Influenciadores virtuais
À medida que mais influenciadores virtuais entram no mainstream, eles se tornam uma nova ferramenta de marketing. Trazemos, aqui, um contexto de como essas celebridades digitais surgiram, detalhamos como marcas fizeram parceria com elas e explicamos por que, às vezes, elas podem ser melhores que um YouTuber ou Instagrammer humano
Este texto foi originalmente publicado em inglês no Contagious I/O, plataforma de inteligência criativa e estratégica para marcas, agências e negócios de inovação, em 2019. Ele segue sendo relevante — talvez cada vez mais — e por isso publicamos aqui também. Para saber mais sobre os produtos e serviços da Contagious, acesse www.contagious.com ou escreva pra gente em brazil@contagious.com.
Avanços na tecnologia CGI (Computer-generated imagery, ou imagens geradas por computador, em tradução livre) e o crescimento do marketing de influenciadores abriram o caminho para uma nova geração de estrelas pixelizadas nas redes sociais: os influenciadores virtuais.
Ao contrário de seus antecessores, como a banda britânica Gorillaz ou o ídolo japonês Hatsune Miku, que eram facilmente distinguíveis de pessoas reais, os novos influenciadores CGI, como Lil Miquela (2,1 milhões de seguidores no Instagram) ou Perl (12.300 seguidores no Instagram) parecem muito mais humanos. Suas aparências hiper-realistas, juntamente com suas interações virtuais, estão angariando milhões de seguidores e lucrativas parcerias de marca.
Cenário /
Quando os personagens CGI foram introduzidos pela primeira vez nos anos 90 e início dos anos 2000, as personas virtuais eram vistas apenas como recursos de entretenimento (jogos, música e filmes). Hoje se tornaram uma ferramenta de marketing muito mais útil e versátil pelas razões que listamos a seguir.
_Aceitação de personagens com Inteligência Artificial (IA)
Uma das principais razões pelas quais os influenciadores virtuais oferecem agora uma maior oportunidade de negócios para as marcas é que o público se sente muito mais à vontade interagindo com agentes não humanos. As vendas globais de alto-falantes inteligentes cresceram quase 200% ano a ano no terceiro trimestre de 2018 e, de acordo com um relatório recente da PwC, 65% dos jovens de 25 a 49 anos falam com dispositivos de voz pelo menos uma vez por dia. A forma como nos envolvemos com eles é impressionante: quando as pessoas usam assistentes de voz, elas se comunicam como se estivessem falando com humanos, usando frases como “por favor”, “obrigado” e até “me desculpe”. De acordo com o Google, 41% dos proprietários de alto-falantes ativados por voz falam com seus dispositivos como se fossem seres humanos e percebem os dispositivos como “outra pessoa ou um amigo” em vez de apenas um “brinquedo eletrônico”.
Há também uma maior proliferação de chatbots com personalidades semelhantes às humanas. Em nosso report Branded Chatbots — disponível para assinantes do Contagious I/O — , exploramos como bots automatizados podem ser usados para entretenimento e storytelling, além de tarefas mais funcionais, como atendimento ao cliente e vendas.
_Falta de autenticidade do influenciador
Também é menos provável que as marcas sejam contrariadas pela falsidade dos personagens virtuais devido à maneira como o marketing de influenciadores evoluiu. Enquanto os blogueiros de mídia social da primeira geração alcançaram a fama por meio de uma paixão autêntica por um assunto (moda, viagem, beleza), os influenciadores hoje são mais calculistas, curam sua “marca pessoal” e otimizam suas imagem tanto quanto as celebridades, na esperança de serem abordados pelas empresas.
Essa abordagem mercenária não passou despercebida. De acordo com nosso report Micro Influenciadores, a empresa de pesquisa de mercado OnePoll revelou que 43% dos consumidores britânicos pensam que os influenciadores são ‘muitas vezes não autênticos’ e trabalham com marcas que ‘eles não acreditam’, enquanto outros 52% supõem que, se um influenciador promove um produto, ele foi pago para fazê-lo, independentemente de ter, de fato, sido ou não. Outro estudo recente da Mindshare em Londres questionou 6.000 entrevistados sobre mídia falsa e descobriu que quase quatro em cada dez consumidores do Reino Unido sentem que ‘tudo no Instagram é falso até certo ponto’, enquanto um terço de 18 a 34 anos de idade segue perfis no Instagram ou no Twitter que sabem não ser reais.
