprá-lo: Ego Transformado — Tim Keller

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