29.11

Anna Carolina Rizzon
voltas
Published in
2 min readNov 29, 2020

Diário de quarentena vinte e sete. Vinte e nove do onze. Escrever tem me tomado uma energia que eu não esperava que tomasse. Escrever o livro, no caso. Os diários resistem, porque sempre foi o contrário: só o que eu fazia era escrever. É onde me encontro mais próxima do que “estar bem” me parece— a ausência de angústia. Mesmo quando me questionava, mesmo quando sabia que o que eu escrevia não era bom. Mesmo quando disputava comigo mesma, mesmo quando disputava com o tempo. Havia sempre o encaixe, acima de tudo. Mas os diários só atendem a anseios muito específicos. Na oficina de que participei ano passado, uma professora pediu para definirmos o que buscávamos com a escrita em alguns verbos; elenquei: comover, refletir, movimentar, acolher, pensar, doer, inspirar e curar. Acredito — correndo o risco de soar ingênua — que é a primeira vez que escrevo algo que cumpre com todos esses objetivos. Mas, justamente por isso?, nunca foi tão difícil escrever. Não dormi bem na sexta porque queria escrever no sábado; escrevi sábado de manhã — quase nada, duas linhas — e dormi o dia todo. Escrevi hoje, mais uma frase, longa, pelo menos, e não consigo tornar ao arquivo de texto. Liguei pra minha mãe pra dizer que talvez volte mais cedo pra Teresópolis. O impulso é de fugir, me encasular, ignorar que existe qualquer vida além dessa que estou construindo, ficcional e profundamente calcada numa realidade da qual sempre corri e pra qual, não sei por quê, quero voltar. Meu corpo, meu sono, meu ego já sentem os efeitos: são massacrados. Me alimentei vergonhosamente mal este fim de semana. Me sinto sozinha. Quero chorar o tempo todo. Pra construir este livro, devo destruir o resto. É uma afirmação que minha terapeuta vai repreender na quinta. No entanto, ela diz que vou terminar a terapia antes de terminar o livro. Veremos.

--

--