“Nos últimos anos, a cultura digital tem se orientado para a falsidade extrema e as pessoas estão indo muito longe para criar suas versões fabricadas on-line”, disse Myles Badger, estrategista social da agência de marketing Mechanica, à Contagious.
“Então, de certa forma, a tendência do influenciador virtual é a conclusão lógica desse esforço para tornar essa persona completamente artificial. Essencialmente, você está recebendo a mesma quantidade de artificialidade de Lil Miquela e de Kendall Jenner”.
Como o público sabe sobre a falta de autenticidade dos influenciadores humanos reais, eles se tornaram mais receptivos a personagens CGI nas mídias sociais.
Para Carvalho, do Highsnobiety, cuja publicação lançou Lil Miquela como modelo de capa no ano passado, os influenciadores virtuais são perfeitos para o escapismo da internet: “A verdade é que você vai às mídias sociais para viver a experiência de alguém. Você está lá para absorver a experiência que um indivíduo — pessoa ou persona — tem. E eu não acho que esse público se importa se essa pessoa é real ou não.”
Os consumidores, de fato, começaram a seguir personagens virtuais nas mídias sociais da mesma maneira que fazem com seus colegas humanos.
_Maior controle para marcas
Para as empresas que buscam aproveitar o poder real dos influenciadores, há outro atrativo significativo para os personagens gerados por computador: a segurança da marca. Ao contrário dos embaixadores humanos, os influenciadores virtuais oferecem aos seus parceiros comerciais o controle completo da mensagem e da exibição do produto. Isso elimina o risco de um desastre de relações públicas. Controvérsias com grandes influenciadores também estão obrigando as marcas a buscar alternativas para o modelo tradicional de publicações pagas.
“Há muitas marcas que não querem trabalhar com influenciadores que também se interessam por categorias ou temas com os quais não querem se associar ou que tenham um sentimento negativo”, disse Jeff Carvalho, diretor executivo de moda e estilo de vida da Highsnobiety, à Contagious. “No espaço virtual, você não precisa mais investigar todo o universo daquela pessoa. Você pode construir essa persona conforme necessário.
_Alternativa econômica aos influenciadores humanos
A parceria com as estrelas da mídia social pode ser cara. YouTubers populares, como Joe Sugg (mais de 8 milhões de assinantes), podem cobrar US$ 300.000 para uma parceria de marca em um vídeo, relata a plataforma de análise Captiv8. No Instagram e no Facebook, os influenciadores com muitos seguidores podem ganhar entre US$ 150 mil e US$ 187 mil por um único post. Aqueles na escala de micro influenciador (menos de 100.000 seguidores) podem pedir US$ 5.000 por postagem de marca. E embora o marketing de influenciadores seja agora mais comum, ainda é difícil de rastrear. De acordo com um relatório da Influencer Intelligence and Econsultancy, 84% dos profissionais de marketing acham que provar o retorno sobre o investimento do marketing de influência é um desafio.
Ao mesmo tempo, o custo de criação de avatares virtuais de alta qualidade está caindo constantemente. Tanto que o blog The Cut, da revista New York, encarregou um de seus designers de motion graphics, sem experiência em design de personagens, de criar uma réplica de Lil Miquela. O resultado final? Uma aparência bastante decente 48 horas depois. “A tecnologia CGI existe há anos, mas agora é acessível o suficiente para que pequenas organizações criem personas como Lil Miquela no Instagram ou o virtual vlogger Kizuna AI [2,4 milhões de seguidores] no YouTube”, disse Badger, da Mechanica. “Se você tem a persona certa, elaborada de maneira que agrade ao seu público-alvo, ela é significativamente mais econômica [do que usar um influenciador humano]”.
“Eles podem estar em qualquer lugar, a qualquer hora, falar qualquer língua e nunca se cansar”, disse Jeff Carvalho.
Exemplos no marketing /
Abaixo, delineamos algumas maneiras em que marcas experientes usaram influenciadores virtuais em seu marketing, seja colaborando com personagens CGI populares ou criando suas próprias estrelas digitais.
