A parte mais difícil
Faltavam apenas algumas semanas para eu sair de férias do trabalho. De certa forma, a rotina e os compromissos dos últimos meses haviam amansado minha vontade de cair na estrada. Cogitei, até mesmo — olha que insanidade —, viajar de avião. O destino? Argentina. O motivo? Rever uma pessoa muito especial.
Abri o Google Maps. Rolei o scroll. A cada volta que meu dedo dava sobre o mouse, observava minha cidade, Salto (SP), diminuir de tamanho. Quando percebi, meus olhos já abraçavam alguns estados do Brasil. Mais abaixo, o Uruguai. Um pouco mais, a Argentina. Olhando assim, até que não parecia tão distante.
Afinal, cabia tudo na tela de um computador.
Não me lembro ao certo qual foi o exato momento em que eu decidi partir. Provavelmente foi em algum intervalo de tempo onde as pálpebras pedem arrego e os sentidos já se fazem dormentes. Só sei que me levantei no dia seguinte avisando algumas pessoas que cairia na estrada, logo após a virada do ano. Em troca, recebi conselhos motivadores, que só confirmavam a minha decisão:
"Mas cara, não é bem assim, né? É perigoso."
"Não é melhor fazer isso de ônibus?"
"Não tem ninguém pra ir contigo?"
"Antigamente era mais fácil, hoje em dia as coisas mudaram"
"Xiiii, os caminhoneiros vão fazer a festa kkkkkkk"
Eu tenho certeza que ninguém tinha intenção de me desmotivar. E era totalmente compreensível. O modo como consumimos informação hoje em dia é pautado no que mais se vende: sensacionalismo. Crescer em ambientes urbanos, cercados por muros e grades, onde as notícias que nos chegam são sempre tão trágicas, não nos dá muitas possibilidades a não ser pensar o pior.
"Apertei os punhos fechados e cerrei os dentes. Acredite, não foi tão fácil vencer esse medo que plantam na gente" — Valentin
Em contrapartida, havia conversado com muitos viajantes pelo Brasil. Acompanhado diversos relatos. Era o argumento preocupado de pessoas que nunca fizeram isso, versus a tranquilidade e incentivo de quem já havia feito. E é claro que eu preferi dar ouvidos aos fatos.
A parte mais difícil da viagem
Provavelmente quem estiver lendo isso vai pensar:
"Mas como assim se você nem saiu de casa ?"
E é exatamente essa a parte mais difícil. Aquele momento em que você realmente põe o pé pra fora do portão e vai. Faltava apenas um dia para eu fazer isso. Era a noite do dia 1 de janeiro de 2018 e eu estava sozinho em casa com milhões de pensamentos rondando a minha mente. De repente, senti toda a confiança e segurança que tinha dentro de mim se desfazer em medo e ansiedade. Era fácil desistir. Bastava desligar o despertador e acordar no dia seguinte como se fosse um dia normal.
Deitei no colchão de barriga pra cima e fiquei olhando pro teto. Na falta de certezas, as dúvidas me abraçavam calorosamente. Foi quando dei um suspiro e pensei comigo:
"Mas quando foi que eu tive certeza de algo mesmo?"