Expandindo os limites do som

Seja através do carisma de uma celebridade ou por meio de um espaço de mídia não tradicional, marcas podem (e devem) expandir sua paleta criativa quando o assunto é áudio e voz

Contagious Brasil | editorial
Contagious Brasil
6 min readNov 9, 2021

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Do hype do Clubhouse até o sucesso dos podcasts, passando pela explosão dos assistentes de voz, 2021 viu a consolidação da Era do Áudio. Na verdade, o tempo do som nunca passou: novas plataformas possibilitaram a diversificação de canais, reinventando uma mídia que nunca saiu, realmente, de moda. A prevalência do rádio é uma prova disso. Segundo a pesquisa Inside Rádio 2021, um estudo realizado pela Kantar IBOPE Media, o meio é consumido por 80% dos brasileiros — um crescimento de dois pontos percentuais em relação ao ano passado.

Mas, se os canais se multiplicaram, o mesmo não pode ser dito da forma que a publicidade faz anúncios neste espaço: a mais comum são os intrusivos spots basicamente, o mesmo estilo de comercial que a sua avó conhecia. Será que as marcas estão explorando todas as possibilidades que ferramentas de áudio oferecem? Reunimos neste texto alguns cases de quem ousou e utilizou recursos de áudio e de voz de forma não convencional.

Movimentos do mercado

Nem todo mundo tem uma Alexa em casa — mas os assistentes de voz estão em praticamente todos os celulares. Às vezes, a ubiquidade da ferramenta passa até despercebida, mas segundo um estudo realizado pelo Kantar em parceria com o Google, 37% dos brasileiros usam o assistente de voz do Google pelo menos três vezes por semana, colocando o país em terceiro lugar no mundo com mais usuários da ferramenta. Para 63% dos entrevistados, dar um comando verbal é um ato comum.

Para evitar os estereótipos associados aos assistentes virtuais, o Google lançou no Brasil uma voz que não tem gênero. As duas vozes disponíveis são classificadas por cores (vermelho ou laranja). “O objetivo do assistente é ser uma ferramenta personalizada, e isso significa permitir que as pessoas possam escolher a voz mais adequada para elas. Por isso, é importante poder oferecer uma nova voz para conversar e ajudá-las a realizar as suas tarefas no dia a dia”, disse Maia Mau, head de marketing do Google Assistant na América Latina.

Ao mesmo tempo, as redes sociais também vão incorporando cada vez mais recursos de áudio em suas plataformas. Recentemente, o Facebook anunciou a expansão do Live Audio Rooms (salas de aúdio semelhantes ao Clubhouse) para todos os mercados, além de um hub para podcasts e uma ferramenta de clipes de áudio. Na mesma linha, o Twitter anunciou a expansão dos Spaces para todos os usuários da plataforma — antes a hospedagem estava restrita a contas com pelo menos 600 seguidores. Já o Snapchat entrou em acordo com a rede de televisão NBC para licenciar áudios de seu catálogo — que inclui séries e filmes como “Shrek”, “The Office”, e “Parks and Recreation”.

Assistente de pechincha

E como as marcas estão explorando as ferramentas de áudio?

A Domino's usou a popularidade, o carisma e a espontaneidade da então recém campeã do reality show “A Fazenda”, Jojo Todynho, para “atender” os pedidos feitos via assistente de voz, marcando o início da funcionalidade nos assistentes do Google e da Amazon, tanto via smartspeakers quanto pelo celular. Desenvolvida pela Adventures, a ação foi lançada no início de 2021 e durou 45 dias — período em que os sabores campeões de venda saíam com 50% de desconto se pedidos nesta modalidade. Usando os famosos bordões de Jojo, a campanha conseguiu articular tecnologia, entretenimento e compreensão dos hábitos do consumidor de forma clara e simples.

Falando em hábitos do consumidor, para os indianos, o ato de pechinchar é uma questão cultural — mas que não pode ser replicado quando se compra online. Para endereçar a questão, a Flipkart, uma das maiores varejistas de e-commerce da Índia, criou uma experiência de voz que permitia aos clientes negociarem melhores preços através dos seus smartphones.

Isto aconteceu por meio de um assistente de voz próprio, chamado Hagglebot, desenvolvido em parceria com o Google Zoo (think-tank criativo para agências e marcas do Google) e a agência Dentsu Webchutney. Antes de construir a experiência, a equipe visitou trinta bazares em três cidades para identificar diferentes estratégias de negociação que eram comumente usadas e, em seguida, simulá-las no Hagglebot. A experiência teve um tempo médio de engajamento de 6 minutos e 5 segundos, 200 vezes a taxa média do Google Assistant. A ferramenta humanizou as transações, fazendo os consumidores indianos ficarem mais à vontade comprando online.

Contexto é tudo

De ASMR até seleções para combater o stress, o Spotify tem uma gama de playlists relaxantes. As seleções pensadas para fazer bebês dormirem também são um hit na plataforma — mas quem não é assinante premium corre o risco de ter o sono do seu pequeno interrompido por algum anúncio inconveniente e barulhento.

Pensando nisso, a Ikea se juntou com a agência canadense Rethink para criar anúncios especiais de travesseiros, camas e colchões para as playlists de sono infantil do Spotify. Durante um mês, a campanha Won’t Wake The Baby (Não acordará o bebê, em tradução livre) trouxe uma série de anúncios sussurrados e silenciosos que ficaram nas populares playlists de ninar. De acordo com a agência, as vendas online de camas e colchões da Ikea aumentaram 7,1% com a ação. A marca utilizou de forma criativa um espaço de mídia não convencional para reforçar sua mensagem. Se adaptando ao contexto, a Ikea chegou onde queria.

Partindo para um universo diferente, uma outra ação de marca soube usar o contexto para tornar sua mensagem mais relevante e efetiva. A China é um dos países que mais utilizam óleo de cozinha no mundo — o som de fritura é uma constante na vida do país asiático. Em 2019, a companhia de e-commerce Pinduoduo, em parceria com a Dentsu, criou um aplicativo que identificava o som de comida sendo frita e oferecia descontos na compra de óleos de cozinha de acordo com os decibéis emitidos pelas receitas das pessoas, captados pelo app. De acordo com a agência, a campanha resultou em mais de 6 milhões de interações online.

A Pinduoduo soube explorar um elemento que poucas marcas prestam atenção: o som da cozinha. É claro que o ato de cozinhar desperta mais atenção de outros sentidos, mas o barulho de uma cebola refogando, o apito da panela de pressão ou o chiado de um filé dourando na frigideira também compõem o universo culinário.

Para além de hypes repentinos de redes como o Clubhouse (cuja ascensão e queda é também merecedora de análise) ou de iniciativas estratégicas que inserem novas funcionalidades de áudio em plataformas às quais já estamos habituados, falar sobre os usos criativos do som e da voz é explorar cantos por vezes esquecidos por marcas e agências — ou, no mínimo, subaproveitados. Em um mundo com cada vez mais impulsos visuais, explorar outros sentidos e outras formas — por vezes mais naturais e democráticas — de comunicação pode ser, sim, um caminho para a inovação. Afinal, até o rádio vem resistindo muito bem, obrigado, ao teste do tempo.

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Perfil do time editorial da Contagious Brasil. Publicando reflexões, análises e referências para excelência criativa e estratégica.