1. Parceria com influenciadores virtuais existentes
A maioria dos influenciadores virtuais mais populares da atualidade não pertence às marcas. Eles são criados por empresas de tecnologia (Lil Miquela e Blawko foram criados pela empresa AI Brud) ou indivíduos (Shudu, que tem 159.000 seguidores, foi idealizado pelo fotógrafo britânico Cameron James-Wilson). E as marcas podem se aproximar e colaborar com eles da mesma forma que podem trabalhar com seus equivalentes humanos, por meio de um agente. Aqui estão algumas das melhores campanhas com influenciadores virtuais estabelecidos.
CARLINGS x COLEÇÃO PERL / NEO-EX
A varejista de roupas escandinava Carlings chegou atrasada ao universo do e-commerce e precisava fazer algo ousado para promover a abertura de sua primeira loja online. Em colaboração com a agência criativa da Vice, a Virtue Nordic, de Copenhague, Carlings criou uma coleção de roupas que só existe on-line.
Quando as pessoas compravam um item — com preço entre 10 e 11 dólares -, precisavam enviar uma foto de si mesmas. Uma equipe de designers digitais, então, colocava a peça de roupa na imagem e, em 24 horas, a enviava de volta, incentivando o cliente a promovê-la nas mídias sociais com a hashtag #adDRESSTHEFUTURE.
Para lançar a coleção, Carlings se juntou à influenciadora virtual Perl.
“Fizemos uma parceria com influenciadores reais também, mas Perl foi uma escolha natural para nós”, disse Morten Grubak, diretor de criação da Virtue Nordic. “A narrativa dela é que nasceu na internet e reconhece que é digital. Ela não tenta ser real, é apenas algo que vive na internet. A razão pela qual queríamos fazer uma colaboração com uma influenciadora de CGI era abrir a mente das pessoas em torno deste tópico. Muita gente não sabe sobre influenciadores digitais e eles são impressionantes quando você os explica.”
De acordo com a agência, o projeto foi coberto por “praticamente todos os veículos de moda” e a Carlings recebeu mais de 200 pedidos de peças da Neo-Ex, cujos lucros foram doados à WaterAid.
2. Influenciadores de marca /
Além dos influenciadores virtuais que existem em suas próprias mídias sociais, as marcas também começaram a criar suas próprias versões. Semelhantes a mascotes, esses personagens são associados apenas a uma única marca. Para isso, às vezes, marcas pedem a ajuda de alguns players mais estabelecidos neste universo quando se trata de criar seus próprios personagens. Por exemplo, Cameron James-Wilson, o criador do Shudu, lançou uma agência chamada The Diigitals, que é especializada no desenvolvimento de personas virtuais de CGI para marcas.
DR. JART + / A AVENTURA MAIS BONITA DO MUNDO
Para lançar suas máscaras faciais na China, a empresa sul-coreana de cosméticos Dr. Jart + criou séries de conteúdo no Weibo e Instagram com personagens fictícios. Enquanto estes não são exatamente influenciadores CGI, são posicionados como personagens de outro mundo.
A Aventura Mais Bonita do Mundo, criada pela agência de Xangai Good People Basically, girava em torno de quatro amantes da máscara de borracha do planeta Dermask, que tinham vindo à Terra para descobrir sua beleza. Os alienígenas foram baseados nas imagens da embalagem dos produtos da marca. O projeto resultou em 42,7 milhões de impressões e a conta do Instagram ganhou mais de 16.900 seguidores.
Os perfis dos personagens no Weibo e no Instagram mostravam imagens suas em diferentes lugares, aproveitando música, comida, moda e pessoas. Os seguidores da Rubber Mask Lovers também podiam sugerir coisas que os alienígenas deviam ver ou fazer.
A agência optou por usar influenciadores virtuais porque era mais barato. “Quando começamos a investigar os influenciadores na China, percebemos que não tínhamos um orçamento para criar a grande campanha que imaginávamos. “Quando vimos que isso jogava contra nós, percebemos que a embalagem tinha uma cara colorida de bebê. Fomos ao cliente e dissemos: ‘Por que não criamos personagens da vida real baseados nisso?”, disse Alvin Lim, presidente criativo da Good People Basically. “Se estamos falando de alguém endossando a marca, esse é um grande investimento. […] certamente queremos alavancar o apelo dos personagens no futuro. Podemos tentar colocá-los em programas de TV para conversar com os consumidores e a mídia.”
