Contagious Spotlight: América Latina #4

A cada mês, a equipe da Contagious no Brasil escolhe suas campanhas recentes favoritas, destacando globalmente a excelência criativa e estratégica da região

Contagious Brasil | editorial
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7 min readMay 17, 2021

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O canal global aberto da Contagious — News & Views — recebe mensalmente uma seleção de campanhas de marcas e agências da América Latina, selecionadas e analisadas pelos pesquisadores e estrategistas do Brasil. Após a publicação em inglês, os artigos entram também aqui, em português, para conectar ainda mais os criativos da região.

Omo, #NinguémLavaMinhasCalcinhas / Monkey-land, Brasil

Pode parecer estranho para outras culturas, mas como sabemos, no Brasil é muito comum que as mulheres lavem suas roupas íntimas à mão no chuveiro. Rotina de autocuidado e responsabilidade, o hábito é geralmente ensinado e incentivado por mães quando as filhas se tornam adolescentes. Embora a maioria das meninas seja instruída a fazê-lo, nem todas gostam e, menos ainda, querem levar esse costume para a vida adulta — seja pela tarefa em si ou por conta da aparência e textura das peças após a limpeza. Algumas mulheres não consideram o processo efetivo, enquanto outras nem sonhariam em jogar suas calcinhas no cesto de roupas sujas.

Há muitas opiniões a respeito, e ao lançar uma versão especial de seu produto para peças íntimas e biquínis, a Omo — maior marca de detergentes da Unilever no país — resolveu abordar o assunto perguntando em um hotsite como as mulheres se sentem em relação a esse hábito.

Com mais de 400 depoimentos, em parceria com o estúdio criativo Monkey-land e a produtora Santa Transmedia, a Omo criou uma campanha baseada na seguinte premissa: não importa se você lava peças íntimas no chuveiro ou na máquina de lavar, o que importa é sua independência e autossuficiência. Em resumo, #NinguémLavaMinhasCalcinhas.

A equipe trabalhou com cinco influenciadoras para ativar o hotsite da pesquisa e a campanha. Após o lançamento, firmaram com o aplicativo Rappi uma parceria voltada à doação de produtos para mulheres em situação de vulnerabilidade social. A cada item Omo Peças Íntimas e Biquíni vendido pelo app, outro era destinado a quem estivesse em necessidade.

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Não afirme, pergunte

Quando se trata de um tema polêmico e pessoal como esse, é melhor propor uma conversa do que tentar dizer às pessoas o que elas devem ou não fazer. A Omo fez uma abordagem inteligente quando decidiu perguntar às mulheres e usar suas respostas como base para uma campanha. O produto posiciona-se no centro, servindo a todas, independentemente de como escolhem lavar a roupa íntima ou de como outras pessoas o fazem. Não há certo, errado, especialistas, soluções mágicas — apenas um diálogo aberto e contínuo que respeita um traço cultural particular e decisões muito íntimas.

Um caso raro de ficar em cima do muro

Nos últimos anos, tem sido impossível evitar o debate sobre marcas que precisam escolher um lado e se posicionar sobre uma série de questões sociais e políticas — desde temas complexos, como a crise climática, até tópicos mais leves, como participantes polêmicos de reality shows. A polarização está em toda parte. Como Bill Bernbach disse há muitos anos: “Quando você defende alguma coisa, sempre encontra pessoas contra e a favor. Se não defende nada, não encontrará ninguém a favor nem contra você”. Mas para toda regra há uma exceção.

A Omo adotou um “não posicionamento” por meio de uma mensagem de fundo mais ampla, versátil para se conectar com o público, aberta a como as mulheres entendem a questão específica da roupa íntima, mas definida o suficiente para colocar a marca do lado de um grande grupo de mulheres independentes e com poder: #NinguémLavaMinhasCalcinhas. Com essa afirmação, a Omo afirma que cada mulher pode fazer o que achar melhor, o que acaba sendo um posicionamento.

McDonald’s, #MéquiLookDelivery / DPZ&T, Brasil

Trabalhando com a agência DPZ&T, o McDonald’s lançou uma campanha que celebra as roupas que as pessoas usam para ir buscar pedidos feitos via delivery — por exemplo, peças de pijama que não combinam e chinelos com meias, entre outros “clássicos da pandemia”. A marca está promovendo um desfile de moda em seus canais, e os seguidores mais estilosos terão seus looks replicados no Instagram do McDonald’s Brasil. Os fãs também podem usar um filtro de capa de revista criado exclusivamente para a ação.

O nome da marca é escrito “Méqui” para imitar a pronúncia do “Mc” pelos brasileiros, elemento fundamental para a estratégia local da marca desde 2020. “No ano passado, entrega adquiriu status de um verdadeiro acontecimento. Para buscar um pedido, vale qualquer look, do mais básico ao mais inusitado. Com essa campanha, voltamos a celebrar a individualidade dos nossos clientes. Começamos o ano falando de ‘méquizices’: as manias que cada um tem para curtir seu item preferido no Méqui. Neste novo momento, damos mais um passo e reforçamos que vale também qualquer look para você saborear nossos produtos”, afirma João Branco, CMO do McDonald’s Brasil.

[Atualização: depois da publicação da matéria original, a Riachuelo se uniu à ação, oferecendo descontos para quem quisesse montar um look especial.]