RENAULT / ESCAPE TO REAL
Para promover seu modelo Kadjar, a Renault criou seu próprio embaixador virtual, a Liv, que estrela o comercial de TV da marca. A campanha mostra Liv dirigindo o novo veículo e experimentando a verdadeira emoção que vem com ele. “Ao lançar sua própria embaixadora virtual, a Renault quer provar até que ponto a experiência e os sentimentos a bordo são autênticos, estimulantes e emocionantes, e que apesar de Liv ser inteiramente virtual, a experiência em si é completamente real e muito mais recompensadora”, afirmou a Publicis Conseil, a agência de Paris por trás do projeto.
Aprendizados /
Como uma encarnação do novo e do que está por vir, a indústria da moda adotou rapidamente os influenciadores virtuais nas campanhas sociais. “É um ajuste bastante óbvio porque você tem essa pessoa meticulosamente trabalhada, o que é ideal para uma marca de vestuário projetar seus produtos”, afirma Badger. Dito isso, os influenciadores virtuais podem ser embaixadores úteis para marcas em uma variedade de categorias além da moda: do turismo aos produtos eletrônicos de consumo, automotivo, beleza e telecomunicações.
Mas antes de você considerar Lil Miquela para sua próxima campanha ou criar sua própria persona CGI, aqui estão algumas coisas a considerar:
- Por que um influenciador virtual?
Como descrevemos acima, há algumas razões-chave, por exemplo, custo-efetividade e maior controle, que explicam por que uma marca pode optar por trabalhar com um influenciador virtual em uma vida real. Há também o elemento de relações públicas, que pode ajudar uma marca a se destacar mais. Mas, à medida que os influenciadores virtuais se tornam mais populares, o fator novidade acabará por desaparecer, de modo que deve haver algo mais substancial para justificar a parceria.
Como alguns dos exemplos acima demonstram, quando uma marca tem uma mensagem clara para comunicar sobre sua atitude voltada para o futuro e expertise tecnológica, uma parceria com um influenciador virtual pode ser a ferramenta perfeita para disseminar o assunto. Por exemplo, usando o Perl para modelar sua coleção de roupas digitais, Carlings ajudou a transformar-se de um varejista que não tinha nem mesmo uma loja virtual para uma empresa de ponta em moda e tecnologia.
2. Seu público está pronto?
Dependendo de como você está tentando segmentar seu marketing, um influenciador virtual pode não ser o caminho certo. Pergunte a si mesmo se um influenciador virtual tem mais probabilidade de despertar interesse ou ser visto como algo assustador ou estranho para o público que sua marca está tentando alcançar.
Pessoas de determinados países podem estar mais dispostas a interagir com influenciadores virtuais. “Se você olhar para alguns territórios asiáticos, a ideia de uma persona robótica ou virtual é muito mais aceita”, disse Carvalho. “Há muitos exemplos nessa região de músicos e atores virtuais com grandes audiências. As pessoas até se casam com personagens baseados em computador.”
É menos provável que consumidores mais jovens se importem com o fato do influenciador ser virtual ou de carne e osso. “Se você olhar para o público ocidental, acho que as gerações mais jovens estão mais abertas a essa ideia de que as coisas não são como às vezes parecem”, disse Carvalho. “A verdade é que você vai às mídias sociais para viver a experiência de outro alguém. Acreditamos que a geração mais jovem de hoje pode não se importar tanto, mesmo que saiba que esse personagem não é real.”
Por fim, a fluência digital também pode afetar o quão atraente são os influenciadores virtuais. O estudo da Mindshare sobre ‘mídia falsa’ descobriu que 54% dos consumidores do Reino Unido consideram as personas virtuais atraentes em algum nível, aumentando para 69% para aqueles que se consideram informados sobre tecnologia.
3. Como sua marca pode ser parceira de um influenciador virtual e ainda parecer autêntica?
Assim como ao se unir a verdadeiras estrelas da mídia social, para poder realmente ressoar com seu público, as marcas precisam se associar com o influenciador certo para elas. As parcerias precisam ter algum tipo de ligação natural. Porque, como Carvalho, da Highsnobiety, nos disse, mesmo quando se trata de personalidades virtuais, “autenticidade é tudo no marketing de relacionamento. As relações entre os influenciadores e sua comunidade é o que as marcas estão comprando.”