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Grande negócio

Segundo a pesquisa “Entrega de foodservice na América Latina: a busca pelo crescimento”, desenvolvida pela Euromonitor International, os serviços de entrega cresceram 300% na região nos últimos cinco anos. “Embora os Estados Unidos sejam um mercado consumidor muito maior que a América Latina, a demanda norte-americana por telentrega é superada na Argentina, no Brasil e na Colômbia, países em que essa modalidade representa uma proporção maior do total de vendas dos serviços de alimentação”, informa o relatório.

No McDonald’s Brasil, os serviços de entrega cresceram 150% em 2020. O número é significativo, pois o país representa 50% de todos os negócios da marca na América Latina, mas ainda é uma parte pequena (14%) do total de vendas. Migrar estratégias de marketing e comunicação para o que a marca chama de 3Ds — drive-thru, delivery e digital — é uma forma de ganhar participação de mercado enquanto as medidas de distanciamento social ainda vigoram.

Diversão em tempos difíceis

A pandemia está longe de ser superada no Brasil e, após mais de um ano de distanciamento social e más notícias constantes, as marcas caminham na corda bamba na hora de responder à situação com um tom mais leve. A McDonald’s encontrou um ponto ideal: incentiva as pessoas a ficarem em casa, celebra a personalidade e o estilo dos clientes, cria uma situação divertida para “se produzir” e, claro, coloca o produto em primeiro plano, impulsionando as vendas.

Pingüinos Marinela, O importante é o que está por dentro (Lo importante es lo de adentro) / Fantástica, Colombia

A marca de bolinhos Pingüinos Marinela criou uma campanha e uma coleção de roupas para ajudar adolescentes na Colômbia que enfrentam problemas de bullying e autoimagem, após um estudo realizado pela marca e pela agência Fantástica constatar que sete em cada 10 crianças não estão felizes com quem são e com sua aparência — uma ansiedade estimulada pelas redes sociais. Fotos retocadas e filtros estão afetando a autoestima dos jovens, e o cyberbullying é a principal causa de depressão e insegurança, fenômeno que cresce de forma desproporcional.

Afirmando que “o que está do lado de dentro é o que importa”, o filme é estrelado por crianças reais que sofreram com o bullying e que habitualmente não se encaixariam nos padrões de beleza irreais dos comerciais de TV. O vídeo foi então transformada em peças mais curtas para o TikTok, com uma canção original que convida adolescentes a se aceitarem totalmente e mostrarem quem são.

Além disso, a Pingüinos se associou a um dos estilistas mais importantes do país para criar uma coleção de roupas que não segue cânones e tendências da moda, pensada para que todos possam se vestir e se orgulharem de si mesmos. A campanha ainda conta com filtros que removem filtros, playlists do Spotify e mensagens nas redes sociais que desafiam a discriminação gerada pelos algoritmos.

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Mantendo a promessa da marca

O público da Pingüinos sempre foi de adolescentes entre 14 e 17 anos, mas os dados encontrados na pesquisa fizeram a marca repensar o papel que desempenhava em suas vidas. Essa reflexão levou a um resgate da principal promessa da marca. “Pingüinos Bimbo é um chocolate recheado com creme cujo objetivo sempre foi ‘acabar com o amargor’. Mas, vendo os resultados da pesquisa que realizamos, não poderíamos mais falar em acabar com um gosto amargo se o sentimento das crianças fosse ignorado: ou seja, sem elas se sentirem bem com quem são”, afirmou Alejo Gómez, diretor-geral de Criação da Fantástica.

Gerente de marketing do Grupo Bimbo (dona da marca), Tatiana Esguerra Resk completa: “Nosso produto tem algo muito importante, que é a força do que carrega dentro. E é isso que queremos passar como mensagem aos adolescentes: há muito a dizer e contar com o que eles têm dentro de si”.

Merchanside inesperado

De lanches a roupas: a Pingüinos Marinela realmente encontrou uma ideia criativa que conecta esses elementos, e o fez de um modo cool, divertido e relevante. Um elemento chave da estratégia é a parceria com os designers da Juan Colombia, marca que se descreve como “uma fusão de rock&roll e glamour, cheia de diversão e suspense, distante de estereótipos e orgulhosamente colombiana”.

Parcerias e colaborações entre marcas sempre existiram, pois podem resultar em acordos mutuamente benéficos: novos fluxos de receita, otimização de recursos de marketing e publicidade e aumento da consciência de marca. Além disso, “ao apresentar as duas marcas em mercados diferentes, constroem novos públicos, bem como sua presença em mercados desconhecidos”, aponta a designer Cassandra Tang neste artigo.

No ano passado, vimos muitas colaborações entre marcas — algumas, um pouco inesperadas –, e além dos aspectos práticos e dos benefícios mencionados, Simon Cotterrell, diretor-executivo de Estratégia da Interbrand London, afirma que também há um lado emocional em jogo: “As marcas parecem demonstrar a mesma necessidade fundamental de coletivismo à qual todos nós, como indivíduos, estamos recorrendo. Embora não estejam literalmente ajudando os vizinhos a fazerem compras ou admirando numa tela a sala de estar de um amigo distante, a simples necessidade humana de se unir em uma crise é o que dá luz verde a colaborações tão ativas”.

Tradução: Ricardo Romanoff

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